Tecnologia de captura de carbono direto do ar pode não escapar do “vale da morte”
Sem apoio, algumas tecnologias emergentes de captura de carbono diretamente do ar podem desaparecer antes mesmo de mostrar seu potencial

Há um ano, a captura de carbono diretamente do ar – tecnologia que remove CO₂ da atmosfera – parecia pronta para ganhar escala rapidamente nos Estados Unidos.
O Project Cypress, uma megaestrutura no estado da Louisiana projetada para capturar mais de um milhão de toneladas de CO₂ por ano, recebeu US$ 50 milhões em financiamento do Departamento de Energia (DOE) no início de 2024. No Texas, outro grande hub de captura direta também garantiu recursos. Juntos, os projetos poderiam receber até US$ 1,1 bilhão do DOE.
Pioneira no setor e uma das parceiras do projeto na Louisiana, a Climeworks estava contratando equipe nos EUA, ampliando uma nova planta na Islândia e assinando grandes contratos de remoção de carbono com empresas como British Airways e Morgan Stanley.
A Heirloom, outra empresa de tecnologia envolvida no hub da Louisiana, fechou uma rodada de investimento de US$ 150 milhões. A CarbonCapture, também do setor, levantou US$ 80 milhões. Vários outros projetos de captura de carbono diretamente do ar obtiveram subsídios do governo norte-americano.
Agora, o cenário é outro. Em um primeiro pacote de cortes, segundo uma lista vazada, o DOE pode cancelar cerca de US$ 50 milhões destinados a 10 projetos diferentes.
Os cortes fazem parte de um montante de mais de US$ 7,5 bilhões em cancelamentos que o governo vem chamando de financiamento do “Green New Scam” (algo como "novo golpe verde). O termo é um trocadilho com o “Green New Deal”, um conjunto de propostas para reduzir emissões de carbono, estimular energia limpa e criar empregos verdes.
Uma segunda planilha vazada indica que os hubs da Louisiana e do Texas também estão em risco. No início deste ano, a Heirloom demitiu parte dos funcionários e teria cancelado um projeto. A Climeworks também promoveu uma rodada de demissões. Por outro lado, alguns projetos continuam avançando e um importante crédito fiscal ainda está assegurado.

O apoio governamental não é a única base da indústria, mas a tecnologia ainda vive no chamado “vale da morte” – momento em que ainda não atingiu escala comercial – e cortes desse porte seriam um golpe severo. Mesmo com outros países oferecendo incentivos, o movimento pode desacelerar o setor globalmente.
“Isso pode desacelerar substancialmente”, afirma Eric O’Rear, diretor associado da consultoria de economia e políticas Rhodium Group. “Do ponto de vista regulatório, os EUA estavam realmente dominando esse espaço.”
DO BOOM À INCERTEZA
Como indústria, a captura de carbono diretamente do ar ainda está engatinhando. A tecnologia foi comprovada em laboratório há 26 anos, mas a primeira planta comercial, operada pela Climeworks na Islândia, só foi inaugurada em 2021.
Foi um marco, mas irrisório diante da necessidade: capturar cerca de quatro mil toneladas de CO₂ por ano – o equivalente, aproximadamente, às emissões de 930 carros movidos a gasolina no mesmo período.
Para enfrentar a crise climática, o mundo pode precisar capturar 10 bilhões de toneladas de CO₂ por ano até a metade do século, segundo uma estimativa da Academia Nacional de Ciências dos EUA. Isso somado a reduções drásticas de emissões, não como substituição.

Críticos argumentam que a tecnologia é cara demais para ser uma solução viável. Mas as empresas do setor afirmam que a expansão vai reduzir custos, tanto pelo ganho de escala quanto pelo aprendizado contínuo de engenheiros e aprimoramento de materiais e processos.
“No cenário global, estamos vendo a remoção de carbono continuar a crescer”, diz Ben Rubin, diretor executivo do Carbon Business Council. “A grande questão é: onde estarão os benefícios econômicos e onde estarão os empregos?”.
Para enfrentar a crise climática, o mundo precisar capturar 4 mil toneladas de CO₂ por ano.
Para o clima, tanto faz se a captura direta acontece nos EUA, na Islândia ou no Quênia. Mas o governo dos EUA, sob Joe Biden, vinha assumindo liderança para acelerar o desenvolvimento da tecnologia. Mudanças políticas podem atrasar o progresso global.
Mesmo empresas que já operam com custos mais baixos podem enfrentar mais obstáculos para captar investimentos agora. “Com esse recuo no apoio do governo dos EUA, haverá maior incerteza quanto ao ambiente de investimentos no país”, afirma O’Rear.
À medida que o planeta ultrapassa 1,5 ºC de aquecimento, faz sentido testar o máximo de soluções possíveis. Mas, sem apoio, algumas tecnologias emergentes podem desaparecer antes mesmo de mostrar seu potencial.