As palavras que definem o ano de 2025: um retrato do caos digital
Termos escolhidos por dicionários internacionais revelam um ano marcado por falsas conexões, desinformação e IA desenfreada

Todos os anos, editores de publicações que vão do Dicionário de Oxford ao Dicionário Macquarie de Inglês da Austrália escolhem a palavra do ano.
Às vezes, esses termos seguem uma linha temática, especialmente após eventos que mudam o mundo. “Pandemia”, “lockdown” e “coronavírus”, por exemplo, estiveram entre as palavras escolhidas em 2020. Em outras ocasiões, formam um mosaico de tendências culturais diversas, como ocorreu em 2022 com permacrise e gaslighting.
A lista deste ano gira, principalmente, em torno da vida digital. Mas, em vez de refletir o otimismo ilimitado da internet dos anos 2000 – quando termos como blog, tuíte e até o emoji de “rosto chorando de rir” () ganharam destaque –, as escolhas de 2025 refletem um desconforto crescente diante de como a internet se tornou um ambiente propício à artificialidade e à manipulação.
VER PARA CRER JÁ ERA
Um comitê do Dicionário Macquarie selecionou AI slop (algo como "lixo de IA") como a palavra do ano. O dicionário define o termo como “conteúdo de baixa qualidade criado por IA generativa, frequentemente contendo erros e sem ter sido solicitado pelo usuário”.

O AI slop pode ir de uma imagem "fofinha" de uma menina abraçando seu cachorrinho até conselhos profissionais no LinkedIn. Muitas vezes, esse material viraliza à medida que usuários desavisados compartilham vídeos, textos e gráficos gerados por computador.
A manipulação de imagens existe desde o início da fotografia. Mais tarde, a técnica evoluiu com a ajuda da IA, dando origem aos deepfakes, que permitem transformar imagens reais em vídeos surreais. O que diferencia o AI slop é a criação de imagens e vídeos do zero, apenas fornecendo um prompt a um chatbot – independentemente de quão bizarra seja a solicitação ou o resultado.
MEU NOVO AMIGO, O CHATGPT
Os editores do Dicionário Cambridge escolheram parasocial. O termo é definido como “relacionado a uma conexão que alguém sente com uma pessoa famosa que não conhece, com um personagem de livro, filme ou série… ou com uma inteligência artificial”.
Essas relações assimétricas, segundo o editor-chefe do dicionário, resultam da “fascinação do público por celebridades e seus estilos de vida”, um interesse que “continua atingindo novos patamares”.
O anúncio citou como exemplo o noivado da cantora Taylor Swift com o jogador de futebol americano Travis Kelce, que provocou um pico de buscas online pelo significado da palavra. Muitos fãs reagiram com alegria irrestrita, como se a melhor amiga tivesse decidido se casar.
Mas relações parasociais podem seguir caminhos estranhos, ou até sombrios, quando o objeto de afeto é um chatbot. Há pessoas desenvolvendo sentimentos reais por sistemas de IA, seja como amigos de confiança, seja como parceiros românticos. Muitos jovens já recorrem a IAs generativas como forma de terapia.
MORDENDO A ISCA
A palavra do ano do Oxford Dictionary é rage bait, definida como “conteúdo online deliberadamente criado para provocar raiva ou indignação por ser frustrante, provocativo ou ofensivo, normalmente publicado para aumentar o tráfego ou engajamento em uma página ou rede social”.
É apenas o termo mais recente para formas de manipulação emocional que infestam a internet desde os tempos da conexão discada. Diferentemente de um hot take — uma opinião apressada, mal articulada ou mal fundamentada —, o rage bait tem intenção inflamável. E pode ser visto tanto como causa quanto consequência da polarização política.
Estudos mostram que quem publica rage bait tende a ter baixa empatia e a enxergar as emoções alheias como algo explorável — ou até monetizável. Em resumo, representam o lado mais sombrio da economia da atenção.
Mãos para o alto?
O elemento comum entre essas palavras talvez seja uma atitude que pode ser chamada de niilismo digital.
Com a proliferação de desinformação online, textos e imagens gerados por IA, notícias falsas e teorias conspiratórias, torna-se cada vez mais difícil saber em quem — ou no que — acreditar. O niilismo digital é, em essência, o reconhecimento da falta de sentido e de certeza em nossas interações virtuais. O conjunto de palavras deste ano talvez seja melhor resumido por um único emoji: o do encolher de ombros (路). Levantar as mãos, em resignação ou indiferença, sintetiza a anarquia que parece dominar nossas vidas digitais.