Entenda o porquê da relação humana, e não a IA, ser o diferencial das empresas
Em meio à adoção acelerada da tecnologia, quem mantêm o contato entre pessoas como prioridade têm mais chances de fidelizar clientes e se destacar

No mundo corporativo atual, a inteligência artificial (IA) ganha cada vez mais espaço como aliada na busca por eficiência e agilidade. Automatizar tarefas repetitivas, acelerar respostas e organizar dados são avanços que já fazem parte da rotina de muitas empresas. Mas até onde vai a tecnologia e onde entra a importância do contato humano?
"A IA veio para otimizar o que é repetitivo e dar velocidade ao que antes tomava horas. Mas o que diferencia é a pessoa por trás do processo", diz Thamiris Abdala, CEO da Holding SM. Tecnologia e empatia devem caminhar juntas, avalia. "Deixe os relatórios por conta da tecnologia, mas esteja presente nas conversas."
ATENDIMENTO AUTOMATIZADO NÃO RESOLVE TUDO
É comum encontrar empresas que tentam transferir toda a jornada do cliente para canais automatizados. "O chatbot pode recuperar uma venda, entender por que não finalizei uma compra", diz Luana Carvalho, diretora de comunicação da ABRH-SP e completa: "Se a dúvida é mais complexa, precisa ter uma pessoa na ponta. A IA pode fazer o primeiro contato, mas não substitui a escuta ativa e a empatia humana”.
Thiago Mano, CPO e diretor de Inovação da Accountfy, reforça que a IA deve liberar tempo para que as pessoas atuem em atividades mais críticas. "Decisões ambíguas e complexas exigem julgamento técnico, estratégico e ético, algo que só o humano consegue oferecer com profundidade".
RELACIONAMENTOS SUSTENTAM RESULTADOS
Buscar eficiência a qualquer custo pode trazer resultados imediatos, mas pode comprometer o valor das relações no longo prazo. "Empresas obcecadas por métricas esquecem que quem sustenta os resultados são as pessoas, os clientes, os times", afirma a CEO da Holding SM.
A executiva cita um caso próprio. A ameaça de rompimento de contrato por um cliente foi contornada por meio de uma ligação direta, escuta ativa e foco na solução. "Ele não só ficou, como aumentou o contrato meses depois. Sentiu-se tratado como prioridade e não como um número", diz.
O diretor de Inovação da Accountfy lembra outro exemplo. Uma pequena fabricante italiana evitou uma batalha judicial com um cliente graças a uma mediação conduzida por um juiz aposentado, que usou empatia e escuta para construir um acordo viável. "Nenhuma IA teria captado as nuances humanas envolvidas naquele conflito".
A IA pode agilizar o primeiro contato, mas o fechamento precisa de presença, escuta e adaptação, analisa Thamiris. “Use a IA para mapear comportamentos. Mas que a resposta final seja no face a face, que venha com empatia, com repertório e com alguém que resolve, não apenas responde”.
SITUAÇÕES EM QUE A PRESENÇA HUMANA É INSUBSTITUÍVEL
O executivo da Accountfy enfatiza que há tomada de decisões complexas e ambíguas que somente um profissional pode atuar. “Imagine um CFO avaliando uma fusão que envolve aspectos culturais sensíveis, questões jurídicas complexas ou múltiplas variáveis de contexto. A IA pode auxiliar sugerindo caminhos e simulando cenários. Porém, o julgamento final, consciente e ético, sempre dependerá do fator humano.
Em momentos de crise, cancelamento de contrato, mudança de escopo ou erro operacional, a escuta humana é o que desarma tensões, frisa Thamiris. “Difícil hoje em dia ainda encontrar um chatbot resolve um problema com empatia. Outro exemplo é em reuniões estratégicas. É ali que a confiança é construída.”
CULTURA DE HUMANIZAÇÃO VEM DA LIDERANÇA
Para manter o "calor humano" no centro da estratégia, o papel da liderança é essencial. "Humanização começa na liderança. O discurso e a prática precisam estar alinhados", afirma Thamiris. "Use tecnologia para ganhar tempo e use esse tempo para ouvir mais, reconhecer mais".
Luana reforça que, em muitas empresas, as decisões sobre IA estão nas mãos de quem não domina a experiência do cliente. "Às vezes, é o TI que cria as soluções sem ouvir o comercial. Isso afasta o foco do relacionamento e da resolutividade real".
TREINAR PARA A NOVA CONVIVÊNCIA
No RH, o desafio é capacitar os times para conviver e aproveitar o potencial da IA. "As empresas falam de ChatGPT, mas falta formação aplicada. Poucos cursos abordam a IA do ponto de vista da prática", diz Luana.
A diretora de comunicação da ABRH-SP defende um "retreinamento" dos profissionais, focado em entender como a IA pode de fato ser útil e em que tipo de situação é preciso manter o contato humano.
PEQUENAS EMPRESAS: A EMPATIA COMO VANTAGEM COMPETITIVA
Para pequenas empresas, a humanização pode ser o principal diferencial. "Quem não tem orçamento milionário em tecnologia, tem o olho no olho como vantagem competitiva", diz Thamiris. Adaptar-se rápido, criar soluções sob medida e ouvir o cliente: isso tudo é feito por gente.
O diretor de Inovação da Accountfy concorda. "Pequenas empresas são ágeis, adaptam-se com rapidez e criam entregas personalizadas. A IA ajuda com dados, mas é a empatia que gera valor duradouro".
RELAÇÕES HUMANAS E IA NOS PRÓXIMOS 5 ANOS
Para Thamiris, a IA vai escancarar o que só o humano pode fazer: construir confiança, exercer empatia, criar cultura. “No futuro, o diferencial não será quem sabe usar IA, mas quem sabe usar o tempo que a IA libera para liderar, inspirar e transformar. Vamos ser cobrados por nossa humanidade não só por nossa produtividade.”
Prever o futuro da IA é um exercício complexo e, dada a velocidade com que avança, podemos facilmente errar, pontua o CPO da Accountfy. “A IA continuará ampliando seu espaço, especialmente em processos repetitivos e operacionais.
Contudo, diz o executivo, o diferencial humano residirá no que a tecnologia ainda não entrega: empatia, julgamento estratégico e ética. Quanto mais tecnológica uma empresa se tornar, mais humana precisará ser para manter a relevância. Porém, tudo isso ainda é muito novo e ninguém sabe onde essa evolução vai parar, ou mesmo se vai parar.”
Veja dicas simples para deixar seu negócio mais "humano"
- Deixe a repetição com a IA, mas mantenha pessoas nas interações críticas;
- Use a IA para mapear comportamentos, mas deixe o fechamento para o humano;
- Estimule líderes a darem feedbacks personalizados e escutarem mais;
- Crie espaços informais de contato, como o "cafezinho com o cliente" presencial ou digital;
- Envolva o time nas decisões sobre IA e explique os porquês da automação; e
- Invista em capacitação sobre IA aplicada, não apenas técnica.