Câmbio: dicas para facilitar sua vida na hora de gastar no exterior
Especialistas explicam as diferenças entre os tipos de câmbio, as opções mais vantajosas para comprar moeda de outro país e o que analisar ao usar cartão ou investir em dólar

Viajar para o exterior exige mais do que planejamento com passagens e hospedagem. A forma de levar o dinheiro pode pesar — e muito — no orçamento da viagem. Cartão de crédito, espécie, contas digitais, investimento em dólar? Com tantas opções, é comum ter dúvidas sobre o que é mais vantajoso.
Conversamos com três especialistas para explicar, de forma didática, como funcionam os diferentes tipos de câmbio, as opções disponíveis para quem vai viajar e os erros mais comuns ao lidar com moeda estrangeira: Henrique Soares, planejador financeiro CFP® da Planejar; Acilio Marinello, sócio-fundador da Essentia Consulting; e Marcos Piellusch, professor da FIA Business School.
CÂMBIO COMERCIAL X TURISMO: QUAL SE APLICA À SUA VIAGEM?
O câmbio comercial é utilizado por empresas e instituições públicas em transações como importações, exportações e remessas internacionais.
Já o câmbio turismo é voltado para pessoas físicas e incide sobre compras de moeda em espécie, uso de cartão de crédito no exterior e recarga de cartões pré-pagos. Ou seja, é o que importa para quem vai viajar.
“O câmbio turismo é mais caro porque envolve IOF (Imposto sobre Operações Financeiras), spread, margem de lucro das casas de câmbio e custos operacionais, como segurança e estoque”, explica Piellusch.
O mesmo é reforçado por Marinello, que lembra: “Há um intermediário na operação, como bancos ou agências autorizadas, que naturalmente embutem taxas para cobrir seus custos e obter lucro”.
COMO O SPREAD AFETA O CONSUMIDOR?
As casas de câmbio recompram dólar a um preço (compram e vendem mais caro). A diferença entre esses preços é o spread cambial, margem que cobre custos e lucro.
“Se o dólar compra a R$ 5,00 e vende a R$ 5,50, o spread é R$ 0,50 (10%). Quanto maior o spread, mais caro sai o dólar para o consumidor”, explica Piellusch.
EXISTE UM “MELHOR MOMENTO” PARA A COMPRA?
Não existe um “momento ideal” para comprar dólar ou euro. A dica comum entre os especialistas é comprar aos poucos, para suavizar os efeitos da oscilação cambial — estratégia conhecida como dollar-cost averaging. “Assim, você consegue um preço médio mais equilibrado e evita surpresas às vésperas da viagem”, diz Marinello.
Piellusch complementa que, em meses com menor demanda (fora das férias, por exemplo, como março ou setembro), o spread tende a ser mais baixo. Já nos períodos de férias escolares e festas de fim de ano, a procura por moeda sobe — e o preço acompanha.
Piellusch exemplifica o resultado de uma compra parcelada de dólar no médio prazo:
- Semana 1: compra US$ 300 a R$ 5,00
- Semana 2: compra US$ 300 a R$ 5,10
- Semana 3: compra US$ 300 a R$ 4,95
Preço médio: R$ 5,016
“Essa abordagem também ajuda a planejar melhor o orçamento da viagem e evita surpresas com altas repentinas no câmbio próximo à data de embarque. É especialmente indicada quando se tem prazo flexível até a viagem, permitindo montar uma reserva cambial com mais tranquilidade e menor estresse.”
LEVAR MOEDA LOCAL, DÓLAR OU EURO?
Quando o destino utiliza uma moeda com baixa circulação global (como baht tailandês ou peso filipino), o melhor caminho é levar dólares ou euros e fazer a troca lá fora. Segundo Soares, a cotação no país de destino costuma ser mais vantajosa, e ainda se evita o spread alto cobrado no Brasil.
Marinello concorda e ressalta: “em regiões como a Europa, o euro pode ser mais aceito; já em países da Ásia, América Central ou África, o dólar tende a ser melhor. O importante é evitar moedas exóticas antes da viagem, pois são mais caras e difíceis de negociar por aqui”.
