Fast Company Brasil
6 minutos de leitura Pão de queijo é um ícone do Brasil, mas o Brasil é muito mais do que esse belo e delicioso símbolo. Assim como é muito maior do que uma camiseta de futebol. Com esses exemplos, o carioca Hugo Gunzburger, filho de uma mineira de BH e de um paulista da cidade litorânea de Santos, explica a proposta do recém lançado banco de imagens Brasil com S.Gratuita, a iniciativa permite ofertar ao mercado imagens brasileiras “de verdade”, como diríamos, em vez de cenas que remetem a padrões americanos e europeus. O acervo, embora pequeno por ser novo, apresenta momentos tão comuns para nós como um churrasco na laje ou que contém uma decoração ou mobiliário que parece ter DNA brasileiro, caso das cadeiras de faixas coloridas expostas nas praias, nas quais o povo se senta para comer um biscoito Globo.
(Crédito: Brasil com S)
Sócio de uma agência de design, publicidade e eventos, a Lab 678, localizada no Rio, Gunzburger (sobrenome alemão vindo de um avô) revela que o projeto nasceu de dois incômodos. “Vira e mexe, buscávamos imagens em bancos que não traziam representação real do brasileiro. Às vezes, em projetos que nós desenvolvíamos recebíamos do cliente o pedido para não mostrar esse Brasil. Queriam coisas mais caricatas”, conta. Quando a busca das marcas por público pretensamente brasileiro cai nas imagens rotineiras dos grandes bancos internacionais, a comunicação fica mais fria e nela ninguém se reconhece, observa Gunzburger. Por vezes, uma pessoa claramente de outra cultura, de país que fala espanhol, por exemplo, é apresentada como brasileira em uma peça de divulgação e isso não permite que o público brasileiro se conecte à mensagem da marca, afastando-o. “Comunicar tem a ver com criar empatia”, defende Gunzburger. Em cima desse “vazio” surgiu a necessidade de criar o projeto. Foram quatro meses de dedicação para levá-lo ao ar. Lançado no dia 11 de outubro, o site
www.brasilcoms.com.br tem mais de 200 imagens, com três temáticas diferentes – um churrasco de domingo, uma tarde comum de trabalho e um happy hour para relaxar – que podem ser adquiridas gratuitamente para fins editoriais. Nesse pouco tempo de operação, o projeto gerou quase 12 mil acessos. E muita repercussão. Segundo Gunzburger, o mood que mais chamou views foi o do churrasco, mas as imagens mais baixadas foram as do álbum ligado às cenas cotidianas, de trabalho. Entre os retornos, uma observação que já vem fazendo parte dos planos do grupo para uma próxima fase: ele ainda é regional. Afinal, trouxe um conteúdo mais ligado ao Rio. “Queremos expandir. O laboratório está fervendo de ideias e pensamentos indo para várias direções”.
(Crédito: Brasil com S)
A Lab 678 está planejando outros recortes, outros estilos de vida, cores, corpos, sexualidades e gêneros. “Essa busca passa por questões culturais, trata de hábitos”, acrescenta Gunzburger. Para isso, o grupo busca parceiros locais pelo menos nas macro regiões (Norte, Nordeste, Sul, Centro-Oeste e Sudeste). “Mas a gente não pode ficar só no imagético. Queremos manter a pluralidade também entre os profissionais. Se fecharmos com um parceiro amazonense, é essencial que o pessoal que irá clicar tenha contextos diversos. O time não pode ter um único recorte”, salienta.Esse cuidado é vital para que a narrativa tenha contexto real. “Caso contrário, fica algo apenas plástico. Não tem um backstage verdadeiro”, emenda Gunzburger. “Achar a equipe e o casting é um trabalho complexo. Buscamos pessoas não agenciadas e fizemos procura em redes sociais por quase dois meses para o lançamento do projeto”, relata.
EQUIPE DIVERSA De fato, a escolha da equipe que montou o Brasil com S tinha de fazer sentido com o conceito. Isso era fundamental. Dos modelos aos responsáveis por figurino, beleza e fotografia, todos representam, na prática, esse Brasil. São pessoas reais, criativas, com corpos, gêneros, sexualidades e vivências diversas. Bel Corção é a fotógrafa responsável por capturar os momentos. “Acho essencial criarmos esse conteúdo com pessoas reais, não só em termos de modelo, mas de equipe também”, declara. Para ela, o trabalho feito até agora “ficou incrível com vários olhares construindo a mesma imagem”. Bel espera que, partir daí, marcas e outras produções aconteçam nesse formato.O projeto aposta no complemento que pessoas diversas podem trazer à comunicação. “Os profissionais de marketing precisam entender a representatividade não como um adereço de datas comemorativas, mas como um grande diferencial no mercado. Pessoas reais são grandes profissionais. Nós, brasileiros, somos muito criativos. E vivências diversas trazem ideias diversas, inovações que se complementam e somam”, diz Camila Flor, redatora do Lab 678 que participou da criação do projeto.
(Crédito: Brasil com S)
Ana Lucariny, designer da agência, outra profissional envolvida com o novo banco de imagens, afirma que todos os elementos dos cenários foram pensados para compor o conceito Brasil. “São elementos que encontramos em vários cantos do país. Quisemos trazer muita cor – nosso país é um país com cores bem saturadas –, misturada com objetos clássicos e presentes na nossa cultura, como o Biscoito Globo, a cervejinha gelada, a mesa de bar. Também queríamos retratar uma sujeira, uma poluição visual que faz parte do Brasil”, completa.Na beleza, criada e assinada por Fernanda Suzz, é possível observar a valorização dos traços, pintas e tons de pele de cada modelo. O figurino foi de Maria Angelina, mulher trans em transição, que reforça a importância do projeto. “Meu objetivo foi retratar os rostos e corpos reais de um Brasil descolonizado. Espero que também crie, nos profissionais da área, um certo incômodo e questionamento do quanto vemos de representatividade de verdade nas propagandas e mídias.”Landara Marcelle, uma das modelos do banco, reforça a importância da representatividade que sua imagem traz, principalmente quando retratada trabalhando. “Uma mulher negra, gorda e favelada, se colocando em diferentes papéis possíveis, acaba contrariando marcadores excludentes e limitantes do machismo, racismo e da gordofobia”. Ela lembra que cerca de 56% da população brasileira é negra (segundo o IBGE). “Mesmo com esse percentual, esses corpos são invisibilizados, estereotipados e marginalizados.”
SERVIÇO PREMIUM ALGUM DIA?Gunzburger descarta a possibilidade de o serviço ser pago ou ter uma modalidade premium. “Não vai ter por ‘n’ motivos, inclusive legais. Se queremos democratizar, criar um lado monetário pode ser complicado, pode gerar dualidades. A gente quer sustentar o projeto por meio de patrocínios. Marcas podem nos apoiar para fazer o banco crescer”. Talvez seja possível fazer coleções exclusivas para marcas parceiras.Enquanto esses acordos estão em construção, o Brasil com S acaba de completar mais uma parte do projeto. A agência, que tem grande força no design, criou a identidade visual do banco de imagens e fez uma fonte a mão. Daqui a três semanas ela estará disponível.