Startup armazena CO2 retirado da atmosfera em rochas vulcânicas

A paisagem vulcânica do Quênia é ideal para esse processo, e o país espera se tornar referência em remoção de carbono

Crédito: Francis Kimani/ Cella Mineral Storage

Adele Peters 4 minutos de leitura

Em uma área remota e árida do norte do Quênia, um novo projeto-piloto começará em breve a injetar CO2 em rochas vulcânicas a mais de 400 metros de profundidade, onde o gás do efeito estufa se transformará também em pedra.

Trata-se de um processo que provou sua eficácia na Islândia, onde uma usina de remoção de carbono já extrai CO2 da atmosfera e o bombeia para o subsolo. O Quênia, que tem uma geologia semelhante, pretende construir sua própria indústria de remoção de carbono.

Essa tecnologia acelera algo que acontece naturalmente: quando o dióxido de carbono na água atinge certos tipos de rochas, como o basalto vulcânico, causa uma reação química que liga o CO2 ao cálcio e ao magnésio.

A África pode se tornar o primeiro continente a ostentar o título de carbono negativo.

“O processo consiste em cultivar novos minerais no subsolo que transformam o CO2 em uma rocha sólida”, explica Claire Nelson, cofundadora e diretora científica da Cella Mineral Storage, startup que está fazendo parceria com uma empresa de energia geotérmica no novo projeto no Quênia. Com formação em geoquímica, ela é também pesquisadora de pós-doutorado na Universidade de Columbia.

A empresa é uma das últimas a obter financiamento da Frontier, iniciativa que investe quase US$ 1 bilhão em projetos de remoção de carbono – que vão desde enterrar madeira até espalhar brita sobre campos agrícolas. A iniciativa, apoiada por empresas como Stripe e Alphabet, oferece suporte a empresas em estágio inicial que sejam pioneiras em novas formas de capturar CO2 permanentemente.

Enquanto o mundo tenta reduzir as emissões, os cientistas do clima alertam que, simultaneamente, esse tipo específico de remoção de carbono precisa ser feito. Afinal, os métodos naturais, como plantar árvores, podem não bastar para resolver totalmente o problema.

Crédito: Francis Kimani/ Cella Mineral Storage

A paisagem vulcânica do Quênia, repleta de basalto, é perfeita para o processo de transformação de CO2 em pedra. O país também opera com mais de 92% de energia renovável, que pode alimentar de forma limpa o processo de sugar CO2 do ar, que gasta muita energia.

A Cella Mineral fará parceria com outra empresa que construirá uma planta de “captura direta de ar”. O piloto inicialmente comprará CO2, mas só para provar que esse processo de sequestro funciona.

os métodos naturais, como plantar árvores, podem não bastar para resolver totalmente o problema do clima.

“Quando alguém pensa na remoção de carbono em larga escala, faz mais sentido apostar em um lugar onde há uma tonelada de energias renováveis”, diz Claire Nelson. Hoje, aproximadamente metade da eletricidade do Quênia vem da energia geotérmica e as usinas planejadas dobrarão essa quantidade até 2027. Junto com as energias hidrelétrica, eólica e solar, o país espera operar com 100% de energia limpa até o final da década.

Como a demanda no país é inconsistente, a rede atualmente produz um excedente de energia limpa. Essa energia extra poderia operar 20 grandes instalações de remoção de carbono, sem qualquer impacto nas outras necessidades energéticas do país.

Além disso, se houver uma demanda constante por parte de novas usinas, isso ajudará a reduzir os preços da energia para os consumidores – que, no momento, estão pagando preços altos pela energia extra que a indústria não está usando.

GRANDE VALE DO CARBONO

James Mwangi, co-fundador da Climate Action Platform-Africa, é um dos nomes por trás do esforço para transformar o Vale do Rift, repleto de vulcões no Quênia, naquilo que ele chama de “Grande Vale do Carbono”. O projeto da Cella será o primeiro na área.

“Estamos acostumados a pensar no continente africano em termos de suas florestas, turfeiras, pastagens, suas zonas úmidas que precisam ser preservadas”, disse Mwangi em uma palestra TED no início deste ano.

O presidente do Quênia quer que a próxima exportação significativa do país sejam créditos de carbono.

“Certamente devemos continuar a investir nas comunidades indígenas, nos pequenos agricultores e nos inovadores locais que estão protegendo e expandindo os sumidouros naturais de carbono. Mas isso não deve nos cegar para o fato de que a África também tem um bom potencial para escalar as tecnologias climáticas mais recentes e mais ambiciosas.”

O continente, que já tem a pegada per capita mais baixa do mundo, pode se tornar o primeiro a ostentar o título de carbono negativo, prevê Mwangi. 

No norte do Quênia, uma nova usina geotérmica de 140 megawatts entrará em operação no segundo trimestre de 2023. A Cella planeja iniciar o projeto piloto ao mesmo tempo, testando outras técnicas, como reutilizar água salgada dos próprios processos da usina geotérmica. Se tudo correr bem, trabalhará com uma empresa de captação direta de ar para lançar, no final do ano que vem, um projeto comercial completo no local. 

Uma coisa é certa: o Quênia quer que essa indústria cresça rapidamente. Em um discurso recente, o seu presidente, William Ruto, disse que a próxima exportação significativa do país serão os créditos de carbono.


SOBRE A AUTORA

Adele Peters é redatora da Fast Company. Ela se concentra em fazer reportagens para solucionar alguns dos maiores problemas do mundo, ... saiba mais