Mas atenção: leve uma quantia já convertida para os primeiros gastos — como transporte, alimentação e emergências. A maior parte pode ser trocada no destino, desde que em casas confiáveis e nunca em aeroportos ou hotéis.
CARTÃO DE CRÉDITO NO EXTERIOR
Usar o cartão de crédito internacional pode ser uma mão na roda, mas é preciso levar uma série de fatores em consideração, como o IOF de 4,38% e o câmbio do fechamento da fatura.
No entanto, para quem tem controle e disciplina, o cartão pode até ser uma boa ferramenta de gestão. “Você pode acompanhar os gastos pelo aplicativo e categorizá-los. Mas é preciso cuidado para não se empolgar e perder o controle”, diz Marinello.
E as milhas? Podem compensar o IOF, desde que usadas com estratégia. “Se a pessoa viaja com frequência e sabe como usar pontos, pode valer a pena. Mas se acumula sem acompanhar promoções, o benefício se perde”, explica Soares.
Vale lembrar que, com as mudanças recentes nas regras do IOF de algumas modalidades financeiras, decididas pelo Ministério da Fazenda (e em discussão no Supremo Tribunal Federal e no Congresso), as instituições financeiras têm oferecido promoções para reduzir o impacto nas contas dos clientes. Entre elas, a devolução parcial ou até integral do IOF, o aumento da pontuação por dólar gasto e condições mais atraentes de cashback.
DECISÃO DEPENDE DO PERFIL
O especialista da Essentia Consulting ressalta que a decisão de usar ou não o cartão de crédito exige uma análise pessoal, especialmente quando o objetivo é acumular milhas.
“Eu, por exemplo, quando viajo para fora do país, costumo usar mais o cartão de crédito. Primeiro, pela segurança de não ter que andar com muito dinheiro em espécie. Segundo, pelo acúmulo de milhas. Já que viajo com frequência, consigo converter esses pontos em benefícios reais, como a emissão de passagens”, explica Marinello.
Para quem tem controle e disciplina, o cartão pode até ser uma boa ferramenta de gestão. É possível acompanhar os gastos pelo aplicativo e categorizá-los. Mas é preciso cuidado para não se empolgar e perder o controle.
E as milhas? Podem compensar o IOF, desde que usadas com estratégia. Se a pessoa viaja com frequência e sabe como usar pontos, explica Soares, pode valer a pena. Mas se acumula sem acompanhar promoções, o benefício se perde.
“Claro que o IOF de 4,38% é caro, mas vale a pena para mim. Agora, existe uma forma mais racional de avaliar isso: se você participa de algum programa de milhas com uma companhia aérea, pode comparar. Gasto R$ 1.000 no cartão, pago o IOF e recebo uma determinada quantidade de milhas. Quanto custou, na prática, cada milha acumulada?”, questiona Marinello.
Se esse custo for parecido com o valor de venda oficial de milhas pela companhia aérea, pode fazer sentido, avalia o sócio-fundador da Essentia Consulting . Caso contrário, talvez seja melhor comprar as milhas diretamente com a empresa, em vez de usar o cartão só para isso. "A decisão exige essa conta — mas, no meu caso, nem chego a calcular. Para mim, já compensa. Vai muito do perfil e dos hábitos de cada viajante”, orienta.
CARTÕES MULTIMOEDA E PRÉ-PAGOS: BOAS ALTERNATIVAS?
Os cartões pré-pagos tradicionais perderam parte da atratividade, segundo Soares, porque o IOF é igual ao do crédito e há taxas de recarga. “A vantagem é travar a cotação no momento da carga, o que dá previsibilidade.”
Já os cartões multimoeda ou contas internacionais oferecem atrativos como câmbio mais próximo ao comercial, IOF reduzido de 1,1% e spread baixo. “São excelentes para quem busca controle e segurança. Muitos permitem operar com várias moedas no mesmo cartão”, diz Marinello.
É o caso do Santander, com a conta Select Global (que oferece a possibilidade de uso em mais de 200 países, cotação do dólar comercial e o IOF reduzido), C6 Global, do C6, Wise e Nomad.
INVESTIR EM DÓLAR ANTES DA VIAGEM: HEDGE OU ARMADILHA?
