Têxteis produzidos por micróbios podem substituir tecidos sintéticos

A Modern Synthesis desenvolveu uma maneira de criar tecidos a partir de um micróbio

Crédito: Modern Synthesis

Adele Peters 4 minutos de leitura

Em seu novo laboratório em Londres, a Modern Synthesis mistura açúcar de resíduos de plantas com micróbios em biorreatores. Dentro deles, a startup está cultivado “tecidos microbianos” – matéria-prima que, no futuro, pode ajudar a substituir o couro e tecidos sintéticos feitos a partir de combustíveis fósseis.

“O que estamos tentando desenvolver é uma nova bioeconomia construída em torno de sistemas mais eficientes, que convertem resíduos – no nosso caso, açúcares residuais da produção agrícola ou de outras fontes – em materiais de alta qualidade que, além de tudo, são sustentáveis”, diz a cofundadora Jen Keane.

“A biologia é a última palavra em economia circular”, diz ela. "Depois de usados, nossos materiais podem ser reciclados ou até mesmo compostados, dependendo de como são feitos."

Crédito: Modern Synthesis

Anteriormente, Keane trabalhou com design de materiais na Adidas, onde ajudou a fabricar tênis a partir de resíduos plásticos encontrados no oceano. Mas esse trabalho a fez perceber como, antes de tudo, a indústria era dependente de materiais sintéticos.

“Embora estivéssemos reciclando o plástico, o que é um primeiro passo importante, essa não seria a solução final”, ela conta. “Eu queria dar outro passo: ‘ok, mas como podemos, então, repensar fundamentalmente a maneira como abordamos os materiais?’”

Ela ingressou em um programa de mestrado em biodesign e começou a se reunir com pesquisadores de biologia sintética do Imperial College de Londres que estudavam uma bactéria encontrada no kombucha, chamada K. rhaeticus, que produz um material chamado nanocelulose.

Crédito: Modern Synthesis

A celulose é o verdadeiro bloco de construção do mundo natural. Está presente no algodão, na madeira, no linho e em muitos dos materiais que temos hoje. “Mas essas bactérias produzem celulose em uma escala tão pequena que as fibras são superfortes e se ligam umas às outras naturalmente”, explica Keane.

As fibras são mais fortes que o Kevlar e sua resistência à tração (a quantidade de estresse que algo pode suportar antes de ser rompido) é maior que a do aço. Embora a nanocelulose já seja usada em alguns produtos – como máscaras faciais e curativos para ajudar a tratar feridas –, Keane estava interessada em entender como ela poderia ser aplicada na indústria de vestuário

Crédito: Modern Synthesis

Trabalhando em conjunto com o cofundador Ben Reeve, cientista do Imperial College, Keane desenvolveu um novo sistema para criar tecidos com esse micróbio.

O processo começa usando um robô para construir outras fibras naturais em um andaime para os micróbios crescerem. À medida que os micróbios se alimentam de açúcar, eles “tecem” o novo tecido em torno da forma do andaime, formando um híbrido que inclui tanto o material original do andaime quanto a nanocelulose produzida pelos micróbios.

“Você pode usar estruturas têxteis que, de outra forma, não seriam estruturalmente sólidas”, diz Keane. “Podemos criar essas estruturas quase semelhantes a redes, que seriam bastante frágeis ou se desmanchariam por conta própria. Na verdade, eles são fortalecidos pelo biomaterial.”

Também é possível desenvolver um produto final – o primeiro protótipo de Keane como estudante foi um sapato formado pelos micróbios. Mas ela diz que a empresa planeja começar fabricando um material que as marcas de roupas sejam capazes de cortar e costurar, para que possam ser medidos e manuseados com mais facilidade.

As primeiras amostras do material produzido na instalação piloto da empresa são diferentes de qualquer outro material existente. “É naturalmente transparente e quase parece um náilon ou um tecido sintético realmente técnico”, diz Keane. “Mas a sensação é muito mais natural. E é adaptável em termos de toque.”

Pode ser mais flexível, por exemplo, ou mais grosso. Também pode ser projetado para maior durabilidade, embora isso signifique que o material não vai se biodegradar naturalmente com tanta facilidade.

Crédito: Modern Synthesis

Se substituirmos os tecidos sintéticos, isso pode ajudar a evitar a pegada ambiental do uso de petroquímicos. Segundo uma estimativa, todos os anos cerca de 350 milhões de barris de petróleo bruto são usados para fabricar têxteis sintéticos.

Se o material biológico for ajustado para parecer couro, pode ajudar também a evitar os problemas ambientais e éticos envolvidos na criação de gado. A Bucha Bio, por exemplo, é outra startup que está usando técnicas semelhantes para criar alternativas de couro.

Desde que se se mudou para o novo laboratório, há um mês, a Modern Synthesis está focada em fazer amostras que demonstrem como o seu material pode ser usado.

Atualmente, fabrica folhas inteiras do material para as marcas usarem em protótipos, embora seja necessário mais pesquisa e desenvolvimento para atender aos seus rigorosos padrões de materiais, diz Keane. Nos próximos anos, ela planeja passar para a produção em larga escala.

Crédito: Modern Synthesis

A empresa está usando uma mistura de equipamentos para tentar facilitar o crescimento. “Nossa primeira prioridade é como podemos adaptar o que existe para aproveitar a capacidade que há no mercado para absorver esses materiais”, disse Keane

A maior questão para a startup, assim como para outras empresas do mesmo setor é quão rápido é possível aumentar sua escala de produção. “Porque a demanda, sem dúvida, existe”, garante Keane.


SOBRE A AUTORA

Adele Peters é redatora da Fast Company. Ela se concentra em fazer reportagens para solucionar alguns dos maiores problemas do mundo, ... saiba mais