A nova interface “liquid glass” da Apple é tão ambiciosa quanto a própria Apple

A empresa acaba de anunciar sua maior reformulação visual em uma década. E talvez leve esse mesmo tempo para sabermos se ela realmente vale a pena

Créditos: Apple/ Freepik

Mark Wilson 4 minutos de leitura

A Apple está chamando a mudança visual – que a empresa anunciou esta semana – de sua maior transformação até hoje. A partir de meados de setembro, iOS, macOS, iPadOS e watchOS passarão a ter, pela primeira vez, um design unificado: o liquid glass (algo como "vidro líquido").

Apresentado durante a WWDCa conferência anual da Apple para desenvolvedores, que termina nesta sexta-feira, dia 13 –, o liquid glass é uma repaginação sofisticada da interface dos sistemas da empresa. Ele mantém todos os recursos já existentes e a experiência de uso de centenas de milhões de pessoas acostumadas com os seus aparelhos.

O que esse novo visual pode se tornar no futuro ainda é uma incógnita. Na prática, é uma nova base de design, com potencial para ser tão ousada quanto a Apple decidir torná-la.

A proposta central é substituir as tradicionais janelas e barras opacas por uma interface translúcida, parecida com vidro. Tudo – do dock de aplicativos e controles do Apple Music à barra de endereços do Safari, o relógio e os widgets – passará a ter algum nível de transparência.

As mudanças mais marcantes aparecem na nova lente de aumento e no controle deslizante, que agora parecem flutuar sobre a tela e distorcer o que está atrás, como uma gota d’água. As demais alterações são mais sutis: ao virar o telefone, por exemplo, os ícones refletem a luz nas bordas, como se fossem objetos reais.

É impossível não perceber uma dualidade nessa nova interface: por um lado, ela chama atenção com animações e efeitos visuais impressionantes; por outro, por ser translúcida, a intenção é justamente desaparecer para destacar o conteúdo – suas fotos, papéis de parede e tudo mais que aparece na tela.

COMO É A EXPERIÊNCIA COM O LIQUID GLASS

Tive a oportunidade de ver o liquid glass em ação em diversos dispositivos. No geral, o visual é bonito. Mas ele se mistura com o fundo quando o conteúdo é muito colorido – como capas de álbuns no Apple Music, por exemplo.

Nesses casos, a Apple contorna a situação alternando entre os modos claro e escuro, como se fosse uma lente fotossensível. Funciona, mas parece uma solução para um problema que ela mesma criou. Em outros casos, como ao usar teclado no iPad, ter de volta uma parte da tela é uma grande vantagem – com menos “caixas” limitando tudo.

Crédito: Apple

Talvez a descrição mais precisa tenha vindo do próprio Craig Federighi, vice-presidente sênior de engenharia de software da Apple. Durante a apresentação na WWDC, ele destacou que a transparência faz a tela parecer maior. E é verdade.

O novo visual transforma qualquer parte da interface em algo próximo da Dynamic Island do iPhone: em vez de cortar a tela com linhas retas, os elementos flutuam, como bolhas que se expandem ou encolhem conforme necessário. No Safari, por exemplo, a experiência agora é de uma navegação em tela cheia, com uma barra de endereços translúcida e flutuante. 

Pode parecer um grande esforço para oferecer um pouco mais de espaço útil. Mas, depois de se acostumar com uma tela que parece maior, é difícil voltar atrás. Isso ajuda a explicar por que os celulares continuam aumentando de tamanho. Depois de ganhar mais um milímetro de tela só com software, imagino que voltar ao visual antigo faria com que tudo parecesse espremido na tela.

Crédito: Apple

PARA ONDE O LIQUID GLASS PODE NOS LEVAR?

O problema do liquid glass, por enquanto, é que – além de alguns truques visuais – ele não traz nada de realmente novo. Na prática, é apenas uma atualização estética. Um visual repaginado, sem mudanças reais na forma como usamos os aparelhos.

No entanto, segundo a Apple, essa era a intenção desde o início: apresentar um design novo, mas familiar. Uma forma de fazer a transição para uma nova linguagem visual sem mudar a rotina de ninguém.

Crédito: Apple

O que realmente importa talvez seja o que o liquid glass pode viabilizar a longo prazo. O conceito funciona como uma metáfora visual pronta para abraçar novas tecnologias, como inteligência artificial e realidade mista. É fácil imaginar essa estética sendo usada em interfaces generativas, por exemplo.

Nesse aspecto, o liquid glass parece ser uma aposta bem planejada. Ele está estabelecendo as bases para as muitas possibilidades que vão surgir ao longo da próxima década. Mas, por enquanto, só o que percebemos é uma leve sensação de que a tela ficou um pouco maior.

Nova interface liquid glass dos dispositivos Apple
Crédito: Apple

A verdade é que ainda não dá para avaliar o impacto do liquid glass – e talvez nem dê quando ele for lançado oficialmente. É uma metáfora visual que a Apple criou, mas ainda não explorou de verdade.

Com concorrentes como a Meta avançando rápido, talvez ela nem consiga manter esse conceito só para si. Só daqui a dois ou cinco anos saberemos se esse “vidro mágico” realmente nos levou a algum lugar novo. Nesse sentido, o liquid glass é também um reflexo do que é a Apple.


SOBRE O AUTOR

Mark Wilson é redator sênior da Fast Company. Escreve sobre design, tecnologia e cultura há quase 15 anos. saiba mais