Vale investir em fundos do agro, os fiagro, com gripe aviária no radar?
Casos da doença no Brasil acendem alerta entre investidores em fiagro, mas safra recorde sustenta otimismo; entenda como funciona o ativo

A confirmação de casos de gripe aviária no Brasil acendeu um sinal de alerta entre os investidores que têm fiagro, os fundos de investimento em cadeias agroindustriais (ou fundos do agronegócio), na carteira ou querem ingressar na modalidade, que tem ganhado espaço na Bolsa. Esses fundos correm risco de sofrer impacto com o avanço da doença? A resposta, segundo especialistas, depende da exposição de cada fundo ao setor avícola e do desdobramento do surto nos próximos meses.
RISCO SE A DOENÇA SE ALASTRAR
“O impacto da gripe aviária deve ser limitado, a menos que a doença se alastre descontroladamente, o que não parece ser o caso, dado o bom trabalho de contenção que tem sido realizado”, afirma Felipe Vasconcellos, sócio da Equus Capital.
MAIS CAUTELA COM O FIAGRO-FIDC
O segmento de proteína animal, especialmente o avícola, tem presença principalmente nos fiagro do tipo FIDC (Fundo de Investimento em Direitos Creditórios), voltados para concessão de crédito. Segundo Vasconcellos, alguns desses fundos têm exposição significativa a empresas da cadeia e devem ser avaliados com mais cautela neste momento.
“O investidor deve fazer uma análise redobrada dos fiagro-FIDC que têm na sua base de credores empresas do setor avícola. Até que tenhamos mais visibilidade sobre o impacto da doença, é importante ser mais criterioso”, alerta.
DECISÃO DE INVESTIR TEM A VER COM PERFIL
Evandro Buccini, diretor de Gestão de Crédito da Rio Bravo, vê o momento com mais cautela. “Não conheço fiagro com exposições muito relevantes a aves, mas para o investidor extremamente conservador, pode fazer sentido evitar essa exposição por ora.”
Apesar disso, os especialistas concordam que os impactos, até o momento, foram limitados. Para Vasconcellos, isso pode até indicar uma oportunidade. “Pode ser um bom momento para investir, desde que o fundo tenha feito operações com contrapartes bem estruturadas e com controle sanitário adequado.”
SAFRA RECORDE: O IMPULSO ESPERADO
Se por um lado a gripe aviária traz atenção, por outro, a expectativa de safra recorde de grãos no Brasil em 2025 anima o mercado e os fiagro. A perspectiva de aumento na receita dos produtores, especialmente de soja e milho, tende a influenciar diretamente o desempenho dos fundos.
“Com a super-safra, fiagro expostos ao segmento de grãos podem pagar maiores dividendos”, diz sócio da Equus Capital. “Nos fundos de crédito, o risco de inadimplência também diminui com o melhor faturamento dos produtores.”
Para o executivo da Rio Bravo, o impacto nos rendimentos pode ser indireto, mas relevante: “Fundos de crédito não deveriam ter grandes flutuações conforme a safra, mas podem se beneficiar na redução de inadimplência ou em processos de recuperação judicial.”
Ainda assim, os especialistas alertam que uma oferta muito elevada pode levar à queda dos preços das commodities. Apesar disso, Vasconcellos acredita que o impacto nos fundos será limitado, já que o volume de produtos vendidos tende a compensar parte da perda de preço.
AINDA VALE A PENA INVESTIR EM FIAGRO?
Afinal, os fiagros são uma boa opção de investimento? A resposta unânime dos especialistas é: sim, mas com critério e análise aprofundada.
“Os fiagro têm atraído cada vez mais investidores e aumentado sua liquidez, o que reduz riscos. É uma forma de diversificar a carteira e ter exposição ao maior contribuinte do PIB (Produto Interno Bruto) brasileiro”, afirma Vasconcellos.
Buccini ressalta a importância de olhar além da “casca” dos fiagro. “Não dá para avaliar como um produto único. É preciso analisar o que está dentro do fundo, quem é o gestor, os custos, a liquidez. Até mesmo se está sendo negociado com desconto no mercado, como alguns estão.”
