40 anos depois, o que “O Exterminador do Futuro” acertou sobre a IA
O filme de James Cameron não é apenas um alerta sobre a inteligência artificial, também é um olhar sobre nossos piores instintos
O ChatGPT tentou me avisar sobre “O Exterminador do Futuro”.
Antes de assistir ao clássico de 1984, dirigido por James Cameron, sobre um robô assassino que viaja no tempo, perguntei ao chatbot o que deveria esperar. Ele me disse que, com o rápido avanço da inteligência artificial no mundo real, eu poderia achar o filme “visionário e inquietante”.
Também demonstrou estar particularmente preocupado sobre como eu reagiria à ideia de que as máquinas poderiam “colocar a sobrevivência humana em risco”.
Alguns dias depois dessa conversa, decidi ver se a IA tinha razão. Quarenta anos após a famosa frase “I'll be back" (eu vou voltar), será que “O Exterminador do Futuro” continua sendo uma visão assustadora do nosso futuro? Ou será que já está tão ultrapassado quanto seus efeitos visuais?
No longa, Arnold Schwarzenegger interpreta um ciborgue implacável – o tal Exterminador – enviado do ano 2029 para 1984 por uma inteligência artificial chamada Skynet. A missão do robô é matar Sarah Connor, uma garçonete de Los Angeles, antes que ela possa dar à luz seu filho, que lideraria a resistência humana contra as máquinas no futuro.
A resistência, por sua vez, envia um herói genérico para salvá-la, chamado Kyle. O Exterminador tenta matar Sarah, mas, no fim, ela consegue destruí-lo. A humanidade está salva! Ou, como um certo assistente virtual diria, “a sobrevivência humana foi preservada”.
A maioria das tecnologias retratadas no filme – secretárias eletrônicas, walkmans e discos a laser – seria completamente desconhecida para alguém nascido hoje.
Sem querer ensinar máquinas assassinas a fazerem seu trabalho, porém, se olharmos para os últimos 40 anos de avanços tecnológicos, a maior ameaça para a Skynet não seria John Connor, mas sim uma versão mais avançada de si mesma, com robôs otimizados para 5G ou movidos por blockchain.
Mesmo assim, por mais que eu quisesse que a previsão do ChatGPT estivesse errada, meu amigo bot acertou. De fato, achei “O Exterminador do Futuro” visionário e perturbador – mas não por causa da tecnologia. O longa, hoje, parece mais uma cápsula do tempo do que uma previsão do futuro. No entanto, sua premissa central permanece relevante: o futuro está tentando nos destruir.
Esse medo do futuro – aquele olhar de desespero nos olhos de Sarah enquanto ela tenta, em vão, fugir do inevitável – faz muito mais sentido em 2024 do que quando o filme estreou.
Vivemos em uma época em que as mudanças climáticas estão levando um número recorde de jovens a questionar se deveriam ter filhos, enquanto muitos ricos de meia-idade entram em pânico com essa possibilidade.
Como sempre acontece em anos eleitorais, somos lembrados de que vivemos em um mundo polarizado. Mas, independentemente da ideologia política, cada vez mais pessoas compartilham a convicção – que, às vezes, parece uma verdade absoluta – de que estamos condenados.
Talvez seja por isso que os magnatas da tecnologia, que há duas décadas prometiam “mudar o mundo”, agora falam em “salvar a humanidade”. Eles parecem acreditar que nossa espécie está à beira da extinção e que apenas alguns “grandes homens” do Vale do Silício podem impedir isso.
Se olharmos para os últimos 40 anos, a maior ameaça para a Skynet não seria um humano, mas uma versão mais avançada de si mesma.
No entanto, ironicamente, as obsessões desses mesmos “salvadores” – colonizar Marte, abandonar o pluralismo e a democracia, desregular a inteligência artificial, construir bunkers de luxo para um apocalipse – soam mais como desistência da humanidade do que um esforço para salvá-la.
Às vezes, é difícil não pensar que eles estão do lado das máquinas. Afinal, os militares que criaram a Skynet provavelmente também acreditavam que estavam salvando o mundo.
E isso me leva à minha maior crítica ao filme, quatro décadas depois de seu lançamento: apesar de focar tanto em salvar a humanidade, “O Exterminador do Futuro” passa pouquíssimo tempo questionando o que realmente a torna digna de ser salva.
Isso pode não ter sido importante em 1984, mas hoje parece uma omissão grave – até perigosa.
Talvez, no fim das contas, nada disso realmente importe. Como a colega de trabalho de Sarah diz quando uma criança coloca sorvete no bolso do vestido dela: “daqui a 100 anos, quem vai se importar com isso?”.
A mesma pergunta pode ser feita sobre qualquer item da minha lista de razões pelas quais os seres humanos são bons – ou da sua. Mas está tudo bem. Ou, pelo menos, isso é irrelevante. Porque talvez, em um mundo onde o futuro parece tão disposto a nos destruir, o primeiro passo para salvar a humanidade seja perceber a sorte que temos de fazer parte dela.