Vape para tratar enxaqueca e asma? Estas empresas garantem que funciona

Essas farmacêuticas não têm associação com a indústria do tabaco, embora alguns de seus principais executivos tenham vindo desse setor

Créditos: Freepik/ Klipartz

Emma Rumney 4 minutos de leitura

Algumas empresas norte-americanas enxergam o potencial no uso de dispositivos semelhantes a vapes para aliviar enxaquecas e doenças respiratórias, como a asma. Mas é claro que elas têm um longo caminho pela frente para convencer as autoridades de saúde e os pacientes de que seus produtos podem ser o futuro da administração de medicamentos por inalação.

Duas empresas, a Qnovia e a MIIST Therapeutics, desenvolveram dispositivos semelhantes a vapes com base na tecnologia usada nos nebulizadores médicos, que transformam medicamentos líquidos em um vapor leve.

Outra empresa, a Greentank, afirma ter desenvolvido uma maneira de vaporizar substâncias por meio de um chip de aquecimento que resolve os problemas de segurança dos vapes atuais e talvez possa oferecer uma maneira melhor de tratar doenças como enxaqueca.

As empresas e os especialistas afirmam que a inalação pode aliviar a dor em segundos, com menos efeitos colaterais do que os comprimidos. Mas vender dispositivos semelhantes a vapes na área médica, em meio a preocupações crescentes sobre seus impactos na saúde, será uma tarefa muito difícil.

A princípio, a Qnovia e a MIIST vão lançar seus produtos como tratamentos de terapia de reposição de nicotina (NRT, na sigla em inglês) apenas com prescrição médica, enquanto a Greentank tem como objetivo inicial o uso de seu chip de aquecimento em vapes recreativos de cannabis e nicotina.

O objetivo final das empresas é que seus dispositivos forneçam uma ampla variedade de medicamentos. Douglas Dunlap, diretor comercial da Greentank, cita como exemplo os remédios para enxaqueca.

Um método comum de administrar o tratamento da enxaqueca é por meio de um comprimido, que leva até uma hora para fazer efeito enquanto a pessoa pode apresentar sintomas como vômito e tontura. "Se pudéssemos encurtar esse tempo, seria um grande sucesso ", diz Dunlap, ex-executivo da marca de vape JUUL.

Três bilhões de pessoas no mundo sofrem de enxaqueca, de acordo com a Organização Mundial da Saúde. Centenas de milhões têm doenças como asma ou doenças pulmonares, tratadas com medicamentos inalatórios. Somente a empresa farmacêutica GSK gerou quase US$ 8,9 bilhões de receita com medicamentos respiratórios em 2023.

PREOCUPAÇÕES COM A SAÚDE

Os dispositivos de administração de medicamentos inalatórios existentes são incômodos e difíceis de operar e, por isso, tendem a ser usados de forma incorreta, diz Federico Buonocore, professor da Universidade de Kingston, na Grã-Bretanha, que se dedica à administração de medicamentos pulmonares alternativos. Um design semelhante a um vaporizador poderia resolver esses problemas, ele acredita.

As grandes empresas de tabaco já tentaram, mas não conseguiram entrar nesse mercado, e seus esforços foram marcados pela desconfiança e pela oposição das autoridades de saúde. A Philip Morris abandonou a meta de obter mais de US$ 1 bilhão em receita anual até 2025 com sua unidade de bem-estar e saúde.

Crédito: Qnovia

O CEO Jacek Olczak diz que a empresa foi "otimista demais sobre como o ambiente externo aceitaria... a indústria do tabaco" se envolver em outros setores além da nicotina. Um novo tipo de aspirina inalável desenvolvido pela unidade também foi considerado malsucedido após um teste clínico no ano passado.

A Qnovia e a MIIST são empresas farmacêuticas e não estão associadas à Big Tobacco, embora alguns de seus principais executivos tenham vindo desse setor. De acordo com o CEO da Qnovia, Brian Quigley, ex-chefe da gigante do tabaco Altria, a empresa planeja apresentar pedidos de registro de medicamentos nos EUA em breve e no Reino Unido em 2026 para seu dispositivo para reposição de nicotina e lançar um teste clínico em setembro.

Segundo a OMS, os vapes podem produzir substâncias químicas nocivas e seus impactos de longo prazo são desconhecidos.

A MIIST também precisa obter aprovações regulatórias. O teste clínico de Fase 1 revelou que seu dispositivo poderia aliviar o desejo por cigarro mais rápido do que outros NRTs aprovados, como adesivos e gomas – claramente ineficazes para ajudar os fumantes a parar de fumar.

A Greentank, fundada em 2015 com o intuito de fabricar hardware para vaporizadores, verá o primeiro vape de cannabis dos EUA usando sua tecnologia ser lançado em setembro, pela empresa Jaunty. A Greentank está procurando um parceiro farmacêutico para apoiar o desenvolvimento de seu chip de aquecimento para administração de medicamentos.

O fundador da MIIST, Dalton Signor, disse que tem esperança de que o dispositivo da empresa possa um dia ser usado para administrar medicamentos como alívio da dor e da ansiedade. Entretanto, um grande desafio é garantir que dispositivos como o da MIIST não sejam confundidos com os vapes convencionais – objeto de crescentes preocupações com a saúde.

    Autoridades como a Organização Mundial da Saúde afirmam que os vapes podem produzir substâncias químicas nocivas, como formaldeído e metais pesados, e seus impactos de longo prazo são desconhecidos.

    Buonocore pesquisou o uso de cigarros eletrônicos como dispositivos de administração de medicamentos. "A primeira coisa que todos me disseram foi: 'mas não é errado usar esse dispositivo como um equipamento médico?'", diz ele. "Superar esse estigma será muito difícil para o setor."


    SOBRE A AUTORA

    Emma Rumney é repórter da agência Reuters. saiba mais