Bilionários da tecnologia inspiraram heróis de filmes. Agora, inspiram vilões
Elon Musk e outros grandes executivos do Vale do Silício parecem ter se tornado uma referência direta para vilões do cinema

Recentemente, assisti ao novo filme do Super-Homem, dirigido por James Gunn, e não consegui parar de pensar: Nicholas Hoult claramente se inspirou em Elon Musk para o papel de Lex Luthor. Aquele sorriso constante lembra muito o CEO da Tesla.
Mas não era só o sorriso. O Luthor vivido por Hoult também tinha outras características que muitos – inclusive eu – associam a Musk: um certo complexo de salvador e a necessidade de ser admirado. Sem contar que, no filme, o vilão é um bilionário da tecnologia, com contratos importantes com o governo e bastante influência sobre ele.
Curiosamente, em um teste de polígrafo feito como brincadeira pela revista “Vanity Fair”, Hoult disse ao ator David Corenswet (que interpreta o Super-Homem) que não se inspirou em Musk para construir o personagem.
Corenswet comentou que Hoult queria fazer de Luthor “o mais ‘alfa’ possível” e perguntou se ele tinha escutado algum podcast de “machos alfa” para se preparar para o papel.

Hoult respondeu que não, mas que ouviu o audiolivro sobre Elon Musk – “não que eu tenha me inspirado nele, só achei interessante”. Mas o ator não especificou se falava da biografia escrita por Walter Isaacson em 2023 ou da não oficial, assinada por Ashlee Vance em 2015.
Ainda assim, é difícil não notar as semelhanças entre Musk e o arqui-inimigo do Super-Homem. E esse não é o primeiro caso de vilões com paralelos como esse – sejam eles intencionais ou não. Nos últimos anos, bilionários do Vale do Silício parecem ter se tornado os modelos perfeitos para vilões do cinema. Mas nem sempre foi assim.
MUSK SERVIU DE INSPIRAÇÃO PARA TONY STARK
Antes de Robert Downey Jr. dar vida a Tony Stark em “Homem de Ferro”, de 2008, poucos fora do mundo dos quadrinhos conheciam o personagem. Mas graças à sua atuação marcante, o herói se tornou um ícone da cultura pop e deu início ao Universo Cinematográfico da Marvel, que já rendeu bilhões de dólares à Disney ao longo dos últimos 17 anos.
No filme, Stark é um bilionário carismático, brilhante e um tanto arrogante, que usa sua fortuna e seu talento para a tecnologia para tornar o mundo um lugar melhor. Essa versão do personagem foi fortemente inspirada em Elon Musk. Em uma entrevista de 2022 à “New York Magazine”, o roteirista Mark Fergus confirmou que Musk foi uma das principais referências para o herói.

Com o sucesso do primeiro longa, veio a sequência: “Homem de Ferro 2”, em 2010. O próprio Elon Musk fez uma ponta no filme, em uma festa em Mônaco, onde é elogiado por Stark pelos motores da SpaceX. Mas muita coisa mudou desde os anos 2000 – na política, na cultura e na imagem pública de Musk.
AGORA, OS BILIONÁRIOS DA TECNOLOGIA SÃO OS VILÕES
Hoje, as grandes empresas de tecnologia são vistas por muitos como corporações que colocam seus interesses e lucros acima do bem comum.
Gigantes do comércio eletrônico esmagam pequenos negócios, redes sociais estimulam comportamentos tóxicos com seus algoritmos e empresas de inteligência artificial estão tão atreladas ao poder e ao governo que é impossível não se preocupar com os rumos disso tudo.

Com essa mudança na percepção pública sobre as big techs, os CEOs à frente delas também passaram a ser vistos com outros olhos. E ninguém representa isso melhor que Elon Musk, que se envolve ativamente em assuntos políticos e diplomáticos como nenhum outro executivo.
Tudo isso contribuiu – e com razão – para uma crescente desconfiança da sociedade em relação à indústria da tecnologia e seus líderes. E, de repente, esses mesmos líderes se tornaram uma fonte de inspiração para os novos vilões do cinema.

É difícil assistir “O Círculo” (“The Circle”, 2017) e não ver paralelos entre o maléfico CEO da empresa de mídia social interpretado por Tom Hanks e o CEO da Meta, Mark Zuckerberg. Dois filmes de 2022 – “Glass onion: um mistério knives out” e “Jurrasic World: Domínio” parecem ter baseado seus vilões, respectivamente, em Elon Muske e no CEO da Apple, Tim Cook.
Nenhum diretor ou ator afirmou abertamente que esses personagens foram inspirados em CEOs específicos. No caso de “Glass Onion”, por exemplo, o diretor Rian Johnson negou que Miles Bron (interpretado por Edward Norton) tenha sido baseado em Musk – embora a semelhança tenha chamado a atenção de muita gente.

“Foi só uma coincidência infeliz”, disse Johnson à revista “Wired”. Ao mesmo tempo, admitiu: “tem muita coisa nesse arquétipo de bilionário da tecnologia que entrou no roteiro”. E completou: “acabou ficando estranhamente atual”.
Essa “estranha atualidade” já dura alguns anos. E como mostra o novo filme do Super-Homem, o público está mais do que preparado para ver CEOs de tecnologia como os vilões da vez – mesmo que os personagens não sejam cópias exatas de ninguém.
Com essa tendência cada vez mais presente, é bem provável que esse tipo de personagem continue surgindo nos filmes – pelo menos até o dia em que os grandes executivos do Vale do Silício se tornarem donos de todos os estúdios.


