Threads avança rápido, mas ainda não é hora de decretar a morte do Twitter

Independentemente de quantas pessoas decidam abandonar o Twitter, criar uma comunidade em outra plataforma é uma empreitada difícil

Crédito: Julio Lopez/ Unsplash

Casey Fiesler 4 minutos de leitura

No dia 1º de julho de 2023, o Twitter tomou a decisão de limitar o número de tuítes que os usuários podem ver em um dia. Essa foi mais uma de uma série de mudanças que levou milhões de pessoas a procurar plataformas alternativas de microblogging.

Desde quando Elon Musk adquiriu o Twitter, no ano passado, além de um aumento nos números do Mastodon, pequenas plataformas existentes têm ganhado impulso e novas empresas, como Spoutible e Spill, estão sendo criadas.

Mais recentemente, a Bluesky, plataforma de microblogging apoiada pelo fundador do Twitter, Jack Dorsey, assistiu a um aumento de inscrições nos dias seguintes à entrada em vigor da regra limitante do Twitter.

A Meta, por sua vez, lançou o Threads em 5 de julho. Logo em seu primeiro dia, conquistou 30 milhões de usuários (no fechamento desta matéria, já contava com 100 milhões). Mesmo tipos muito diferentes de mídia social, como o TikTok, estão se beneficiando disso que muitos descrevem como o fim iminente do Twitter.

Como um cientista da informação que estuda comunidades online, essa história toda me deu uma sensação de déjà vu. As plataformas de mídia social não duram para sempre. Dependendo da sua idade e seus hábitos online, provavelmente há alguma plataforma que deixou saudades, mesmo que ela ainda exista de algum modo. É o caso do MySpace, do Google+ e do Vine, por exemplo.

Quando as plataformas de mídia social entram em decadência ou encerram suas atividades, às vezes as comunidades online que haviam construído seus lares por ali desaparecem. Mas, às vezes, elas fazem as malas e se mudam para um novo lar.

A turbulência no Twitter está fazendo com que muitos usuários considerem deixar a plataforma. Pesquisas sobre migrações anteriores de plataformas de mídia social indicam o que pode estar por vir para os usuários do Twitter que estão debandando. 

Vários anos atrás, liderei um projeto de pesquisa  em que mapeamos as migrações de plataforma de quase duas mil pessoas durante um período de quase duas décadas. O tipo de comunidade que examinamos foi o fandom transformacional – fãs de séries e franquias literárias e de cultura popular que criam arte usando esses personagens e cenários.

Escolhemos essas comunidades porque elas prosperaram em vários espaços online diferentes. Algumas das mesmas pessoas que escreveram fanfics de "Buffy, a Caça-Vampiros" na Usenet na década de 1990 estavam escrevendo fanfics de Harry Potter no LiveJournal nos anos 2000 e fanfics de Star Wars no Tumblr na década de 2010.

Ao perguntar aos participantes sobre suas experiências ao passar por essas plataformas – por que saíram, por que ingressaram e os desafios que enfrentaram ao fazê-lo –, obtivemos informações sobre os fatores que podem levar ao sucesso ou ao fracasso das plataformas, bem como quais são as prováveis consequências negativas para uma comunidade quando ela se muda.

"VOCÊ VAI PRIMEIRO"

Independentemente de quantas pessoas decidirem deixar o Twitter no fim das contas – e até mesmo de quantas pessoas vão abandoná-lo ao mesmo tempo – criar uma comunidade em outra plataforma é uma batalha difícil. Essas migrações são, em grande parte, impulsionadas por efeitos de rede, o que significa que o valor de uma nova plataforma depende de quem mais está por lá.

Mesmo que haja um preço a pagar por deixar uma plataforma, as comunidades cultivadas ali podem ser incrivelmente resilientes.

Os estágios iniciais da migração são os mais críticos. As pessoas precisam se coordenar para incentivar a contribuição na nova plataforma, o que é realmente difícil de conseguir.

Torna-se, como descreveu um dos nossos participantes, um verdadeiro “maria-vai-com-as-outras”, em que ninguém quer sair até que os amigos decidam ir embora, e ninguém quer ser o primeiro a migrar por medo de ficar sozinho em um novo lugar.

Por esse motivo, a “morte” de uma plataforma – seja devido a uma controvérsia, a mudanças desagradáveis ou à competição – tende a ser um processo lento e gradual.

LAÇOS QUE UNEM

Nossa pesquisa também apontou para recomendações de design para dar suporte à migração e como uma plataforma pode aproveitar o desgaste de outra.

Os recursos de postagem cruzada podem ser importantes, porque muitas pessoas querem apostar no novo, mas mantendo certa segurança. Muitos não se sentem dispostos a cortar os laços de uma vez só, mas experimentariam uma nova plataforma caso o mesmo conteúdo pudesse ser compartilhado em ambas.

Crédito: Mastodon

As formas de importar redes de outra plataforma também ajudam a manter as comunidades. Por exemplo, existem várias maneiras de encontrar no Mastodon as pessoas que o usuário segue no Twitter. Mesmo mensagens simples de boas-vindas, guias para recém-chegados e maneiras fáceis de encontrar outros migrantes podem fazer a diferença para ajudar as tentativas de "reassentamento".

Nesse sentido, o Threads tem uma vantagem sobre outras alternativas ao Twitter, porque os usuários se cadastram por meio de suas contas do Instagram. Isso significa que o gráfico social do Threads – quem segue quem – é inicializado por links entre as contas do Instagram. Os usuários podem até não conseguir transpor facilmente suas comunidades do Twitter, mas podem aproveitar os seguidores do Instagram.

Mesmo que haja um preço a pagar por deixar uma plataforma, as comunidades cultivadas ali podem ser incrivelmente resilientes. Como aconteceu com os usuários do LiveJournal que analisamos em nosso estudo e que se reencontraram no Tumblr, o destino dos “tuiteiros” pode não estar necessariamente vinculado ao do Twitter.

Este artigo foi publicado originalmente no The Conversation e reproduzido sob licença Creative Commons. Leia o artigo original.


SOBRE O AUTOR

Casey Fiesler é professor associado de ciência da informação na Universidade do Colorado. saiba mais