Comprar dólar por meio de fundos cambiais ou ETFs pode ser uma estratégia de proteção (hedge), mas não é livre de riscos. “Você precisa entender as regras do fundo, as taxas cobradas e o prazo de permanência. Se precisar resgatar em um momento de baixa, pode sair no prejuízo”, alerta Marinello.
O professor da FIA Business School concorda e ressalta que a estratégia só faz sentido com prazo curto e perfil mais tolerante ao risco. “É possível perder dinheiro mesmo tentando se proteger.”
Piellusch dá um exemplo prático. Imagine que, faltando 6 meses para uma viagem aos EUA, um investidor decide aplicar R$ 10 mil em um fundo cambial atrelado ao dólar, com taxa de administração de 1% ao ano.
- Na data da aplicação, o dólar está a R$ 5,10.
- Três meses depois, o dólar cai para R$ 4,80 (queda de quase 6%).
- Para fazer frente aos gastos, o investidor é forçado a resgatar o fundo e converter os reais em moeda para levar na viagem.
Neste cenário:
- O valor investido sofreu desvalorização cambial.
- O resgate no fundo ainda sofre incidência de IR (regressivo, mínimo de 15%) e taxa de administração.
- No fim, ele perdeu poder de compra, mesmo tentando se proteger.
“Ou seja, a tentativa de hedge virou uma aposta ruim, o que mostra que essa estratégia não garante retorno e deve ser usada com cuidado, especialmente por quem tem perfil conservador ou data fixa de viagem”, conclui Piellusch.
COMO SE PREPARAR PARA OS GASTOS?
Os três especialistas são unânimes: diversifique. A estratégia mais segura inclui:
- Espécie (20% a 30% do valor da viagem), para pequenos gastos e emergências;
- Cartão multimoeda ou conta internacional, como principal forma de pagamento;
- Cartão de crédito, como reserva para imprevistos ou gastos planejados com milhas ou seguros.
“Essa combinação oferece segurança, previsibilidade e flexibilidade”, diz Soares.
OS ERROS MAIS COMUNS E COMO EVITÁ-LOS
- Comprar moeda em cima da hora, tentando adivinhar o câmbio mais barato;
- Levar todo o valor em espécie (risco de roubo ou perda);
- Trocar moeda em aeroportos, hotéis ou com pessoas físicas;
- Pagar direto em dólar ou euro em lojas de países que aceitam outras moedas, sem fazer a conversão;
- Deixar de declarar valores acima de US$ 10 mil, o que pode gerar problemas com a Receita.
“Ao se planejar com antecedência e buscar instituições confiáveis, o risco é muito menor — tanto aqui quanto no exterior”, finaliza Marinello.
VANTAGENS E DESVANTAGENS
Espécie (dinheiro vivo)
Vantagens:
- Ideal para pequenas despesas imediatas (transporte, alimentação, gorjetas).
- Alta aceitação, mesmo em locais sem rede bancária.
Desvantagens: - Risco de perda ou roubo.
- IOF mais alto (1,1%) e câmbio turismo, geralmente com spread elevado.
Recomendação: leve entre 20% e 30% do valor total previsto em espécie.
Cartão de crédito internacional
Vantagens:
- Prático, seguro e amplamente aceito.
- Pode acumular milhas e oferecer benefícios (seguros, cashback).
Desvantagens: - IOF de 4,38%, câmbio do dia do fechamento da fatura e spread elevado.
- Risco de compras em locais não confiáveis, sujeito a fraudes.
Recomendação: use com moderação e em estabelecimentos confiáveis. Bom como reserva para emergências ou compras planejadas.
Cartão multimoeda ou conta internacional
Vantagens:
- Câmbio próximo ao comercial, com spread baixo (0,5% a 2%).
- IOF de 1,1% (para recarga em moeda estrangeira).
- Permite travar a cotação no momento da carga, trazendo previsibilidade.
Desvantagens:
- Nem todos os cartões são aceitos em determinados países ou estabelecimentos menores.
Recomendação: excelente opção para quem busca controle de gastos e quer fugir do cartão de crédito tradicional. Ideal para carregar a maior parte do valor da viagem.
Fonte: Marcos Piellusch, professor da FIA Business School