Barbie e a indicação ao Oscar: um retrato da polarização nas redes sociais

A indignação em torno das indicações ao prêmio transformou o que deveria ter sido uma vitória em um microcosmo da própria cultura da internet

Crédito: Samuel Ramos/ Unsplash

Joe Berkowitz 4 minutos de leitura

Qualquer pessoa que queira entender como a internet funciona em 2024 só precisa dar uma olhada nas muitas conversas relativas às indicações ao Oscar do filme “Barbie”. Embora talvez fosse preferível não olhar.

O fato de um filme baseado na boneca mais famosa do mundo ter conseguido oito indicações, além de ser o filme de maior bilheteria de 2023 e um sucesso de crítica, provavelmente teria parecido impossível há um ano.

O que deveria ter sido uma “volta olímpica” quando as indicações foram anunciadas logo se transformou em uma avalanche de comentários indignados por conta das indicações que o filme não recebeu.

Alguns argumentos têm mérito; outros parecem mais forçados do que uma boneca toda retorcida. Acalmados os ânimos, temos aqui uma visão abrangente do tumulto pós-indicações – uma amostra perfeita do motivo pelo qual a cultura da internet parece estar sempre em estado de guerra.

O ARGUMENTO ÓBVIO

O mundo pós-moderno de Barbie é dividido entre o mundo real e Barbieland, onde o patriarcado não existe. A tensão entre essas duas realidades é o argumento central do filme, junto com a maior parte da crítica social nele embutida – algo que, novamente, teria sido surpreendente de se ler há um ano em referência a um filme sobre Barbie.

O fato de o protagonista masculino, Ryan Gosling, ter recebido uma indicação por sua atuação como Ken, o eterno namorado de Barbie, enquanto nem a estrela principal (Margot Robbie) nem a diretora (Greta Gerwig) foram indicadas parece ser uma prova óbvia da tese do filme.

Crédito: Warner Bros

Mas essa visão não leva em conta que Gosling desempenhou o papel mais chamativo, mais cômico – e que foi realocado para a categoria de coadjuvante, onde tinha melhores chances, mesmo que Ken seja de fato o protagonista masculino.

No entanto, seria necessário um grande contorcionismo de ideias para fingir não entender por que muitos dos apoiadores do filme estavam entusiasmados com a possibilidade da indicação aos prêmios principais.

CONSOLO VIRA CONFLITO

Apesar da ausência de Margot Robbie na disputa pelo prêmio de melhor atriz e de Greta Gerwig pelo de melhor diretora, o caso tem aspectos positivos. As oito indicações do filme são um reflexo da excelente colaboração da dupla e, como coprodutoras, ambas podem receber troféus se “Barbie” conseguir conquistar uma improvável vitória como melhor filme.

Tecnicamente, Robbie e Gerwig não foram "esnobadas", pois compartilham uma indicação para uma premiação separada. Além disso, a cineasta de “Anatomia de Uma Queda”, Justine Triet, foi indicada a melhor direção, sugerindo que Hollywood não ignora totalmente as mulheres ao conceder prêmios nesta categoria (apenas a maioria delas).

Em vez de apresentar esses pontos como um "lado positivo", os comentaristas nas redes sociais os usaram para argumentar que a não indicação não tinha nada a ver com sexismo e que qualquer um que achasse isso não estava pensando o suficiente.

Antigamente, levava um tempo para que a reação contrária à reação contrária se manifestasse em conversas desse tipo. Agora, acontece instantaneamente.

OLHANDO ALÉM DE BARBIE

No caso da polêmica envolvendo “Barbie” e as indicações ao Oscar, muita gente sentiu que era uma situação de tudo ou nada. Observadores de redes sociais e criadores de conteúdo adotaram uma postura do tipo "por que estamos irritados com Barbie quando tal coisa está acontecendo?".

A “tal coisa”, em alguns casos, referia-se a eventos mundiais. Em outros, significava outros aspectos da premiação, como a histórica primeira indicação de um nativo americano (Lily Gladstone, por “Assassinos da Lua das Flores”) e uma indicação surpresa para America Ferrera (melhor atriz coadjuvante) por seu papel em “Barbie”.

Crédito: Warner Bros

Mas, embora os eventos mundiais em questão mereçam, sem dúvida, atenção constante, não há limite de largura de banda para o número de tópicos de conversa permitidos online, e Gladstone passará muito tempo sob os holofotes rumo a uma possível vitória.

Muita gente estava cansada das intermináveis discussões sobre Barbie bem antes de as indicações serem anunciadas. Mas as vibrações tóxicas do burburinho que se seguiu tornaram o momento perfeito para expressar isso em voz alta.

"Barbie é ruim. Pronto, eu disse", diz a manchete de um editorial do “The New York Times” em resposta à agitação nas redes sociais.

Muitas personalidades de prestígio revelaram ser da mesma opinião, loucas para informar ao mundo que não gostaram do "comercial de brinquedo" – como se essa crítica não fosse algo que Gerwig e o co-roteirista Noah Baumbach tivessem antecipado e incorporado ao filme.

Embora pessoalmente tenha considerado Barbie uma resposta divertida, engraçada e ponderada a uma proposta criativa impossivelmente desafiadora, entendo a inclinação a deixar tudo isso para lá nessa altura dos acontecimentos.


SOBRE O AUTOR

Joe Berkowitz é colunista de opinião da Fast Company. saiba mais