Transição para energia limpa deverá custar bem menos do que se pensava

Novo relatório argumenta que as estimativas não estavam considerando as reduções decorrentes da diminuição no uso de combustíveis fósseis

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Dan Gearino 4 minutos de leitura

A transição global para a energia limpa tem um custo, mas ele pode ser muito menor do que as estimativas apontavam. E a diferença é enorme, chegando a trilhões e até dezenas de trilhões de dólares. 

Uma  nova  análise feita pelo RMI, grupo de defesa da pesquisa em energia limpa, identificou aquilo que seus autores classificam como um erro crasso em muitas dessas estimativas: nenhuma delas leva em consideração a totalidade da redução dos gastos com o abandono dos combustíveis fósseis. 

“Esse tipo de argumento de que a transição requer progressivos aumentos de gastos é simplesmente equivocado”, afirma Kingsmill Bond, um dos coautores do relatório e da análise do RMI. 

O relatório calcula que o gasto global em fornecimento de energia em 2030 (incluindo todo o dinheiro necessário para equipamentos, propriedades e outras despesas) será de aproximadamente US$ 2,5 trilhões – partindo do gasto, em 2023, de US$ 2,2 trilhões. “É um crescimento de 2% por ano”, completou Bond. “Em uma base líquida, não é tanto assim”. 

A análise do RMI não considera nenhum dos benefícios financeiros que viriam como consequência da diminuição das ameaças relativas à mudança climática, como a redução nos gastos com tratamentos de doenças do coração e com danos a propriedades.

Esse relatório serve como um contraponto às estimativas divulgadas por outras instituições, incluindo a McKinsey e a Agência Internacional de Energia dos EUA (IEA).

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Em um relatório de 2022,  a McKinsey previu que os gastos com sistemas de energia e com o uso da terra na transição para uma rede limpa seriam da ordem de US$ 9,2 trilhões por ano, em média, entre 2012 e 2050. Isso implicaria um crescimento anual de aproximadamente US$ 3,5 trilhões em relação aos níveis de gasto atuais.

Os autores da pesquisa da McKinsey observaram que esse aumento nos custos equivaleria a metade dos lucros corporativos globais e a um quarto da receita tributária global.

Essas previsões são assustadoras, mas, de acordo com Bond, são enganosas. A McKinsey está fazendo uma comparação injusta, ele argumenta, porque tanto a economia global quanto os gastos com energia estão crescendo ao mesmo tempo, e ambos cresceriam de qualquer forma, independentemente de o sistema estar baseado em combustíveis fósseis ou não.

a McKinsey previu que os gastos com a transição para uma rede de energia limpa seriam da ordem de US$ 9,2 trilhões por ano entre 2012 e 2050.

Uma comparação mais justa seria entre uma economia com a meta de zerar as emissões e uma economia que continuasse fazendo “negócios como sempre” e que adotasse um ritmo de transição mais lento para a energia limpa.

A McKinsey inclui esse tipo de comparação mais adiante em seu relatório, mostrando que a média anual de crescimento no caso de uma rede carbono zero seria de aproximadamente US$ 1 trilhão por ano.  

Já o IEA afirma que o capital gasto em energia era de US$ 2,8 trilhões em 2023 e que ele aumentaria para mais de US$ 4 trilhões em 2030, mesmo com zero emissões – cenário que também foi considerado em seu relatório World Energy Outlook.

AJUSTES JUSTIFICADOS

Bond e seus colegas coautores da análise argumentam que as estimativas da IEA estão erradas, porque misturam diferentes categorias de custos, alguns dos quais não deveriam ser incluídos. 

“Fica um pouco difícil responder às críticas que recebemos, porque elas são vagas e pouco claras”, se defende Tim Gouldt, líder de economia energética da IEA. Ele afirma que a agência claramente considera as quedas nos gastos decorrentes da diminuição do uso de combustíveis fósseis. Por isso, na sua opinião, a crítica do RMI é equivocada.  

Vale deixar claro que o relatório do RMI utilizou as estimativas de gasto da IEA como base para a sua análise e que, sendo assim, as duas previsões têm muito em comum. A diferença é que o RMI faz aquilo que os autores chamam de “ajustes justificados” nos números da IEA, com base no argumento mais amplo de que a economia gerada pela redução dos combustíveis fósseis deveria ser contabilizada como parte da redução dos custos da transição energética.

A análise do RMI não considera os benefícios financeiros que viriam com a diminuição das ameaças relativas à mudança climática.

Acho que a abordagem de Bond é convincente, inclusive sua ideia de que o mundo tem dinheiro mais do que suficiente para bancar uma transição mais rápida. Mas existem alguns pontos fracos, como generalizar uma transição cujo preço varia tanto de país para país como de região para região. 

O relatório reconhece que existe uma lacuna de dados disponíveis para estimar os gastos com mercados emergentes de energia, como algumas regiões da África. Se a transição nesses lugares for excepcionalmente devagar e mais cara do que o usual, isso poderia derrubar a tese do relatório. 

A lição mais importante que se pode tirar desse relatório é que a transição para energia limpa não é algo sobrenatural, ou algo que devemos temer porque teria custos astronômicos. Na verdade, nós já estamos trilhando esse caminho. 

A questão fundamental não é o destino final, mas o quão rápido vamos conseguir chegar lá.  

Este artigo foi publicado originalmente no Inside Climate News e reproduzido com permissão.


SOBRE O AUTOR

Dan Gearino é jornalista especializado na cobertura do setor de energia. saiba mais