Redes “fantasmas”, a mais perigosa forma de poluição para a vida marinha

Ela são responsáveis por até 30% do declínio de espécies marinhas, incluindo golfinhos, tubarões e tartarugas – e o boto, criticamente ameaçado de extinção

Crédito: Philippos Marakis/ iStock

Talib Visram 4 minutos de leitura

A maioria já se deu conta de que o lixo plástico acaba no oceano e é trazido para as praias pela maré. São milhares de canudos, sacolas e embalagens que prejudicam a vida marinha.

Mas há uma ameaça muito maior à espreita no fundo do mar, provavelmente ainda mais mortal para a fauna. São os equipamentos de pesca perdidos e abandonados, conhecidos como "redes fantasmas", que continuam prendendo animais muito tempo depois de terem sido descartados.

“Isso é algo que ninguém consegue ver da superfície, então nos contentamos em ignorar o problema”, alfineta Joel Baziuk, diretor associado da Global Ghost Gear Initiative (GGGI), uma coalizão internacional de entidades públicas, privadas e sem fins lucrativos liderados pela Ocean Conservancy. Sua meta é reduzir a ameaça das redes fantasmas.

As redes fantasmas têm um impacto ambiental e econômico considerável, e é do interesse de todos – de ambientalistas a pescadores, passando pelas próprias empresas de pesca – encontrar soluções para remover esses equipamentos e evitar que outros tenham o mesmo destino.

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QUE TIPO DE EQUIPAMENTO É MAIS COMUM?

O termo “rede fantasma” (ghost gear) refere-se aos equipamentos de pesca industrial deixados para trás, acidentalmente ou não. Isso inclui armadilhas para peixes e caranguejos, anzóis, linhas e redes de arrasto.

Os equipamentos fantasmas têm efeitos mais prejudiciais do que outros detritos de plástico, porque continuam a capturar animais mesmo esquecidos nas profundezas. “É a forma mais prejudicial de lixo marinho, porque foram projetados justamente para capturar a vida aquática”, diz Baziuk.

As estimativas sugerem que as redes fantasmas representam cerca de 10% do lixo marinho global, que pode chegar a algo entre meio milhão e um milhão de peças por ano.

Baziuk diz que faz mais sentido olhar para pontos de acesso locais. Entre a Califórnia e o Havaí, por exemplo, há uma área apelidada de grande ilha de lixo do Pacífico, porque as fortes correntes do giro do Pacífico norte puxam enormes quantidades de detritos. Estima-se que essas redes fantasmas representem quase metade (46%) do total de plástico flutuante.

O QUE CAUSA A POLUIÇÃO POR REDES FANTASMAS?

A maioria se perde por acidente, diz Baziuk, que passou 20 anos trabalhando na indústria pesqueira. “Nenhum pescador quer perder seu equipamento”, diz ele. Nem mesmo os ilegais, porque é caro repor.

Uma grande causa é o clima extremo. A mudança climática está contribuindo para tempestades mais intensas, durante as quais os pescadores podem precisar deixar as redes para trás, por questão de segurança. Elas também podem ficar presas em recifes, rochas, destroços ou em outro equipamento fantasma esquecido ali embaixo.

Mas também há vezes em que os pescadores os descartam de propósito. Muitas vezes, isso ocorre em países em desenvolvimento, onde há falta de infraestrutura de coleta de lixo. “Não é por maldade – é devido à falta de alternativas”, diz Baziuk.

Crédito: Global Ghost Gear Initiative

QUAL É O IMPACTO AMBIENTAL?

Os efeitos sobre a vida marinha são desastrosos. Baleias, golfinhos, tubarões, arraias, tartarugas e aves ficam enredadas e morrem lentamente por asfixia, infecção ou por ferimentos resultantes de membros arrancados do corpo.

Por exemplo, estima-se que 1,5 mil leões-marinhos na Austrália morram a cada ano, emaranhados em fios de plástico, cordas e redes. A maioria são filhotes e jovens, que provavelmente ficaram presos ali enquanto brincavam.

O equipamento fantasma captura involuntariamente frutos do mar que poderiam ser colhidos. A Ocean Conservancy estima que 90% da vida marinha capturada por engano tem valor comercial e que alguns estoques de peixes já sofreram um declínio de 30% em quantidade. Isso é uma ameaça aos meios de subsistência dos pescadores, bem como à segurança alimentar global.

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ESSAS REDES PODEM SER REMOVIDAS?

Podem sim, e há muitos esforços em andamento. A Gulf of Maine Lobster Foundation, que organiza “viagens de remoção” há 15 anos, encontrou milhares de toneladas de equipamentos afundados. Eles são rebocados de volta à costa e reciclados em uma instalação no estado do Maine, nos EUA.

Mas a remoção é cara e costuma ser difícil localizar equipamentos em vastas extensões do oceano com centenas de metros de profundidade. Baziuk sugere que é melhor focar em habitats criticamente ameaçados, como recifes de corais, manguezais e locais com espécies ameaçadas de extinção. Mas o melhor método mesmo é a prevenção, garantindo que o plástico não caia no oceano.

COMO PREVENIR?

A educação é fundamental. Os pescadores sabem que isso está acontecendo, mas muitos não entendem a extensão do problema. Uma vez informados, eles podem optar por melhorar seus métodos.

Além disso, quanto mais o público souber sobre o problema, mais poderá defender uma mudança junto aos representantes do governo. Portanto, grande parte do alcance da iniciativa Global Ghost Gear é de natureza educacional.

A GGGI oferece consultoria sobre melhores práticas para diferentes entidades, incluindo governos, pescadores e fabricantes. Por exemplo, os pescadores podem tentar pescar em climas menos extremos, quando possível, ou longe de onde outras pescarias ocorrem, para que as redes não se enrosquem nas que já estão no local.

Os fabricantes de equipamentos de pesca, por sua vez, podem encontrar novas maneiras de produzir materiais biodegradáveis, bem como equipamentos mais facilmente rastreáveis.


SOBRE O AUTOR

Talib Visram escreve para a Fast Company e é apresentador do podcast World Changing Ideas. saiba mais