Unicef enfrenta dificuldades para levar ajuda humanitária a Gaza

Antes da guerra, cerca de 500 caminhões com suprimentos cruzavam a fronteira todos os dias. Agora, a situação está muito mais difícil

Créditos: pawel.gaul/ iStock/ Eyad El Baba/ Unicef

Adele Peters 4 minutos de leitura

Quando os caminhões da Unicef chegam à fronteira de Gaza com suprimentos como água e alimentos, nem sempre há combustível suficiente disponível na região para a próxima etapa da entrega – então a agência da ONU às vezes precisa recorrer a carroças puxadas por burros.

A escassez de combustível é apenas um dos muitos desafios que as agências humanitárias enfrentam em Gaza. E a situação continua piorando: um relatório recente da ONU afirma que aproximadamente metade da população, ou quase um milhão de pessoas, corre o risco de morrer de fome. Cerca de 90% dos habitantes relatam passar regularmente um dia inteiro sem comer.

“As crianças com quem conversamos, que estão na fila [por comida], dizem que esperam por duas, três, quatro horas”, relata Tess Ingram, porta-voz da Unicef, agência da ONU que se dedica a proteger a infância. “Se elas não conseguirem alimento, suas famílias não comerão naquele dia.”

Antes do início da guerra, há três meses, Gaza já estava em crise. Um bloqueio que restringe fortemente o tráfego de pessoas e mercadorias pela fronteira está em vigor desde que o Hamas assumiu o poder em 2007, e a maioria dos residentes já dependia de ajuda humanitária.

Cerca de 500 caminhões com suprimentos cruzavam a fronteira todos os dias. Após o início da guerra, nenhuma ajuda pôde entrar por duas semanas. Quando as entregas foram retomadas, apenas um número pequeno de caminhões foi autorizado a entrar, apesar de a maioria dos palestinos ter sido forçada a deixar suas casas e, com isso, a necessidade de ajuda ter aumentado drasticamente.

Crédito: Eyad El Baba/ Unicef

A Unicef envia suprimentos da Europa para o Egito, onde são carregados em caminhões. Itens como roupas infantis, vitaminas para gestantes, suplementos alimentares como o Plumpy’Nut (suplemento terapêutico para crianças com desnutrição) e outros produtos de emergência, incluindo barracas e cobertores, são levados à região para aliviar a crise. Kits de higiene com sabonete, toalhas e fraldas agora estão sendo adquiridos no Egito ou na Jordânia, devido à urgência.

Em Rafah, um ponto de entrada para Gaza na fronteira com o Egito, autoridades egípcias e israelenses inspecionam os produtos. O mesmo acontece em outro posto de fronteira em Israel. Muitos itens não são autorizados e ficam retidos. “Temos geradores presos na área de triagem há semanas, tubulações que precisamos usar para reparar sistemas de água e materiais de construção para construir mais banheiros”, afirma Ingram.

Em uma área do sul de Gaza para onde centenas de milhares de pessoas fugiram, a ONU estima que agora há apenas um banheiro para cada 700 pessoas. A falta de saneamento aumenta o risco de doenças, especialmente para crianças desnutridas.

Crédito: Eyad El Baba/ Unicef

As agências humanitárias também enfrentam vários outros problemas. Devido ao perigo de bombardeios e combates ativos, as Nações Unidas precisam limitar o número de pessoas na região. Aqueles que estão em missão nem sempre conseguem chegar aonde precisam.

“Precisamos de acesso humanitário seguro para podermos realizar nosso trabalho e, no momento, isso é muito difícil, especialmente no norte”, relata Ingram.

Além disso, as agências enfrentam uma escassez de caminhões para fazer entregas, já que novos veículos não têm permissão para cruzar a fronteira. A falta de produtos importados nas lojas desde o início da guerra também aumenta a pressão sobre a quantidade já limitada de ajuda disponível.

De acordo com a Human Rights Watch, os soldados israelenses destruíram fazendas e pomares, e a falta de água na região impede a produção de alimentos, o que reduz ainda mais a oferta.

Crédito: Eyad El Baba/ Unicef

Quedas nos serviços de telefonia e internet são comuns, tanto em razão de ataques a instalações de telecomunicações quanto da falta de combustível. “Para levar suprimentos médicos para um hospital, precisamos ser capazes de nos comunicar com outros colegas, como [a Organização Mundial da Saúde] ou mesmo a equipe do hospital, para dizer o que temos e quando chegaremos lá”, explica Ingram.

No dia 8 de janeiro, após pressão internacional, Israel anunciou uma fase menos intensa da guerra e afirmou que pretendia permitir a entrada de mais ajuda humanitária em Gaza. No entanto, um porta-voz do governo disse ao “The New York Times” que o país não está restringindo a ajuda e culpou o Hamas por se apossar das entregas.

“A escala das necessidades nessa situação e os desafios que temos pela frente realmente só podem ser resolvidos com o fim dos combates”, defende Ingram. “Não podemos atender adequadamente às necessidades humanitárias na situação atual com essas limitações.”


SOBRE A AUTORA

Adele Peters é redatora da Fast Company. Ela se concentra em fazer reportagens para solucionar alguns dos maiores problemas do mundo, ... saiba mais