OPÇÃO PARA GERAÇÃO DE RENDA
Roberto Max, sócio e assessor de investimentos da Barsi Investimentos, também destaca o papel dos fiagro na diversificação de carteira e na geração de renda.
Para o especialista, o cenário atual oferece uma combinação de fatores favoráveis. "Com a expectativa de manutenção dos juros (Selic) ainda elevados por um tempo e a isenção de IR nos dividendos, fiagro de CRAs seguem atrativos. Já os que investem em propriedades rurais (FII agrícolas) podem se valorizar com a queda futura dos juros."
Os CRAS (Certificados de Recebíveis do Agronegócio) são títulos de renda fixa de crédito emitidos por empresas do setor agroindustrial. Entre elas, produtoras de alimentos, cooperativas e companhias que fornecem insumos ou serviços para o campo.
O QUE O INVESTIDOR PRECISA SABER
Assim, diante de tantas particularidades, é importante entender algumas características dos fiagro. Por exemplo, como é a divisão por categorias:
- Fiagro-FIDC: focados em crédito, geram retorno por meio de juros cobrados de empresas do agro.
- Fiagro-FII: compram propriedades e ativos como silos, lucrando com a valorização e aluguel.
- Fiagro-FIP: investem em participação societária em empresas do setor, visando valorização e dividendos.
Um investidor pode comprar cotas de fiagro listados na bolsa de valores, como compra uma ação, ou FII (fundo voltado ao mercado imobiliário) e pode investir em fiagro fechados.
“É arriscado concentrar a exposição em apenas um tipo de fundo ou cultura, como soja ou milho. A diversificação é essencial para mitigar riscos como doenças, clima e volatilidade de commodities”, recomenda Vasconcellos.
PRINCIPAIS RISCOS HOJE
Apesar das oportunidades, os fiagro não são livres de riscos. Entre os principais, Max destaca:
Risco cambial: variações nos preços de commodities negociadas internacionalmente podem impactar os resultados.
Volatilidade do mercado: o setor agroindustrial é vulnerável a flutuações de preços, condições climáticas adversas e políticas públicas, o que pode impactar diretamente os retornos dos fundos.
Risco de crédito: Investimentos em CRAs e LCAs (Letras de Crédito do Agronegócio) estão sujeitos à inadimplência por parte dos emissores.
Risco de liquidez: fiagro podem apresentar baixa liquidez, dificultando a venda de cotas em determinados momentos.
PRINCIPAIS VANTAGENS
Vale lembrar que os fiagro oferecem vantagens únicas que os tornam atraentes em relação a outros tipos de investimentos em renda variável, segundo o assessor de investimentos da Barsi Investimentos. São elas:
- Geração de renda passiva: os fiagro publicam nos seus estatutos as regras de distribuição de dividendos, que costumam ser pagos mensalmente.
- Isenção fiscal: investidores pessoa física podem se beneficiar da isenção de Imposto de Renda sobre rendimentos distribuídos.
- Diversificação: fiagro proporcionam exposição ao setor agroindustrial, que possui correlação reduzida com outros ativos de renda variável.
- Potencial de valorização: o agronegócio possui alta demanda global e é uma das áreas mais resilientes da economia brasileira.
- Estabilidade: muitos dos ativos subjacentes, como CRAs e LCAs, possuem fluxo de rendimentos mais previsível.
Para Buccini, há também riscos idiossincráticos do próprio setor agropecuário: “é preciso olhar com lupa cada fundo, cada operação de crédito, especialmente em tempos de incerteza sanitária.”
É PRECISO SABER ONDE SE ESTÁ PISANDO
Mesmo diante da ameaça da gripe aviária, os especialistas consultados pela Fast Company Brasil enxergam um cenário positivo para os fiagro em 2025, impulsionado principalmente pela super-safra de grãos.
O segredo, como em qualquer investimento, está na análise criteriosa da carteira do fundo, do setor ao qual está exposto e da qualidade da gestão.
Como resume Vasconcellos, “o investidor precisa saber onde está pisando. O agronegócio é promissor, mas exige acompanhamento atento dos ciclos econômicos, climáticos e sanitários.”