Um café e um docinho: pequenos gastos podem sabotar suas finanças
Despesas que passam despercebidas no dia a dia, se bem planejadas, podem se transformar em investimento e financiar um projeto, como uma viagem

Aquela pausa rápida depois do almoço para tomar um café e comer um docinho fora de casa pode parecer inofensiva. Afinal, nada mais natural do que estreitar relacionamentos de trabalho em um momento prazeroso como o do cafezinho acompanhado da sobremesa.
Mas, ao final de um ano, esse pequeno ritual pode representar milhares de reais que simplesmente evaporaram entre pequenos goles de um expresso ou as dentadas em um irresistível brigadeiro. Ou melhor, foram bebidos e mordidos.
E se esse dinheiro fosse direcionado para algo maior, como uma viagem, uma reserva de emergência ou um investimento? O impacto pode ser surpreendente.
O PESO DAS PEQUENAS ESCOLHAS
“Esse tipo de economia cotidiana funciona como um ‘vazamento invisível’ no orçamento. A gente não percebe por que o valor parece pequeno. Mas, no acumulado do ano, pode representar uma boa quantia”, explica Carol Stange, consultora de investimentos e educadora financeira.
Carol estima que, em um cenário radical, ao cortar R$ 20 por dia útil com cafezinhos e docinhos, é possível economizar R$ 5.040 no ano.
Já Carlos Castro, coordenador da comissão de embaixadores da Planejar, faz uma projeção que aponta para um valor ainda mais alto: “dependendo da quantidade de dias úteis no ano, essa economia pode chegar a até R$ 7.200”.
Segundo Casto, o problema é que muitos brasileiros não projetam os gastos em bases anuais — diferentemente dos americanos —, o que dificulta enxergar o impacto real desses pequenos hábitos.
SIMULAÇÕES PRÁTICA: DO MÍNIMO AO RADICAL*
Você tem noção de quanto gasta ao tomar o expresso de todo dia - ainda mais com a disparada do preço do café - e daquele docinho indulgente, principalmente em meio a tensão da rotina profissional? Já parou para fazer as contas, mesmo que uma estimativa? Prepara-se! Você vai se espantar com o dinheiro desembolsado em despesas como essas.
Pensando em diferentes perfis de consumo, montamos três cenários de economia ao longo de 12 meses:
- Esforço mínimo: cortar o cafezinho e o doce 1x por semana = R$ 20/semana = R$ 1.040/ano
- Moderado: cortar 3 dias por semana = R$ 60/semana = R$ 3.120/ano
- Radical: cortar todos os dias úteis (5x por semana) = R$ 100/semana = R$ 5.200/ano
Os valores podem ser ainda maiores se considerarmos a capitalização com investimentos.
| *Simulações feitas com base nas médias de preços citadas pelos entrevistados, em especial pela Carol Stange, e considerando suposições de frequência. Exemplo: R$ 20 por dia (cafezinho + doce) e cerca de 52 semanas no ano. |
O CAFEZINHO É VILÃO DO ORÇAMENTO?
Mas será que apenas uma xícara de expresso é responsável pelo impacto no orçamento? “Nem sempre!”, alerta a planejadora financeira Rejane Tamoto. “Às vezes, ele representa um momento importante na rotina da pessoa. Por isso, o primeiro passo é entender quanto se está gastando em cada grupo de despesas.”
A especialista recomenda usar apps de bancos ou planilhas que categorizam gastos fixos e variáveis — e começar pelos grandes números.
“Gastar R$ 100 por mês com café pode ser irrelevante perto de R$ 500 com o delivery”, compara Rejane. O importante, segundo a planejadora financeira, é encontrar os focos de desperdícios. Ou seja, gastos com produtos e serviços que você pagou e nem usou, como assinaturas ou mensalidades esquecidas.
INVESTIR COM PROPÓSITO E DISCIPLINA
Depois de fazer as contas de forma anualizada e ver o tamanho do impacto de um hábito de consumo prosaico nas suas contas, é hora de pensar em formas de ajustar as finanças e ter uma sobra de caixa para investir.
“Para objetivos de curto a médio prazo, a melhor escolha é a renda fixa”, recomenda Carol Stange. A sugestão da educadora financeira são os CDBs com liquidez diária, o Tesouro Selic ou fundos de renda fixa simples — sempre com rendimento superior ao da poupança.
Se o valor puder ficar parado por 12 meses, dá para buscar CDBs com vencimento nesse prazo e rentabilidade maior, sinaliza a especialista.
"Pega o dinheiro e já investe. Coloca isso como obrigação, como um boleto, como uma conta para pagar"
Carlos Castro, da Planejar
Castro concorda e acrescenta que, com a Selic (taxa básica de juros) em torno de 14,25% ao ano (dados de abril de 2025), títulos como o Tesouro Selic e os CDBs que paguem ao menos 90% do CDI se tornam boas opções com liquidez.
INVESTIR LOGO OU ESPERAR O SALÁRIO CAIR?
“Se deixar para investir só o que sobra, você não vai investir”, alerta Castro. Para o especialista, o ideal é tratar o investimento como uma conta a pagar. “Funciona como um ‘nudge’, ou seja, um empurrãozinho para lidar com nossos próprios vieses comportamentais. Pega o dinheiro e já investe. Coloca isso como obrigação, como um boleto, como uma conta para pagar”, diz Castro.
O especialista explica que não é necessário esperar receber o salário para investir. “Hoje você pode investir em títulos do Tesouro Direto diariamente a partir de R$ 30. Minha dica é: atingiu o valor mínimo, já invista.”
Carol também sugere duas estratégias: investir um valor fixo no início do mês — criando um compromisso com o objetivo — ou, se for mais estimulante, transferir na hora cada economia feita.
“A sensação de recompensa ajuda a manter o hábito. Dê até um nome para essa conta, como ‘Viagem dos Sonhos’ ou ‘Reserva da Liberdade’”, aconselha Carol.
SEGREDO NÃO É SÓ O CAFEZINHO, MAS O PROPÓSITO
Por fim, Rejane reforça: “investir com um objetivo claro ajuda a manter a motivação”. Pode ser uma viagem, um curso, um carro ou simplesmente mais tranquilidade financeira.
Quando o dinheiro tem destino certo, cortar gastos deixa de ser sacrifício e vira estratégia.