Mil vozes dentro da Amazon pedem freios e contrapesos para a IA

Carta aberta acusa gigante tecnológica de sacrificar metas climáticas e acelerar planos de substituir mão de obra humana

Créditos: Cash Macanaya/ Anirudh/ Erfan Rahi/ Unsplash

Taylor Hatmaker 4 minutos de leitura

Funcionários da Amazon nos EUA divulgaram uma carta aberta com alertas contundentes sobre a corrida da empresa rumo à inteligência artificial. A carta, assinada por mais de mil pessoas, critica a Amazon por priorizar seus investimentos em IA às custas do clima e de sua força de trabalho humana.

Os signatários ocupam funções variadas dentro da companhia, incluindo muitos engenheiros de software e até funcionários diretamente envolvidos no desenvolvimento de sistemas de IA.

“Acreditamos que a abordagem a qualquer custo, em 'velocidade de dobra', causará danos imensos à democracia, aos nossos empregos e ao planeta”, diz a carta. “Somos os trabalhadores que desenvolvem, treinam e usam IA, portanto, temos a responsabilidade de intervir.”

Na carta, obtida pelo jornal "The Guardian", os funcionários argumentam que a empresa está descumprindo suas promessas em relação ao clima na corrida para vencer a disputa pela IA.

A Amazon prometeu zerar suas emissões líquidas de carbono até 2040, baseada em ganhos de eficiência com veículos elétricos de entrega e redução de embalagens plásticas como parte desse compromisso.

Apesar da promessa de reduzir sua pegada de carbono, as emissões da Amazon aumentaram no ano passado, um movimento associado à poluição gerada por sua vasta frota de veículos de entrega e ao forte impulso na construção de data centers.

A carta também aponta para o esforço intenso de lobby da Amazon contra regulamentações de IA.

Estruturas intensivas em recursos como os data centers – nos quais a Amazon está investindo bilhões – são um tema central em 2025. Esses prédios, erguidos para sustentar as ambições de IA das gigantes de tecnologia, consomem grandes quantidades de eletricidade para manter servidores em funcionamento e utilizam muita água para resfriar todo esse gasto energético.

Embora os data centers, geralmente instalados longe dos grandes centros urbanos, prometam às comunidades rurais um boom de empregos estáveis em empresas altamente valiosas, a realidade costuma ser menos animadora.

Apesar da enorme área ocupada e do pico de trabalho temporário durante a construção, pouquíssimas pessoas são necessárias para manter as operações. Diante desses impactos, comunidades rurais nos EUA começam a rejeitar a expansão dos grandes projetos de IA das empresas de tecnologia.

CARTA À AMAZON CITA SUBSTITUIÇÃO DE FUNCIONÁRIOS POR IA

O clima não é a única preocupação dos trabalhadores que assinaram a carta aberta. O grupo acusa a Amazon de impor a IA ao seu quadro de pessoal enquanto, ao mesmo tempo, planeja abertamente substituir trabalhadores humanos assim que a tecnologia permitir.

Enquanto isso, segundo os autores, os prazos estão ficando mais curtos e as exigências de produtividade aumentam, à medida que a empresa tenta extrair cada gota de desempenho dos empregados. Em outubro, a Amazon anunciou que demitiria 14 mil funcionários, uma grande rodada de cortes concentrada no pessoal de escritório.

Amazon usa IA para se reinventar e 14 mil funcionários pagarão o preço
ANIRUDH, Daniel Nyoka e Marques Thomas via Unsplash

Em um memorando aos funcionários, a vice-presidente sênior de pessoas, experiência e tecnologia, Beth Galetti, afirmou que os cortes tinham como objetivo “reduzir burocracia, eliminar camadas e realocar recursos para garantir que estamos investindo em nossas maiores apostas” – principalmente os enormes gastos da empresa com IA.

“Esta geração de IA é a tecnologia mais transformadora desde a internet e está permitindo que empresas inovem muito mais rápido do que nunca (em segmentos de mercado existentes e em totalmente novos)”, escreveu Galetti.

Os investimentos da Amazon em IA já ultrapassaram US$ 125 bilhões em 2025 e a companhia planeja investir esse valor, ou mais, em 2026.

UM APELO POR PROTEÇÕES

A carta também aponta para o esforço intenso de lobby da Amazon contra regulamentações de IA e para o papel da empresa na disseminação de tecnologias de vigilância e aplicações militares como áreas de grande preocupação.

Para enfrentar esses riscos, o documento pede que a companhia abandone “energia suja” e retome seu compromisso climático; inclua funcionários da base nas decisões relacionadas à IA; e rejeite aplicações de vigilância e de deportação de imigrantes usando sua tecnologia.

Os investimentos da Amazon em IA já ultrapassaram US$ 125 bilhões em 2025.

A carta representa apenas uma pequena fração dos mais de 1,55 milhão de empregados da Amazon, mas isso não impediu que mil pessoas dentro da companhia expressassem suas preocupações, mesmo com o risco potencial de retaliação.

Além da força de trabalho da própria Amazon, cerca de 2,4 mil pessoas, incluindo estudantes e funcionários de outras grandes empresas de tecnologia, divulgaram uma carta de apoio.

“Tudo isso é intimidante, mas nada disso é inevitável”, escreveram os autores. “Um futuro melhor ainda está totalmente ao alcance, mas exige que encaremos de frente os custos da IA e as proteções de que precisamos.”


SOBRE A AUTORA

Taylor Hatmaker é fotógrafa e jornalista especializada em mídia social, games e cultura digital. saiba mais