Startups chinesas perdem atratividade para investidores do Silicon Valley
Os investimentos em empresas de tecnologia chinesas despencaram devido a incertezas e ao aumento da fiscalização do governo dos EUA
Não faz muito tempo, era comum fundadores de empresas de tecnologia chinesas procurarem investidores no Vale do Silício. E esses investidores estavam mais do que dispostos a encontrá-los. Para muitos, a China parecia ser a próxima fronteira.
Mas, ultimamente, tem parecido mais um campo minado.
Em um relatório publicado em fevereiro, o Congresso norte-americano acusou cinco grandes empresas de capital de risco dos EUA – GGV Capital, GSR Ventures, Qualcomm Ventures, Sequoia Capital China e Walden International – de financiar o “militarismo, o estado de vigilância e o genocídio do povo uigur” na China com mais de US$ 3 bilhões em investimentos em tecnologia, incluindo sistemas de reconhecimento facial e semicondutores.
A investigação, liderada por um comitê da Câmara dos Deputados, levou duas dessas empresas, Sequoia e GGV, a separar suas operações chinesas e, no caso da GGV, até mesmo a reformular seu negócio por completo.
Em agosto do ano passado, o presidente Joe Biden assinou uma ordem executiva proibindo investimentos dos EUA em qualquer empresa chinesa envolvida em certos tipos de inteligência artificial, semicondutores e computação quântica que o governo considera ser um risco para a segurança nacional.
Os investidores também estão percebendo que retirar o dinheiro investido na China está se tornando cada vez mais difícil.
A ordem também estabeleceu novas divulgações para investidores que financiam outros tipos de empresas chinesas de tecnologia. No mês passado, a Câmara aprovou um projeto de lei que forçaria a ByteDance a se desfazer do TikTok ou a plataforma seria banida nos Estados Unidos.
A Microsoft recentemente anunciou um investimento de US$ 1,5 bilhão na empresa de IA dos Emirados Árabes G42 – um acordo que foi promovido por autoridades do governo Biden que buscavam isolar a China. Todas essas medidas, somadas à queda global nos investimentos de capital de risco dos últimos dois anos, contribuíram para a forte redução dos investimentos dos EUA no país.
Antes, os investidores de risco viam a China como o futuro – um país com uma população enorme, investimentos substanciais em tecnologias avançadas e uma vasta comunidade de usuários móveis. Mas isso mudou consideravelmente.
De acordo com a PitchBook, investidores norte-americanos participaram de negócios no valor de US$ 32 bilhões na China em 2021. Esse número caiu para cerca de US$ 8 bilhões em 2022 e, no ano passado, ficou abaixo dos US$ 2,5 bilhões.
“A agressividade do governo dos EUA tem um enorme papel nisso”, observa Kyle Stanford, analista-chefe de pesquisa de capital de risco na PitchBook. “Os investidores não querem que seus nomes sejam incluídos em nenhum relatório do comitê da Câmara.”
Para muitos investidores norte-americanos com dinheiro na China, o simples fato de falar publicamente sobre as mudanças na dinâmica geopolítica se tornou uma espécie de tabu. Nenhuma das empresas citadas na investigação respondeu quando procurada pela Fast Company. Outras empresas líderes com investimentos na China também não quiseram comentar.
Em 2022 empresas do Sudeste Asiático garantiram um recorde de US$ 34,1 bilhões em financiamento de capital de risco.
Mas não é apenas o medo de ser citado que afasta esses investidores da China. Eles também estão percebendo que, mesmo se conseguirem investir em empresas chinesas, retirar o dinheiro de lá está se tornando cada vez mais difícil.
Por um lado, a China está reprimindo empresas de tecnologia, incluindo a DiDi Global, com sede Pequim, que abriu capital nos EUA em 2021 (apesar das tentativas do governo chinês de adiar a IPO devido a preocupações com a cibersegurança). A DiDi foi retirada da Bolsa de Valores de Nova York em 2022 e agora enfrenta um processo judicial movido por acionistas nos EUA.
Enquanto isso, o presidente Xi Jinping supostamente teria cancelado pessoalmente a abertura de capital da gigante dos serviços financeiros Ant Group por conflitos com o fundador da empresa, Jack Ma. Outros grandes players do setor de tecnologia no país, incluindo a ByteDance e a Shein, têm lutado para encontrar uma saída em meio às crescentes tensões com os Estados Unidos.
Stanford prevê que os investidores vão buscar negócios de outros países da Ásia, especialmente na Índia, com quem os EUA pretendem estabelecer uma relação diplomática mais forte, principalmente no que diz respeito ao setor de tecnologia.
Em 2022, de acordo com a PitchBook, empresas do Sudeste Asiático garantiram um recorde de US$ 34,1 bilhões em financiamento de capital de risco e capital privado. Mais de 60% desses negócios incluíam investidores de fora da região. Com cada vez menos investimento norte-americano na China, Stanford espera que esses números aumentem.
“Esse dinheiro que foi investido na China não vai desaparecer e provavelmente não será investido nos EUA”, diz ele. “[Os investidores] tentarão encontrar a exposição que buscavam em outros lugares.”