Crédito privado em alta: como investir sem cair em armadilhas
Mesmo com retornos atrativos e juros elevados, especialistas alertam: o crédito privado exige análise criteriosa, diversificação e gestão profissional para evitar perdas, especialmente após recentes crises corporativas

O mercado de crédito privado recebeu um sinal de alerta após casos recentes envolvendo empresas como Braskem e Ambipar. A modalidade, que vem ganhando espaço entre investidores em busca de retornos acima do CDI, exige análise criteriosa e gestão de risco.
Especialistas ouvidos pela FastCo Money explicam como funciona esse tipo de investimento, os principais riscos e o que avaliar antes de aumentar a exposição.
COMO FUNCIONA O CRÉDITO PRIVADO?
Investir em crédito privado é emprestar dinheiro a empresas, seja por meio de debêntures, CRIs, CRAs ou cotas de fundos de crédito, explica Fábio Murad, CEO da Spacemoney Investimentos. “Você se torna um credor, não um sócio, e espera ser remunerado com juros. Mas o risco de inadimplência é sempre presente, especialmente em momentos de crise ou choques setoriais”, afirma.
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Na mesma linha, Otavio Telles, especialista em renda fixa da Barsi Investimentos, reforça que esse mercado envolve títulos prefixados, atrelados ao CDI (Certificado de Depósito Interbancário) ou ao IPCA (inflação oficial do Brasil), e pode ser uma boa alternativa dentro da renda fixa, desde que o investidor compreenda os riscos envolvidos.
PRINCIPAIS OPÇÕES DE CRÉDITO PRIVADO NO MERCADO
O crédito privado oferece diversas alternativas de investimento. São elas:
- Títulos corporativos como debêntures, CRIs e CRAs;
- Instrumentos bancários como CDBs, LFs, LCIs, LCAs e LIGs;
- Fundos de fundos de crédito e multimercados; e
- Planos de previdência que tenham exposição a crédito corporativo.
Cada modalidade tem suas particularidades de prazo, liquidez e risco.
RISCOS E SINAIS DE ALERTA PARA O INVESTIDOR
Telles observa que muitos investidores são atraídos por taxas elevadas sem avaliar a saúde financeira e a governança das empresas, fatores que podem rapidamente afetar a capacidade de pagamento.
Já Murad orienta atenção a carteiras muito concentradas em poucos emissores ou setores e papéis de baixo rating. “Verifique sempre a lâmina do fundo e os relatórios mensais. Rentabilidades muito acima da média podem esconder riscos elevados.”
Lâmina do fundo é o documento oficial que resume de forma concisa as informações essenciais de um fundo de investimento. Por exemplo, com dados como objetivos, política de investimento, taxas, riscos e histórico de rentabilidade
Entre os principais riscos nessa classe de ativo, segundo Telles, estão:
- Risco de liquidez, ou seja, não conseguir se desfazer do papel antes do prazo determinado, muito parecido com o mercado de ações;
- Risco de crédito, da empresa não conseguir arcar com os compromissos de dívida (inadimplência);
- Risco de marcação à mercado, como todo papel de renda fixa, é sensível à taxa de juros, o que traz volatilidade extra ao papel, tanto para cima quanto para baixo, vale ressaltar que, a marcação a mercado só se faz efetiva em caso de resgate antecipado do papel, caso o investidor escolha segurá-lo até o vencimento, receberá a taxa fixa contratada, a renda é fixa, o preço não.
POR QUE GESTÃO PROFISSIONAL FAZ A DIFERENÇA
Para Caio Crepaldi, head de fundos de crédito privado do ASA, os episódios recentes reforçam o papel central de uma gestão profissional e da análise de risco.
“Avaliar a capacidade de pagamento de uma empresa vai muito além do rating. É preciso olhar para o setor, estrutura de capital, geração de caixa e governança”, afirma.
Segundo Crepaldi, um gestor qualificado integra essas variáveis na diversificação de emissores, setores e prazos, o que ajuda a transformar um cenário incerto em oportunidades equilibradas de retorno.
COMO A SELIC ALTA AFETA O CRÉDITO PRIVADO
O atual patamar elevado da Selic (taxa básica de juros), que está em 15% ao ano, aumenta o custo de capital das empresas, pressionando sua capacidade de pagamento. Porém, torna os retornos mais atrativos para quem investe, observa Crepaldi.
Murad diz que, para o investidor, o retorno nominal é mais alto, tornando o crédito privado mais atrativo. Para a empresa, o custo de captação aumenta, o que pressiona ainda mais a PJ já endividada, elevando o risco de inadimplência.
Telles complementa que, em contrapartida, as companhias precisam oferecer taxas maiores para captar recursos, o que eleva o prêmio ao investidor, mas também o risco de inadimplência entre empresas mais endividadas.
O QUE ESPERAR COM A QUEDA DE JUROS EM 2026
Com os cortes graduais esperados para 2026, o cenário tende a favorecer novas emissões e até valorização de papéis antigos.
“Mesmo com juros menores, as taxas reais devem continuar elevadas em termos históricos. Isso pode beneficiar quem carrega títulos no médio e longo prazo”, avalia Crepaldi.
Para Murad, o ciclo de flexibilização pode gerar valorização de papéis antigos com taxas mais altas, além de estimular emissões prefixadas.
COMO INVESTIR COM SEGURANÇA EM CRÉDITO PRIVADO
Para investidores pessoa física, a decisão de manter ou ampliar a exposição depende do perfil e horizonte de investimento. “Crédito privado continua fazendo sentido em uma carteira diversificada, com gestão ativa e foco na transparência”, diz Crepaldi.
Murad defende que investidores mais arrojados podem buscar oportunidades seletivas, desde que com garantias reais e spreads atrativos. Nesse contexto, ele destaca os ETFs de crédito privado, como DEBI11 e MARG11, que oferecem liquidez diária, menor custo e diversificação automática.
Leia mais: Dinheiro demais: bênção, fardo ou risco moral?: Crédito privado em alta: como investir sem cair em armadilhasNa visão de Telles, o essencial é priorizar empresas sólidas, com baixo endividamento e fundamentos saudáveis, observando métricas como dívida líquida/EBITDA e histórico de governança. “A diversificação e a análise criteriosa são o que diferenciam risco de oportunidade”, conclui.
Murad pontua os principais aspectos a serem observados:
- Alta concentração em poucos emissores;
- Baixa diversificação setorial;
- Peso elevado em papéis com rating baixo ou sem rating;
- Distorção no histórico de volatilidade ou retorno;
- Histórico de eventos de crédito; e
- Verifique sempre a lâmina do fundo, a composição da carteira e os relatórios mensais.