Veículos elétricos vão tornar o problema dos “químicos eternos” ainda pior

Um novo estudo descobriu que as baterias de íons de lítio, que abastecem milhões de veículos elétricos, podem liberar PFAS no ar, na água e no solo

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Jessica Hullinger 4 minutos de leitura

Um dos grandes desafios da transição energética é livrar a humanidade, de forma rápida e sustentável, dos combustíveis fósseis que aquecem o planeta. Muitos ambientalistas se preocupam com o fato de que, em nosso desespero para resolver o problema do aquecimento global, vamos acabar recorrendo a novas tecnologias antes de entender totalmente suas possíveis desvantagens. 

E há cada vez mais evidências de que esse pode ser o caso das baterias que alimentam milhões de veículos elétricos. Um novo estudo, publicado na revista "Nature Communications", revela que as baterias de íon-lítio contêm "produtos químicos eternos" (PFAS, na sigla em inglês) que poluem o ar e a água. 

Os PFAS são produtos químicos artificiais geralmente usados para tornar os produtos resistentes a substâncias como graxa e água. No entanto, a exposição de seres humanos aos PFAS por meio de alimentos, água e ar contaminados tem sido associada a vários problemas de saúde, inclusive câncer de rim e testicular, baixo peso ao nascer e colesterol alto.

Por essas razões, a Agência de Proteção Ambiental dos EUA começou a reprimir o uso desses produtos. Apesar disso, as baterias de íon-lítio podem ser desconsideradas como fonte desses poluentes indesejáveis por conta da pressa em aumentar a adesão aos veículos elétricos e de se arranjar uma forma de armazenar energia limpa.

Nas baterias de íon-lítio, um tipo de produto químico eterno chamado bis-perfluoroalquil sulfonimidas, ou bis-FASIs, é frequentemente usado como eletrólito, o que permite que uma carga elétrica viaje entre o cátodo e o ânodo da bateria. Para esse estudo, os pesquisadores queriam medir como os bis-FASIs penetram no meio ambiente no início e no final da vida útil de uma bateria. 

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Eles testaram o ar, a água, o solo e os sedimentos próximos às fábricas de íons de lítio e encontraram concentrações elevadas de compostos bis-FASIs, que, segundo eles, podem percorrer longas distâncias no ar, "o que significa que áreas distantes dos locais de fabricação também podem ser afetadas", de acordo com os pesquisadores.

Eles também encontraram bis-FASIs em aterros sanitários, sugerindo que esses produtos químicos estão sendo liberados no solo depois que as baterias de íon-lítio são jogadas fora – um dado preocupante, considerando-se que apenas 5% dessas baterias são recicladas.

Com a projeção de aumento da demanda por baterias de íon-lítio nos próximos anos, espera-se que cerca de oito milhões de toneladas delas sejam descartadas em aterros sanitários até 2040.

ALTERNATIVAS MAIS "LIMPAS"

É preocupante o fato de que pouco se sabe sobre como os bis-FASIs afetam a saúde humana. Mas o estudo sugere que, quando os peixes são expostos a níveis ainda que baixos desses tipos de produtos, seu comportamento muda, assim como seu metabolismo. Considerando o que sabemos sobre outros PFAS, não é absurdo presumir que eles também possam ser perigosos para os seres humanos. 

"Nossos resultados revelam um dilema associado à fabricação, ao descarte e à reciclagem da infraestrutura de energia limpa", diz Jennifer Guelfo, professora associada de engenharia ambiental da Texas Tech University e uma das autoras do estudo.

PFAS são produtos químicos artificiais geralmente usados para tornar os produtos resistentes a substâncias como graxa e água.

"A redução das emissões de CO2 com inovações como carros elétricos é fundamental, mas não deveria ter como efeito colateral o aumento da poluição por PFAS. Precisamos facilitar tecnologias, controles de fabricação e soluções de reciclagem que possam combater a crise climática sem liberar poluentes altamente resistentes."

Os PFAS não são a única desvantagem ambiental das baterias de íon-lítio. Elas precisam de grandes quantidades de energia e água para serem produzidas, e a mineração de lítio causa estragos nas comunidades e no meio ambiente ao seu redor.

A boa notícia é que existem algumas alternativas promissoras, como as baterias de íons de sódio e as de estado sólido. Os pesquisadores afirmam que os métodos que estão sendo usados atualmente para remover os PFAS da água também poderiam funcionar com os bis-FASIs – embora isso seja extremamente caro e não trate de outras fontes de contato, como o ar. 

Os autores do estudo esperam que suas descobertas sirvam como um alerta para que se pense com cuidado e de forma mais crítica sobre as novas tecnologias de energia limpa. "Deveríamos usar o impulso por trás das iniciativas atuais de energia para garantir que as novas tecnologias de energia sejam realmente limpas."


SOBRE A AUTORA

Jessica Hullinger é jornalista especializada em mudanças climáticas, inovação e ciência. saiba mais