Com a saída de Rupert Murdoch, chega ao fim a era dos magnatas da mídia

Não importa como se dará a sucessão na Fox e na News Corp., Murdoch foi o último de uma espécie em extinção

Crédito: Axelle Bauer-Griffin/ FilmMagic/ Getty Images

James Surowiecki 4 minutos de leitura

O anúncio de Rupert Murdoch de sua saída do cargo de presidente da Fox e da News Corp. marca o fim de uma era que, em seu auge, nas décadas de 1980 e 1990, transformou o cenário da mídia global: a era dos magnatas da mídia.

Murdoch era o último remanescente desta classe. Mesmo após Michael Ovitz (da Creative Artists), Ted Turner (TBS), Michael Eisner (Disney) e até Sumner Redstone (Paramount) terem se afastado ou falecido, ele ainda estava envolvido na gestão de suas organizações e buscava fazer negócios.

O que tornou figuras como Redstone e Murdoch distintas foi o fato de comandarem suas empresas como feudos e, no caso de Murdoch, usá-las como plataformas para suas políticas e obsessões pessoais (como seu amor por jornais, por exemplo).

Crédito: Fox News

Eles pareciam mais interessados em construir impérios por meio de aquisições e acumular poder e influência do que em seguir o ethos mais racionalizado e voltado para a maximização de lucros característico do capitalismo gerencial. E conseguiam fazer isso porque tinham o controle das empresas, o que lhes permitia ficar relativamente indiferentes ao que os acionistas desejavam.

Mas, na maioria dos casos, isso não era bom para as perspectivas de negócios das empresas que comandavam.

Como Jonathan Knee, Bruce Greenwald e Ava Seave mostraram no livro “The Curse of the Mogul”(A Maldição do Magnata), de 2009, as ações dos meios de comunicação tiveram um desempenho consideravelmente inferior durante a era dos magnatas.

A obsessão com o tamanho de seus impérios os cegou para o fato de estarem pagando demais por ativos que tinham pouco sentido estratégico, o que, por sua vez, explica por que, na década de 2000, as empresas de mídia tiveram baixas contábeis de US$ 200 bilhões em aquisições supervalorizadas. Além disso, a maioria estava mais interessada em fazer negócios do que em gerir suas empresas.

BONS E MAUS NEGÓCIOS

Curiosamente, Murdoch foi uma exceção. Como Knee e seus coautores afirmaram, ele tinha “todos os atributos do magnata perfeito”. Era um gerente competente, capaz de administrar suas empresas com eficiência e tinha instintos empreendedores genuínos.

Isso ficou claro com a criação da Fox TV e da Fox News, que desafiaram e depois se tornaram parte dos oligopólios de mídia dominantes. Ambas transformaram a televisão – mas nem tudo foi para melhor.

A Fox News deu a Murdoch o tipo de influência política e peso cultural que ele sempre desejou. Sob a liderança de Roger Ailes, ela mesclou o populismo de direita com a sensibilidade dos tabloides e foi a primeira rede de notícias a cabo com uma abordagem explicitamente política (mesmo que se autodeclarasse “justa e equilibrada”).

Sede da News Corp. em Nova York (Crédito: iStock)

A rede não só foi muito lucrativa como também poderosa, transformando tanto a televisão quanto a política norte-americana. Ela se tornou essencial para o surgimento da direita populista, do movimento Tea Party (composto pela ala radical do Partido Republicano) e de Donald Trump (a quem Murdoch, segundo todos os relatos, detesta).

Ironicamente, Murdoch não foi tão bem-sucedido como homem de negócios, em parte porque, como a maioria dos magnatas, não poupava dinheiro quando se tratava de suas paixões e do desejo de expandir seu império.

Ele gastou US$ 3 bilhões na compra da “TV Guide” e de algumas outras revistas, mais de US$ 1 bilhão no MySpace e no IGN, US$ 6 bilhões por uma participação na Gemstar (uma empresa de guia de programação que ninguém se lembra) e acabou vendendo-a por apenas US$ 1 bilhão.

Talvez seu melhor negócio, na verdade, não tenha sido uma aquisição, mas sim uma venda – a de todos os ativos de entretenimento da Fox para a Disney, por US$ 71 bilhões.

A BATALHA DA SUCESSÃO

Apesar de tudo isso, Murdoch não apenas manteve o status por mais tempo do que seus pares das décadas de 1980 e 1990 como obteve melhores resultados em termos de negócios.

O fato de ter conseguido essa façanha explica por que ele é o último dos magnatas: os acionistas perderam a paciência por causa dos estragos nos preços das ações provocados pela maioria deles e começaram a buscar executivos tradicionais.

Nos dias de hoje, para encontrar CEOs excêntricos comandando empresas como feudos, é preciso olhar para o setor de tecnologia, onde Elon Musk mantém esse conceito vivo praticamente sozinho.

Embora um dos filhos de Murdoch, Lachlan – CEO e agora presidente da Fox e da News Corp. – esteja no comando por enquanto, seus outros quatro irmãos também têm a chance de herdar ações com direito a voto. É possível que quem vencer a batalha de sucessão tente emular a abordagem do pai. Mas parece improvável. Essa época e estilo de gestão já passaram.

O mais provável é que o vencedor racionalize os negócios, vendendo ativos para compradores que podem fazer mais com eles e se livrando de coisas que Murdoch possuía simplesmente porque amava (como o “The New York Post”). Podemos dizer que, no fim das contas, os administradores triunfarão sobre os magnatas.


SOBRE O AUTOR

James Surowiecki é jornalista e escritor, autor de "A Sabedoria das Multidões". saiba mais