Governo Trump derruba proposta de controle de amianto em cosméticos
Regra apresentada no governo Biden previa que fabricantes comprovassem a ausência da substância; atual gestão diz que quer revisar a forma de fiscalização e proteção ao consumidor quanto a um produto comprovadamente cancerígeno

Em mais um sinal de que o governo do presidente americano Donald Trump não está tão preocupado com o amianto, a a agência de regulação Food and Drug Administration (a FDA, que tem semelhança com a atuação da Anvisa no Brasil) retirou esta semana uma proposta de regulamentação que exigiria testes para detectar a presença do amianto tóxico em cosméticos à base de talco.
A regulamentação, proposta pelo governo Biden há menos de um ano, exigiria que os fabricantes testassem os cosméticos para detectar amianto e mantivessem registros que comprovassem a conformidade. A exposição ao amianto tem sido associada a câncer de pulmão, mesotelioma, câncer de ovário e câncer de laringe, razão pela qual diversas agências de saúde determinaram que não existe um nível "seguro" de exposição a esse mineral natural.
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A Organização Mundial de Saúde (OMS) atesta que o amianto é cancerígeno. O mineral já foi banido em dezenas de 67 países. Entre eles, o Brasil. No entanto, apesar da proibição, o país é o terceiro maior exportador graças à única mina em atividade no continente americano, mais especificamente em Minaçu, no norte de Goiás.
A Johnson & Johnson tem sido alvo de inúmeros processos judiciais relacionados a relatos de que a empresa tinha conhecimento do risco de talco de amianto em seu talco para bebês.
O talco de amianto está presente em muitos cosméticos porque pode ser usado para absorver umidade, evitar a formação de grumos e conferir uma sensação sedosa a esses produtos, de acordo com informações no site da FDA.
Mas, nos EUA, a atual administração parece ter cedido parcialmente às “questões altamente científicas e técnicas abordadas” nos 49 comentários recebidos durante o período obrigatório de consulta pública, de acordo com um aviso legal publicado no registro federal e assinado pelo Secretário de Saúde e Serviços Humanos, Robert F. Kennedy Jr.
Informa o texto do órgão oficial, de forma muito técnica e pouco clara. “Há bons motivos para retirar a regra proposta neste momento”, afirmou a ordem. “Estamos retirando a regra proposta para reconsiderar a melhor maneira de abordar as questões abrangidas pela regra proposta e os princípios mais amplos para reduzir a exposição ao amianto, e para garantir que quaisquer requisitos de método de teste padronizado para detectar amianto em produtos cosméticos que contenham talco ajudem a proteger os usuários de produtos cosméticos que contenham talco da exposição prejudicial ao amianto.”
A FDA não respondeu imediatamente a um pedido de comentário da Fast Company.
REVOGAÇÃO DAS PROIBIÇÕES DE BIDEN
Revogar a proposta de regulamentação não significa necessariamente que os fabricantes começarão repentinamente a adicionar amianto aos cosméticos, mas sim que uma medida de proteção para garantir a ausência dessa toxina mortal nesses produtos está sendo reconsiderada. A FDA planeja publicar uma proposta de regulamentação relacionada à Lei de Modernização da Regulamentação de Cosméticos de 2022.
Um porta-voz da agência confirmou isso ao The New York Times, afirmando que a FDA apresentará uma nova proposta de regulamentação “que oferece uma abordagem mais abrangente para reduzir a exposição ao amianto e as doenças relacionadas a ele, incluindo a identificação de aditivos mais seguros como alternativas, especialmente quando forem menos dispendiosos”.
Mas ambas as administrações Trump demonstraram certa disposição em flexibilizar as proteções contra esse carcinógeno mortal, permitindo que o amianto retorne ao mercado. Em contrapartida, a administração Biden finalizou a proibição do uso contínuo do amianto crisotila em 2024 e também propôs a regulamentação mencionada anteriormente para a detecção e identificação de amianto em cosméticos.
O atual governo Trump criticou duramente ambas as iniciativas para proibir o amianto. Em junho, a Agência de Proteção Ambiental (EPA) planejava retirar uma proposta de proibição do amianto crisotila, mas voltou atrás menos de um mês depois.
INDIGNAÇÃO COM A REVOGAÇÃO
Os EUA continuam em desacordo com grande parte do resto do mundo, onde o amianto é completamente proibido em mais de 50 países. Notavelmente, o amianto não é proibido na China, onde muitos cosméticos são fabricados.
Essa última medida da FDA é desconcertante e preocupante para alguns defensores dos direitos do consumidor.
"Nada poderia tornar os Estados Unidos menos saudáveis do que ter um produto cancerígeno em cosméticos", disse Scott Faber, vice-presidente de assuntos governamentais do Environmental Working Group, ao jornal britânico The Guardian. A organização sem fins lucrativos tem pressionado por regulamentações mais rigorosas em relação ao talco. "É difícil entender por que revogaríamos uma regra que simplesmente exige que as empresas façam testes para detectar amianto."
E isso representa “mais um retrocesso horrível” que deveria indignar os consumidores, disse Linda Reinstein, presidente e diretora executiva da Organização de Conscientização sobre Doenças Causadas pelo Amianto, ao jornal The New York Times.
“Isso coloca sobre os americanos a responsabilidade de tentar identificar produtos de consumo que possam estar contaminados, e a pessoa comum não consegue fazer isso porque não é possível saber sem testes”, afirmou.