Banir o TikTok não vai resolver os problemas causados pelas redes sociais

Cada ameaça representada pelo aplicativo também tem sido representada pela mídia social baseada nos EUA há mais de uma década

Crédito: Fast Company Brasil

Sara Florini 4 minutos de leitura

Quando o presidente norte-americano Joe Biden assinou um projeto de lei de ajuda externa de US$ 95 bilhões, no final de abril, ele deu início a um prazo de nove meses para que a empresa controladora do TikTok na China, a ByteDance, vendesse o aplicativo. O prazo pode ser estentido por três meses. A empresa indicou que planeja contestar a lei na justiça.

Se a lei for mantida e a empresa não conseguir vender o aplicativo, o TikTok será bloqueado em qualquer loja de aplicativos ou serviço de hospedagem na web dos EUA. Isso afetaria os mais de 170 milhões de usuários do TikTok no país, incluindo 62% dos jovens entre 18 e 29 anos.

Isso também alteraria o cenário de notícias e informações. Ao contrário de seus concorrentes, o TikTok tem aumentado a cada ano a proporção de usuários que buscam notícias regularmente na plataforma. Quase um terço dos norte-americanos com menos de 30 anos usa o TikTok como fonte de notícias.

Os principais argumentos contra o aplicativo ser mantido sob a propriedade da ByteDance incluem o fato de que ele permite a influência estrangeira na opinião pública dos EUA, promove comportamentos prejudiciais entre menores de idade e prejudica a privacidade dos dados dos americanos. No entanto, nenhuma dessas preocupações é nova ou exclusiva do TikTok entre as plataformas de mídia social.

INFLUÊNCIA E PROPAGANDA ESTRANGEIRAS

Os legisladores expressaram preocupação com a possibilidade de o governo chinês influenciar a opinião pública dos EUA e, consequentemente, a política, exercendo controle sobre o conteúdo que os usuários do TikTok veem.

Mas as plataformas de mídia social sediadas nos EUA foram e continuam sendo exploradas por diversos governos estrangeiros, inclusive a China, e seus representantes que as utilizam para tentar influenciar a opinião pública dos EUA. 

A começar por seus esforços para interferir na eleição presidencial de 2016, a inteligência russa tem usado plataformas como Facebook e Twitter (atual X) para esses fins há quase uma década.

Essas campanhas de influência criam e mantêm redes coordenadas entre plataformas. Os pesquisadores afirmam que o Facebook, o Instagram, o X/ Twitter e o YouTube se recusam a fornecer acesso aos dados necessários para rastrear ou impedir tais atividades.

PERIGO PARA MENORES

Alguns legisladores também alertam para o fato de que o TikTok divulga para crianças conteúdo ligado a comportamentos perigosos, como distúrbios alimentares e automutilação. Mas todas as mídias sociais podem oferecer essas ameaças.

Por exemplo, documentos internos vazados de um denunciante revelaram que a Meta sabe desde 2019 que suas plataformas provavelmente estão prejudicando a saúde mental e o bem-estar de menores nos EUA.

A pesquisa interna da empresa descobriu que a plataforma contribuía para problemas de imagem corporal e distúrbios alimentares entre meninas adolescentes e expunha os adolescentes a outros comportamentos prejudiciais, como bullying, abuso de drogas e automutilação.

Atualmente, 41 estados dos EUA e o Distrito de Colúmbia entraram com ações judiciais contra a Meta pelos danos supostamente causados a menores de idade.

Ao mesmo tempo, houve poucos protestos sobre como o tempo gasto nas mídias sociais aumenta a exposição dos jovens a conteúdo baseado em ódio ou que plataformas como o YouTube direcionam os usuários para canais de radicalização.

SEGURANÇA E PRIVACIDADE DE DADOS

Os defensores da lei de venda ou proibição do TikTok também alegam que o aplicativo constitui uma ameaça inaceitável à privacidade dos dados. No entanto, há poucos motivos para acreditar que os dados dos cidadãos estão mais seguros em empresas sediadas nos EUA.

Quase um terço dos norte-americanos com menos de 30 anos usa o TikTok como fonte de notícias.

A Meta teve uma ampla gama de escândalos de vazamento de dados privados. Em 2023, documentos que vazaram mostraram que até os próprios engenheiros da Meta têm um entendimento ou controle mínimo sobre como os dados das pessoas são usados.

Além disso, o governo chinês não precisa controlar o TikTok para acessar os inúmeros dados que aplicativos, dispositivos e aparelhos inteligentes coletam. Muitos desses dados podem ser comprados, de forma totalmente legal, de corretores de dados comerciais, independentemente de quem seja o proprietário.

NECESSIDADE DE REGULAMENTAÇÃO

As preocupações com o TikTok não são infundadas, mas também não são únicas. Cada ameaça representada pelo aplicativo também tem sido representada pela mídia social baseada nos EUA há mais de uma década.

Acredito que os legisladores devem tomar medidas para lidar com os danos causados por empresas locais que buscam lucro, bem como por empresas estrangeiras que praticam espionagem.

A proteção dos norte-americanos não pode ser realizada com a proibição de um único aplicativo. Para realmente proteger seus cidadãos, os legisladores precisariam promulgar uma regulamentação ampla e de longo alcance.

Este artigo foi republicado do The Conversation sob uma licença Creative Commons. Leia o artigo original.


SOBRE A AUTORA

Sara Florini é professora associada de estudos de cinema e mídia na Universidade Estadual do Arizona. saiba mais