Prisão do CEO do Telegram, Pavel Durov, divide opiniões de especialistas

O debate é sobre se a prisão é a melhor forma de manter os executivos de empresas de tecnologia na linha ou se isso abre um precedente perigoso

Créditos: Dima Solomin/ Unsplash/ Getty Images

Chris Stokel-Walker 3 minutos de leitura

Têm sido dias caóticos para o CEO do Telegram, Pavel Durov, preso ao desembarcar em um aeroporto nos arredores de Paris em seu jato particular no fim de semana. Após sua prisão no sábado (dia 24), o executivo foi mantido sob custódia.

Na segunda-feira (dia 26), as autoridades francesas informaram que Durov foi detido para interrogatório como parte de uma investigação sobre lavagem de dinheiro, uso de serviços de criptografia sem permissão e compartilhamento de imagens de abuso infantil. Ele ainda não foi acusado. A França tem até esta quarta-feira para decidir se acusa ou libera o bilionário.

Em um comunicado publicado no Twitter (atual X) logo após sua prisão, o Telegram afirmou que segue as leis da União Europeia e que Durov "não tem nada a esconder e viaja frequentemente pela Europa". "É absurdo afirmar que uma plataforma ou seu proprietário são responsáveis pelo abuso dessa plataforma", acrescentou a empresa.

Críticos apontaram que a defesa do Telegram não leva em conta o fato de que o aplicativo é visto como leniente com criminosos devido às suas fracas políticas de moderação e à disposição declarada de Durov de desconsiderar pedidos das autoridades para remover ou censurar conteúdo.

Os países da UE já tiveram conflitos com o Telegram antes: a Alemanha emitiu uma multa para a plataforma em 2022 por não cumprir sua legislação nacional. Só que, desta vez, as autoridades foram atrás do executivo em vez da empresa que ele lidera.

“A decisão de levar o CEO de uma empresa importante sob custódia – e acusá-lo de ser cúmplice de crimes facilitados pela plataforma – parece sem precedentes”, diz Juan Ortiz-Freuler, pesquisador de política e tecnologia no Centro Berkman Klein para Internet e Sociedade, da Universidade de Harvard.

O caso sugere que ver a questão como uma batalha pela liberdade de expressão – como Elon Musk fez – é, na verdade, uma abordagem equivocada, acredita Catalina Goanta, professora associada de governança de plataformas na Universidade de Utrecht, na Holanda.

“A liberdade de expressão não é absoluta, especialmente quando um serviço online aparentemente não cumpre uma série de leis –tráfico de drogas, conteúdo terrorista, material de abuso sexual infantil, violações de propriedade intelectual – em um grande número de jurisdições”, diz ela. “Isso não é liberdade de expressão, é apenas um espaço sem lei que tem impacto negativo na sociedade.”

Devido à postura flagrantemente indiferente do Telegram à moderação de conteúdo, a França tem um caso mais forte contra Durov, que, de forma um tanto misteriosa, se tornou cidadão francês em agosto de 2021.

Anupam Chander, professor de direito e tecnologia na Universidade de Georgetown, diz que há a possibilidade de que o próprio Telegram estivesse se beneficiando de algumas das atividades ilegais apontadas pelas autoridades francesas. “Posso entender que os promotores estejam aproveitando a oportunidade para buscar justiça contra alguém que acreditam ser cúmplice de crimes”, diz ele.

Durov agora enfrentará um dilema que pode ter consequências profundas para o futuro de sua empresa. Ele pode ceder às exigências para moderar mais seriamente o conteúdo e, assim, evitar a prisão. Mas corre o risco de perder a base de 950 milhões de usuários do Telegram.

“Se o Telegram começar a priorizar a moderação e a colaboração com os estados, vai comprometer o núcleo que atrai alguns de seus usuários”, diz Yevgeniy Golovchenko, professor assistente da Universidade de Copenhague. Se escolher resistir diante de uma investigação criminal, Durov pode acabar na prisão, prejudicando o aplicativo de qualquer maneira.

É o caso de um único indivíduo e um único aplicativo, mas é a história da sobrevivência do Telegram. “O que estamos vendo é uma luta global pelo Telegram”, acrescenta Golovchenko. Qualquer que seja o resultado, vai estabelecer um precedente que ecoará muito além desta única luta.


SOBRE O AUTOR

Chris Stokel-Walker é um jornalista britânico com trabalhos publicados regularmente em veículos, como Wired, The Economist e Insider saiba mais