IA pode tornar a fertilização in vitro um processo mais acessível
A tecnologia pode automatizar etapas manuais e outros processos mediados por computador, resultando em mais eficiência e custos menores
Se é preciso uma aldeia inteira para educar uma criança, é preciso um exército inteiro de médicos para gerar uma criança para casais inférteis. Atualmente, as taxas globais de infertilidade estão aumentando, mas ampliar os serviços de fertilização in vitro (FIV) não é uma tarefa das mais fáceis. Uma única rodada de FIV pode ser um processo demorado.
Cada rodada envolve de três a seis visitas a uma clínica, com amostras de sangue e ultrassonografias para monitorar o corpo da paciente e garantir que cada etapa seja realizada no momento certo. A FIV em si também é cara: cada rodada pode custar entre US$ 15 mil e US$ 30 mil.
Amber Cooper é diretora médica de genética e operações de laboratório na clínica de fertilidade e bem-estar Kindbody. Fundada em 2018 por Gina Bartasi, a Kindbody oferece planos de fertilidade diretamente a empresas, além de possuir e operar suas próprias clínicas. Ela acredita que a automação e a IA podem tornar a fertilização in vitro acessível para mais pessoas.
Fast Company – Por que é importante aumentar o acesso [à FIV]?
Amber Cooper – Estamos registrando taxas crescentes de infertilidade ou subfertilidade. Costumava ser de um caso em cada 10 casais, ou um em cada seis casais. Agora, estamos quase chegando a um em cada cinco casais. E não são apenas os pacientes com infertilidade que precisam de fertilização in vitro. São pessoas que sofrem abortos espontâneos recorrentes ou portadoras de doenças genéticas, além da população LGBTQ+.
Fast Company – E como ampliar o acesso ao processo?
Amber Cooper – Não é de uma hora para outra que vamos ter 10 vezes o número de médicos, 10 vezes o número de embriologistas e 10 vezes o número de clínicas. Precisamos de automação e inteligência artificial.
Quando falo em automação, quero dizer fazer com que um processo ou sistema opere automaticamente para substituir o trabalho humano. E também temos a IA, que permite substituir algumas tomadas de decisão humanas.
O foco mais importante da inteligência artificial está no laboratório.
A IA pode automatizar as etapas manuais relacionadas ao processamento e aos resultados dos exames de sangue, ao registro médico eletrônico, ao faturamento e a outros processos mediados por computador. Assim teremos tempos de resposta mais rápidos e maior eficiência, o que, por sua vez, pode aumentar a satisfação do paciente e reduzir os custos.
Fast Company – Como é a integração da IA e da automação ao processo de fertilização in vitro?
Amber Cooper – O foco mais importante da IA está no laboratório. Para preparar os espermatozoides, você pega uma agulha para colher um espermatozoide individual e o injeta no óvulo para fertilizá-lo.
Os óvulos fertilizados são transferidos para a incubadora, para crescerem por mais alguns dias. Tudo isso poderia ser feito automaticamente por robôs e IA, o que algumas empresas já estão fazendo.
A outra grande área em que a IA está entrando é o espaço de rastreamento de inventário. Atualmente, a maioria das clínicas usa um processo chamado duplo testemunho, em que duas pessoas confirmam que o adesivo certo está no tubo certo.
A inclusão de um sistema de testemunha com IA aumenta a proteção dos pacientes. Cada vez mais clínicas estão usando chips RFID para ajudar a rastrear recipientes para esperma e óvulos, cadeia de custódia etc.
Fast Company – O que o futuro promete?
Amber Cooper – Resta saber o quanto os modelos de IA podem melhorar. No momento, para prever a resposta de uma mulher à medicação, posso usar os resultados do exame de sangue, a contagem de folículos no ultrassom, sua idade e seu índice de massa corporal (IMC). A inteligência artificial pode ser capaz de criar um algoritmo para ajudar.
Mas sempre há casos atípicos que respondem de forma diferente, e é aí que entra a arte da medicina. Estamos tentando descobrir como incorporar isso também aos modelos de IA.
Com IA teremos tempos de resposta mais rápidos e maior eficiência, o que pode reduzir os custos.
Além disso, temos a questão de definir até onde podemos ir com os testes genéticos. Atualmente, há algumas áreas básicas em que fazemos esse tipo de teste. Uma delas é o teste genético pré-implantacional, que procura verificar se há muito pouco DNA em determinados cromossomos. Isso resultará em um embrião que geralmente não se implanta.
A segunda área é o teste genético pré-implantação para uma mutação de um único gene, como fibrose cística ou doença de Huntington. Essas são doenças que não estão ligadas a um único gene. Certos atributos de um genoma podem aumentar a probabilidade de alguém ter certas doenças – como doenças cardíacas, autismo, diabetes tipo 1.
Há empresas que estão oferecendo testes para algumas dessas doenças poligênicas. Não estamos nem perto de um cenário em que as pessoas possam escolher a cor do cabelo ou dos olhos, mas, provavelmente, já podemos reduzir a incidência de doenças, o que é complicado.
A IA nos levará a um ponto em que há algumas perguntas realmente difíceis que precisam ser feitas sobre a quantidade de decisões e intervenções humanas relacionadas aos nascimentos.