De picanha da Gaga a balada, diva pop dá o ritmo dos negócios
Com criatividade, empreendedores de diferentes segmentos e tamanhos aproveitam a onda em torno do mega-show de Lady Gaga em Copacabana para faturar

Mesmo que o orçamento esteja apertado, o fã sempre dá um jeito de ter uma lembrança física do ídolo. Pode ser uma camiseta, um cartaz, um boné. Não importa o tamanho, mas sim o significado por trás do souvenir que será levado para casa.
Agora, imagine o apetite dos fãs de Lady Gaga depois de esperarem por tanto tempo a sua apresentação no Brasil - a última vez foi em 2012, com a turnê "Born This Way Ball”.
No Rio de Janeiro, empreendedores do setor de comércio e de serviços estão mobilizados nos últimos meses para aproveitar a multidão esperada na Praia de Copacabana, no sábado, dia 3. De comidas temáticas a festas lotadas, a “invasão gagaísta” já movimenta a economia criativa local. E ainda tem potencial para deixar um legado duradouro para os negócios da região.
"Mesmo sendo gratuito, um evento assim ativa toda a cadeia de valor da cidade”, explica Karine Karam, professora da
ESPM e especialista em comportamento do consumidor. Segundo ela, setores como alimentação, hospedagem, transporte e moda são os mais beneficiados com esse tipo de mobilização cultural.
PICANHA DA GAGA
Criativos, os comerciantes trabalham sem olhar para o relógio com o objetivo de incrementar o faturamento com a ajuda da diva pop. É o caso de uma loja de moda pop, no centro do Rio, que virou destino para quem quer estar no clima da Mother Monster.
A Lix ocupa um pequeno ponto comercial na Rua Senhor dos Passos e oferece produtos para diferentes perfis de fãs. Até a apresentadora Ana Maria Braga exibiu os acessórios nesta semana. Tem de ecobags e copos, mais básicos, ao sucesso dos grande leques e da picanha da Gaga. É isso mesmo. Trata-se de uma versão de de camiseta com estampa de carne crua.
A picanha da Gaga, como a camiseta vem sendo anunciada pela loja, faz referência ao vestido de carne usado pela cantora no MTV Video Music Awards de 2010. O figurino foi criado pelo estilista Franco Fernandez, que usou cerca de 11 quilos de carne na confecção.
Tratava-se de um protesto da artista contra a política militar dos EUA (conhecida como 'Don't Ask, Don't Tell"), que proibia militares gays de assumirem sua orientação sexual nas Forças Armadas. Depois de 15 anos, a roupa transgressora ainda é lembrada.
BONÉ PARA OS MENOS OUSADOS
Enquanto Gaga não sobe no imenso palco montado em frente ao Copacabana Palace, em uma rua estreita do Rio, clientes da Lix tentam se organizar em fila para fazer as compras. Os copos estão entre as opções mais em conta, na faixa de R$ 18,90. Há ainda várias estampas nas camisetas, que custam a partir de R$ 49,90 (regata), chegando a R$ 180 (modelo telephone). O leque Abracadabra, entre os mais buscados, sai por R$ 59,90. Já a canga, para quem quiser aproveitar uma praia, é vendida por R$ 129,90.
Os fãs mais discretos podem levar para casa um boné Gaga por R$ 49,90. Os representantes da Lix foram procurados pela Fast Company Brasil, mas a agenda corrida do período pré-show dificultou a disponibilidade de agenda.
“Esse tipo de produto tem apelo emocional. Ele conecta o fã com a estética do momento e transforma o afeto em consumo”, aponta Karine Karam. Para ela, negócios que leem bem os códigos culturais de uma base de fãs se destacam em eventos desse tipo.
GAGA E MADONNA
No Caju Gastrobar, em Copacabana, a aposta para pegar carona na presença de Lady Gaga em território carioca é a experiência gastronômica. Participando do concurso Comida di Buteco, o restaurante lançou um prato que mistura tradição mineira com um toque atual: mini medalhões de mignon suíno com bacon, molho agridoce de goiabada apimentada e pão de queijo frito recheado de meia cura. Custa R$ 35 e serve até duas pessoas.
“Durante o show da Madonna, no ano passado, bares e restaurantes da região tiveram um aumento médio de 30% no faturamento. Este ano, esperamos crescer mais 10% em cima disso”, revela Daniel Gama. O empreendedor é proprietário do Gastrobar e presidente do Polo Copacabana, que representa os estabelecimentos da área.
Além dos pratos especiais, alguns estabelecimentos da região vão investir em DJs, decoração temática e promoções exclusivas durante o final de semana do show de Lady Gaga.
AFTER COM GLITTER E SHOW DE DRAGS
A alguns metros da areia, a casa noturna Pink Flamingo já se prepara para receber o público que vai estender a noite após o show. A boate, conhecida por suas festas LGBTQIA+ e pelo clima carnavalesco o ano inteiro, terá uma programação especial com duas drags que participaram do reality RuPaul’s Drag Race, além das performers fixas.
