Incertezas na economia levam IPOs para a fila de espera
Nos EUA, a volatilidade do mercado de ações, os riscos com a guerra comercial e o crescente temor de recessão congelaram a oferta inicial de ações e abalaram o capital de risco

Chamar as últimas semanas em Wall Street de caóticas pode ser subestimar a situação. Houve quedas de mais de 2.000 pontos no Índice Dow Jones e, em seguida, ganhos ainda maiores - com grande oscilações.
Essa volatilidade levou mais de uma dúzia de empresas a arquivar seus planos de IPO nos Estados Unidos, incluindo algumas das estreias mais aguardadas do ano.
IPO, sigla para Initial Public Offer, é o nome que se dá à operação de uma empresa na sua primeira oferta pública de ações.
A StubHub e a Klarna, que já protocolaram seus prospectos na Securities and Exchange Commission (a SEC, o órgão regulador do mercado de capitais à semelhança da CVM americana), adiaram seus planos. A fintech Chime, que supostamente estava prestes a revelar seu registro na SEC, mudou de ideia no último minuto na semana passada.
TUDO PARADO
Fusões e aquisições? As coisas não estão muito melhores nesse departamento. O primeiro trimestre deste ano teve menos de 80 anúncios de fusões e aquisições nos Estados Unidos — o menor total trimestral desde o segundo trimestre de 2020 — e os sinais de melhoria para o segundo trimestre desapareceram do horizonte por enquanto.
Mas não são apenas as tarifas anunciadas pelo presidente americano Donald Trump — ou a resposta global a elas — que estão assustando os mercados. O verdadeiro problema é a completa falta de previsibilidade sobre o que acontecerá em seguida.
Qual será o impacto da tarifa recíproca dos EUA — a maior parte da qual Trump suspendeu na recentemente por 90 dias — para os países afetados? A interrupção será temporária ou Trump a manterá pelo resto do seu mandato? Como tudo isso afetará as cadeias de suprimentos globais?
Infelizmente, não há respostas definitivas para nenhuma dessas perguntas.
O ENIGMA DO CAPITAL DE RISCO
Isso não está apenas deixando a situação confusa para consumidores, economistas e empresários. Também está deixando os donos de startups preocupados com suas chances de encontrar financiamento de capital de risco.
Isso é compreensível, mas vale lembrar que a desordem em torno das tarifas e do mercado dura apenas pouco mais de uma semana — e isso não é tempo suficiente para ter qualquer impacto real no mercado de financiamento.
Ainda assim, as empresas de capital de risco que apoiam empresas que se aproximam de um IPO ou de uma saída são as mais propensas a sentir a pressão, dizem os investidores.
“Os investidores estão tentando descobrir ‘como isso vai se desenrolar?’”, diz Matt Murphy, sócio da Menlo Ventures. “Acho que isso tem um impacto maior para o mercado em estágio avançado em comparação com o inicial. Suas avaliações são mais altas e você está apostando no P&L (demonstrativo financeiro que traz as receitas, custos e despesas em um determinado intervalo de tempo) e nas finanças da empresa; enquanto no início, você está apostando no produto, na equipe e no mercado.”
“Não é o impacto direto das tarifas [para eles], é o indireto”
Matt Murphy, sócio da Menlo Ventures
Muitas das empresas do portfólio da Menlo são digitais — o que significa que as tarifas, como estão estruturadas atualmente, não as afetarão diretamente, já que não vendem produtos físicos. A maior preocupação é se os clientes em potencial acumularão dinheiro e adiarão ou deixarão de comprar novos softwares.
“Não é o impacto direto das tarifas [para eles], é o indireto”, diz Murphy.
CHANCE DE UM FUTURO RECESSIVO
E pairando sobre tudo isso, é claro, está a ameaça de uma recessão.
O economista da Moody's, Mark Zandi, ainda estima a probabilidade de uma recessão este ano em 60%, mesmo com a suspensão tarifária de 90 dias de Trump. Usuários do mercado de previsões Kalshi estimam a probabilidade ainda mais alta, em 70% — acima dos apenas 40% de uma semana atrás. O JPMorgan afirma que o Índice Russell 2000 agora precifica uma chance de 79% de uma recessão econômica.
Uma recessão não afetaria apenas os consumidores, mas também potencialmente prejudicaria os investimentos, novamente porque as companhias teriam mais dificuldade em vender seus produtos. No entanto, não seria devastador para as empresas de financiamento, diz Murphy.
"No final das contas, encontraremos um novo equilíbrio em torno dessas tarifas", diz ele. "O capital de risco encontrará seu equilíbrio normal, e o valor e o impacto da tecnologia superarão [uma possível] recessão."
E O BRASIL?
No ano passado, segundo pesquisa EY Global IPO Trends 2024, houve uma queda em quantidade de ofertas - 1.215, contra 1.351 em 2023. No entanto, em valores, 2024 foi superior a 2023 - US$ 126,1 bilhões, ante a US$ 121,2 bilhões no ano anterior. Os indianos ficaram com o primeiro lugar, passando os EUA.
Enquanto isso, no Brasil, os IPOs não dão sinal de reação . Relatório do Centro de Estudos do Financiamento das Empresas Brasileiras da Fipe (Cefeb-Fipe), chama a atenção para o fato que, apesar das empresas listadas em bolsa poderem recorrer a aumentos de capital por meio da emissão de ações para reduzir o endividamento, o atual nível de valorização das companhias na B3 tem estado muito abaixo da média histórica. A situação resulta no elevado custo de capital próprio nessas operações.
Esse fator tem inibido emissões primárias e especialmente IPOs nos últimos anos e tem motivado inclusive considerável aumento das operações de recompra de ações por parte das empresas que dispõem de situação confortável de disponibilidades, descreve o relatório do Cefeb-Fipe, divulgado em março passado.
FOLLOW-ON EM ALTA
Se os IPOs não acontecem, as companhias que precisam se capitalizar recorrem a outros instrumentos. A Caixa Seguridade foi a primeira a fazer ofertas de ações na B3 neste ano. A bolsa paulista não registrava movimentação do tipo desde outubro de 2024
O follow-on da Caixa Seguridade levantou R$ 1,2 bilhão. Neste tipo de operação, é feita uma oferta subsequente de ações de uma empresa já listada na bolsa.
Segundo o site da B3, apenas em março de 2025, além da Caixa Seguridade, foram feitos follow-on da Vulcabras, Priner, Pão de Açúcar, Serena, Boa Safra, Companhia de Transmissão de Energia Elétrica Paulista, Sabesp e Eneva. (Com FAST COMPANY BRASIL)