Elon Musk está levando o jeito Silicon Valley de “quebrar tudo” para a política

Uma carta do Departamento de Justiça dos EUA ao bilionário parece ter colocado a "loteria" eleitoral de Musk em suspenso

Crédito: Anna Moneymaker/ Getty Images

Chris Stokel-Walker 4 minutos de leitura

Falando com seu biógrafo Walter Isaacson, Elon Musk disse sobre sua relação com a autoridade: "acho que sempre fui de apostar todas as minhas fichas ou partir para o próximo nível do jogo." Isaacson mais tarde citaria outra frase de Musk: "tenho o mau hábito de morder mais do que consigo engolir".

Atualmente, ambas as citações parecem se aplicar ao empresário, que teria recebido uma carta do Departamento de Justiça dos EUA (DoJ) esta semana, alertando-o de que o sorteio para dar a eleitores registrados em estados decisivos US$ 1 milhão por assinarem uma petição em favor da Primeira e Segunda Emendas da Constituição do país poderia ser ilegal.

Musk lançou a loteria no início deste mês, direcionada a eleitores em estados chave, incluindo Arizona, Pensilvânia, Carolina do Norte, Geórgia, Michigan, Nevada e Wisconsin, para assinarem uma petição organizada por seu America PAC em apoio à liberdade de expressão e ao direito de portar armas.

Até agora, três eleitores republicanos registrados na Pensilvânia receberam um cheque de US$ 1 milhão do PAC, que planejava continuar com os pagamentos até o dia da eleição.

Enquanto esses cheques estavam sendo entregues, várias organizações apontaram que a oferta poderia ser ilegal. O Public Citizen, um grupo de defesa pública, apresentou uma queixa à Comissão Federal Eleitoral (FEC) sobre os prêmios, afirmando que isso “parece constituir um pagamento para incentivar o registro de eleitores e influenciar votos”.

Um quarto vencedor também recebeu seu cheque, mas o que deveria ter sido o quinto pagamento, nesta quarta-feira, não ocorreu. Foi no mesmo dia em que a rede de TV CNN relatou que o DoJ havia enviado a Musk uma carta alertando-o sobre a potencial ilegalidade do que está fazendo.

“Talvez Musk tenha entendido a mensagem desta vez e decidido que não valia a pena correr o risco”, diz Rick Hasen, professor de ciência política e diretor do departamento de direito da Universidade da Califórnia em Los Angeles (UCLA).

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Hasen foi um dos primeiros a alegar que o bilionário estava caminhando para uma “compra de votos claramente ilegal” em um post de blog na semana passada. O truque é que ele não está sorteando dinheiro para as pessoas se registrarem para votar, e sim para que assinem a petição. Mas só pode assinar quem tiver se registrado como eleitor.

Procurado, Musk não respondeu ao pedido de comentário da Fast Company.

A forma como ele escolheu driblar a lei eleitoral, no melhor dos casos – ou passar por cima dela, no pior – faz parte de sua atitude de uma maneira geral. Musk já é obrigado a ter um advogado que revise qualquer postagem sua sobre a Tesla no Twitter (atual X), como parte de um acordo com a Comissão de Valores Mobiliários dos EUA por alegada manipulação de mercado ao usar a rede social. Sua última tentativa de reverter essa supervisão foi rejeitada em abril.

“Musk tem um relacionamento complicado com o governo dos EUA”, diz Steven Buckley, especialista em redes sociais e política norte-americana e professor de sociologia da mídia digital na Universidade de Londres.

Musk comprou o Twitter como parte do que via como uma cruzada para manter e recuperar o direito à liberdade de expressão.

“Sua cruzada um tanto arbitrária pela liberdade de expressão e resistência à regulamentação muitas vezes parece ir contra sua disposição em aceitar grandes contratos do governo que ajudam a financiar suas várias empresas”, aponta Buckley. A atitude de Musk em relação à autoridade parece ser a de pedir desculpas por infringir as regras, e não permissão para fazê-lo.

Buckley acredita que Musk não necessariamente se importaria se estivesse infringindo a lei, com base em sua mentalidade, fruto de seu espírito empreendedor e da abordagem geral do setor tecnológico de "mover-se rápido e quebrar barreiras", em contraste com a dos políticos.

“Para Musk, leis, legislação e regulamentação são obstáculos para alcançar seus objetivos, que ele considera imperativos para a sobrevivência da raça humana”, diz Buckley. “Se ele realmente sente que a humanidade está em jogo, não é surpresa que esteja disposto a driblar ou quebrar essas regras.”

Afinal, o bilionário dono da Tesla e da SpaceX comprou o Twitter por US$ 44 bilhões como parte do que via como uma cruzada para manter e recuperar o direito à liberdade de expressão contra o que ele chama de "vírus mental progressista".

À luz disso, Hasen, da UCLA, acredita que ele pode ter simplesmente decidido seguir em frente. “Mas, como ele provocou uma reação da aplicação da lei, pode não valer a pena.”

No entanto, há um lado positivo para Musk. “Dado seu claro desejo por atenção, não ficaria surpreso se ele visse uma vantagem em todas essas possíveis ações judiciais contra si, pois ajudaria a pintar a imagem de que é uma vítima de perseguição política”, diz Buckley.

Ou, como Hasen coloca: “ele já obteve uma quantidade enorme de publicidade gratuita para seu PAC e seus esforços com o que fez até agora.”

Com informações da redação da Fast Company Brasil


SOBRE O AUTOR

Chris Stokel-Walker é um jornalista britânico com trabalhos publicados regularmente em veículos, como Wired, The Economist e Insider saiba mais