O que a Siri tem a ver com a saída do chefe de IA da Apple?
Após sete anos à frente da IA da companhia, John Giannandrea deixará o cargo e terá sua equipe integrada ao grupo de software de Craig Federighi, em uma mudança que impacta a estratégia do negócio

O chefe de IA da Apple, John Giannandrea, está se demitindo após sete anos no cargo. As ações da Apple tiveram uma leve alta com a notícia, já que alguns investidores viram isso como um sinal de que a Big Tech está priorizando a implementação de IA em seus dispositivos.
Após um período de transição, Giannandrea se "aposentará" na próxima primavera (do Hemisfério Norte), informou a Apple em um comunicado à imprensa na última segunda-feira (1). A maior parte da equipe de IA de Giannandrea será integrada ao grupo de desenvolvimento de software de Craig Federighi, responsável pelo desenvolvimento dos diversos sistemas operacionais dos dispositivos Apple.
VEM COM A GENTE E FAÇA PARTE DA COMUNIDADE DA FASTCO MONEY. Inscreva-se aqui para assinar nossa newsletter semanal.
TEMPO DEMAIS NO CARGO?
Embora os motivos da saída de Giannandrea sejam, sem dúvida, complexos, é surpreendente que ele tenha permanecido tanto tempo no cargo. Por anos, ele foi associado à incapacidade da Apple de aproveitar a IA generativa para aprimorar sua assistente de voz Siri e tornar o iPhone e outros dispositivos iOS mais inteligentes e personalizados.
Giannandrea pode ter cometido erros de julgamento. Relatos indicam que ele hesitou diversas vezes sobre a arquitetura ideal para a Siri — sobre quanto do processamento de IA da assistente deveria ser executado no dispositivo versus em um servidor na nuvem.
Mas também é possível que seus planos para integrar inteligência artificial aos produtos da Apple tenham encontrado resistência por parte de outros líderes da empresa. Ou ainda, que tenham sido prejudicados por receios da equipe de liderança de que a IA generativa comprometesse a privacidade do usuário ou criasse novas responsabilidades legais.
De qualquer forma, em 2024, a liderança da Apple — incluindo Tim Cook — havia perdido a confiança de que o grupo de Giannandrea conseguiria transformar a pesquisa em IA em recursos e produtos de IA úteis (e seguros).
Antes de chegar à Apple, Giannandrea teve uma atuação prolífica como chefe de buscas e IA no Google. Sob sua liderança, a gigante das buscas começou a usar IA para refinar sua compreensão de certos termos de busca preferidos pelos usuários, na esperança de retornar resultados mais relevantes e úteis.
O executivo estava à frente dos esforços de IA do Google quando seus pesquisadores inventaram a arquitetura do modelo de linguagem Transformer, que impulsionou o crescimento da IA generativa e novos aplicativos como o ChatGPT.
A Apple contratou Giannandrea em 2018 para revitalizar seus esforços em IA, que estavam em declínio. Isso deu à Apple o tempo e a liderança necessários para desenvolver seus próprios modelos e incorporar inteligência artificial em seus dispositivos e serviços.
COMO FOI A EVOLUÇÃO
A Apple uniu as equipes da Siri e de IA/aprendizado de máquina, colocando-as sob o controle de Giannandrea e criando um ponto único de responsabilidade para a integração de IA nos sistemas operacionais, serviços e ferramentas de desenvolvimento da empresa.
O trabalho de Giannandrea durante seus primeiros anos na Apple foi mantido em grande parte em segredo pela empresa. A Fast Company, que conseguiu o acesso a reuniões com a equipe de IA da empresa, teve seu pedido de reunião com Giannandrea negado repetidamente.
Enquanto o tiro de largada da revolução da IA generativa era dado com o lançamento do ChatGPT no final de 2022, a Apple permaneceu praticamente em silêncio, mesmo enquanto seus concorrentes corriam para desenvolver seus próprios modelos e aplicativos de IA.
Em junho de 2024, a Apple anunciou em sua conferência de desenvolvedores que traria recursos de "Inteligência Apple" para seus dispositivos, permitindo que eles oferecessem ajuda intuitiva e proativa com base nos dados pessoais do usuário. Também anunciou planos para usar IA generativa para criar uma "Siri de próxima geração" mais inteligente. Por um tempo, a esperança de que a Apple alcançaria a revolução da IA foi renovada.
Mas nem a Inteligência Apple nem a Siri de próxima geração apareceram. A Apple agora diz que chegarão em 2026. Em vez de sua própria IA, a Apple tentou integrar o ChatGPT da OpenAI à Siri, mas a experiência do usuário é ruim.
SOBROU PARA A SIRI
Em março, a Apple anunciou que tiraria a Siri do controle de Giannandrea e a colocaria dentro do grupo de software de Federighi. Apenas seis semanas depois, a Apple removeu seu grupo de pesquisa em robótica (que esperava que lançasse as bases para futuros dispositivos domésticos da Apple) do grupo de IA de Giannandrea.
A Apple acredita que Amar Subramanya, o executivo da Microsoft escolhido para substituir Giannandrea, pode e vai colocar as coisas de volta nos trilhos. Veterano do Google com 16 anos de experiência, Subramanya liderou a engenharia do assistente Gemini da empresa. Ele tem um currículo impressionante e, muito provavelmente, um preço à altura.
Sua contratação, juntamente com a saída de Giannandrea, deve ser interpretada como o reconhecimento da Apple de que está ficando para trás em relação aos seus concorrentes em IA — e um sinal de que pretende recuperar o atraso. Curiosamente, foi a saída de Giannandrea que recebeu destaque no comunicado de imprensa divulgado pela Apple na segunda-feira, e não a chegada de um novo chefe de IA, Subramanya.
No dia, as ações da Apple subiram ligeiramente com o anúncio, fechando em alta de US$ 4,25 (1,52%), a US$ 283,10.
CRISE DE IDENTIDADE?
A saída de Giannandrea diz muito sobre o tipo de empresa de tecnologia que a Apple quer ser a longo prazo. A Apple quer desenvolver e controlar seus próprios modelos de IA ou pagar para depender de grandes modelos de IA como o Gemini do Google?
A Apple tem vantagens distintas devido ao seu relacionamento sólido e de confiança com os usuários, além do controle sobre seu software e hardware, incluindo os chips dentro dos dispositivos. A companhia está em uma posição única para aproveitar modelos de IA menores e mais especializados, executados nesses chips, a fim de compreender profundamente e auxiliar os usuários de forma eficaz.
Seja qual for a decisão, pode-se esperar um foco e uma pressão muito maiores dentro da Apple para implementar novos recursos de IA e uma Siri mais inteligente em seus dispositivos.