“Nós já temos tradição em grandes eventos como Carnaval e Réveillon. Para o show da Gaga, reorganizamos as escalas, contratamos prestadores de serviço para festas extras e vamos operar em ritmo total”, diz Thiago Araujo, sócio da Pink Flamingo. A expectativa? Casa cheia todos os dias e aumento de até 50% no público semanal.
BRILHO PARA O NEGÓCIO LOCAL
As vendas atreladas ao mega-show de Lady Gaga não estão limitadas a produtos físicos ou baladas. Com a loja virtual Furo Certo, especializada em brincos e acessórios, Larissa Aragão apostou em coleções especiais. Ela apostou no aumento da produção para atender a demanda que antecede o show.
“Foco minha produção em megaeventos como Rock in Rio, Carnaval e grandes shows como da Taylor Swift, Sandy & Júnior. No Carnaval, criei o brinco do Oscar e vendi 100 unidades. Espero vender pelo menos a metade disso no show da Lady Gaga”, conta a empreendedora.
A expectativa de faturar com o show da artista pop na Praia de Copacabana é ampla e vai além das fronteiras cariocas. Segundo Léo Morel, analista, pesquisador do mercado musical e professor da Fundação Getulio Vargas (FGV), eventos culturais de grande porte promovem impacto em cadeia. “Além do turismo e da alimentação, negócios de moda, beleza, transporte e até segurança privada são ativados. Há um efeito multiplicador claro, com impactos econômicos, sociais e culturais”, afirma.
Karine concorda com Morel e ressalta que o efeito multiplicador acontece quando o dinheiro gasto por turistas e fãs circula por diferentes camadas da economia local. “Um visitante que compra uma camisa da Lady Gaga de um vendedor ambulante também pode almoçar em um restaurante familiar, pegar um táxi, se hospedar em uma pousada local e consumir outros serviços. Esse encadeamento gera renda em diversos níveis, promovendo redistribuição econômica.”
Morel acrescenta que o setor de turismo é significativamente impactado pela taxa de ocupação em hotéis e pela oferta da rede Airbnb. O comércio local, incluindo alimentação, vestuário e entretenimento, colhe os frutos do aumento no fluxo de visitantes, explica.
Além disso, esses eventos geram novas oportunidades de emprego em áreas como segurança, transporte e produção de eventos, proporcionando também um aumento na arrecadação de impostos que pode ser reinvestido em serviços públicos, analisa o pesquisador e professor. Por fim, iniciativas desse tipo contribuem para a promoção da cidade como um destino turístico e cultural atraente.”
LIÇÕES ALÉM DO PALCO DE LADY GAGA
Mais do que apenas “surfar a onda” do show, os empreendedores que se destacam nesses momentos são os que têm visão estratégica. “O show deixa um legado: visibilidade, novos clientes, parcerias e aprendizado em gestão de picos de demanda. Hoje, com redes sociais e acesso a crédito, os pequenos estão mais preparados do que há dez anos”, conclui Karine.
Com a confirmação de megashows gratuitos até 2028, segundo a Prefeitura do Rio, os negócios locais já estão atentos. Porque quando Lady Gaga pisa na praia, o palco não é só dela — é também da criatividade empreendedora brasileira.
EFEITO MULTIPLICADOR
Os eventos de massa geram um efeito quase imediato na economia, segundo Karine. Entre eles: aumento no volume de clientes, na visibilidade e na receita. “Muitos pequenos empreendedores se adaptam rapidamente, lançando produtos temáticos, expandindo a equipe temporariamente ou ajustando o horário de funcionamento. Além disso, esses eventos funcionam como vitrines que podem gerar novos clientes recorrentes, mesmo após o término do show.”
A estimativa do estudo "Potenciais Impactos Econômicos do Show da Lady Gaga no Rio - 2025", da Secretaria Municipal de Desenvolvimento Econômico (SMDE) e da Empresa de Turismo do Município do Rio de Janeiro (Riotur) é que o show de Lady Gaga movimente a economia da cidade em cerca de R$ 592 milhões. A apresentação da Mother Monster deve superar em 27,5% o impacto na economia do Rio deixado em 2024 por Madonna, quando o valor projetado foi de R$ 469,4 milhões.
A estimativa, aponta o estudo da SMDE, é de um público de 1,6 milhão de pessoas em diferentes trechos da Praia de Copacabana durante a apresentação. Os cálculos apontam para cerca de 1,36 milhão de cariocas e moradores da Região Metropolitana do Rio e 240 mil turistas - 80% estrangeiros e 20% nacionais.
A média de gasto diário do turista estrangeiro na cidade do Rio é de R$ 590,40. Já para o brasileiro, o cálculo do estudo é de R$ 515,84 por dia. Para os cariocas e os moradores da Região Metropolitana do Rio de Janeiro, o tíquete médio é de R$ 133,60. O estudo levou em conta o tempo de permanência dos turistas na cidade - quatro dias para os estrangeiros e três para os nacionais.