Startup produz cimento “carbono neutro” a partir de microalgas

A produção de cimento é responsável por cerca de 8% das emissões globais de carbono. Mas o uso de microalgas pode reduzir drasticamente essa pegada

Crédito: Eran Menashri/ Unsplash/| Alison R. Taylor/ University of North Carolina Wilmington Microscopy Facility/ Wiki Commons

Adele Peters 3 minutos de leitura

Durante uma viagem de lua de mel para a Tailândia, enquanto flutuava sobre um recife de coral e contemplava a beleza da natureza, Wil Srubar teve um insight sobre... cimento!

No recife, as microalgas cultivam carbonato de cálcio, um material essencial para fazer cimento, a cola que mantém o concreto unido. Foi pensando nisso que Srubar, cientista de materiais e professor na Universidade do Colorado em Boulder, percebeu que esse tipo de alga poderia ajudar a reduzir a enorme pegada de carbono da indústria de concreto.

“Eu já vinha trabalhando muito com cimentos alternativos”, ele conta. “Mas foi só quando mergulhei com snorkel que comecei a pensar sobre como esses organismos, algas macro e microscópicas, desenvolvem essas estruturas. Tudo o que elas precisam é de luz do sol, água do mar e CO2.”

Cultivadas em larga escala em lagoas, as microalgas, chamadas cocolitóforos, têm o potencial de abastecer a indústria de cimento com outra fonte de carbonato de cálcio.

A produção de cimento é responsável por cerca de 8% das emissões globais, mais que o dobro do setor aéreo. Uma parte vem do uso de energia. Mas a química básica do processo também traz problemas ambientais.

A fabricação do cimento envolve o aquecimento do calcário (composto de carbonato de cálcio), que desencadeia uma reação química, liberando enormes quantidades de CO2. Srubar descobriu que, se o calcário puder ser fabricado com algas – e capturar CO2 conforme cresce –, parte do processo se tornará neutro em carbono.

Micrografia eletrônica de varredura de uma única célula de cocolitóforo (Crédito: Alison R. Taylor/ Wilmington Microscopy Facility/ Universidade da Carolina do Norte/ / Wiki Commons]

Se esse tipo de calcário “biogênico” for combinado a outras mudanças na produção de cimento, incluindo uma transição para energia limpa e para a captura de carbono, a produção pode até ser negativa em carbono. O que significa que ela pode, no futuro, capturar mais CO2 do que produz.

Várias startups estão trabalhando, de diversas maneiras, para reduzir as emissões em cimento e concreto. A Brimstone Energy, por exemplo, substitui o calcário por uma rocha diferente, que não emite CO2. Outra empresa, a Biomason, usa bactérias e outros materiais para formar carbonato de cálcio. Outras ainda substituem parcialmente o cimento por materiais diferentes ou incorporam o CO2 capturado no concreto.

Srubar, que desenvolveu sua pesquisa sobre microalgas na startup Minus Materials, afirma que usar microalgas para fabricar calcário tem vantagens únicas. Primeiro porque, diferentemente de algumas alternativas, o produto final é o cimento Portland, padrão da indústria, que tem uma composição química específica.

“Não precisaremos mudar nada na produção de cimento Portland”, diz ele. Nenhum equipamento novo é necessário e o produto já atende aos padrões em vigor. Essa alternativa pode reduzir as emissões em 60% ou, se combinada com outras mudanças, em mais de 100%. Também pode ser competitiva em custo. “Temos um caminho para a paridade de custos do calcário tradicional”, garante Srubar.

Demonstração piloto do concreto da Minus Materials, em colaboração com a Microsoft, a Universidade do Colorado em Boulder e o Boulder Ready-Mix Concrete. [Crédito: Minus Materials]

Como outros microrganismos, as algas crescem rapidamente, dobrando de tamanho em poucas horas. A startup estima que poderá crescer entre 25 e 50 toneladas de calcário por hectare, por ano. O custo tem potencial para ser baixo porque as algas também podem ser utilizadas para fabricar outros produtos.

Elas podem, por exemplo, ser transformadas em ingredientes para alimentos ou cosméticos, ou em biocombustível. “As algas são muito ricas em ácidos graxos, lipídios, proteínas e açúcares, que são precursores de alguns produtos químicos de alto valor”, diz Srubar.

Concreto contendo calcário biogênico (Crédito:Minus Materials)

A Minus Materials, que recebeu um investimento inicial não revelado da SOSV (empresa global de capital de risco), planeja captar mais recursos no segundo semestre e espera iniciar a produção em escala de testes dentro de 12 a 24 meses. Também já começou a fornecer pequenas amostras para parceiros da indústria cimenteira e outras empresas, como a Microsoft, que buscam novas formas de descarbonização.

Srubar pretende, um dia, formar uma rede de produção que possa fornecer o calcário biogênico localmente, em todo o mundo. “O que queremos demonstrar com nosso cultivo piloto em escala de teste é que este é um modelo replicável em qualquer lugar do mundo”, diz ele.


SOBRE A AUTORA

Adele Peters é redatora da Fast Company. Ela se concentra em fazer reportagens para solucionar alguns dos maiores problemas do mundo, ... saiba mais