Como evitar novas ondas de demissão na indústria de tecnologia

As empresas precisam começar a tomar decisões estratégicas sobre a criação de funções e contratações, a começar pelo primeiro funcionário

Crédito: rawpixel.com

Tigran Sloyan 5 minutos de leitura

Estamos todos com medo, e deveríamos estar. Milhares de pessoas em nossa indústria perderam seus empregos e outras muitas podem estar correndo esse risco. Mas não é surpresa, algo inédito, ou qualquer outra coisa senão o mesmo ciclo de arrogância que empresas com alto crescimento vivenciam há anos.

As demissões ocorrem aparentemente a cada um ou dois anos, depois que grandes empresas de tecnologia, como a Tesla (20192018), a Cisco (201920162014) e a Microsoft (2017201620152014), além de startups como a Better, de repente percebem que aumentaram demais o número de contratações ou administraram mal suas operações e, portanto, precisam tomar “decisões difíceis” que resultam em um enorme custo humano.

As demissões também são ruins para a empresa. Um artigo da Harvard Business Review levantou dois estudos, um mostrando que a demissão de 1% dos funcionários leva a um aumento de 31% no número de pessoas que deixam a empresa voluntariamente; e outro apontando que aqueles que não são demitidos têm em média 20% de queda no desempenho e de 41% na satisfação no trabalho.

Às vezes, demissões são necessárias. No entanto, esse grande número que estamos vendo sugere um comportamento de manada ou uma total falta de estratégia na contratação.

É sempre o mesmo: o setor de tecnologia vê um boom de novos investimentos – às vezes em torno de uma determinada indústria (como vemos hoje em relação às criptomoedas) – e presumem que nada de ruim vai acontecer novamente. Mas, invariavelmente, acontece.

QUEM FAZ O QUÊ

Conforme as empresas crescem, o mesmo acontece com financiamento, contratações e demissões, repetindo um ciclo que causa prejuízos para os trabalhadores. Já aqueles que não foram capazes de avaliar e aproveitar estrategicamente o talento na organização costumam sair ilesos.

O setor de tecnologia vê um boom de investimentos e presume que nada de ruim vai acontecer. Mas, invariavelmente, acontece.

Minha teoria é que falta uma gestão ponderada e equilibrada, começando pela criação de uma determinada função na empresa. Pelo que essa função é responsável e quem é o profissional ideal para ela? Quais habilidades são necessárias e, principalmente, como avaliá-las?

Uma vez que o profissional (ainda hipotético) é contratado, que medidas são tomadas para avaliar seu talento, seu potencial de crescimento e sua produção real?

Muitas das demissões insensíveis e frias que vimos recentemente são um sintoma da falha em criar funções específicas e identificar o candidato ideal. Quando decidimos contratar alguém, devemos considerar não só como isso contribui para a própria organização, mas também qual é o papel dessa função e como ela pode crescer junto com o profissional que a desempenha.

O pior é que grande parte das empresas passaram a terceirizar os processos de contratação – cerca de 40% das empresas norte-americanas, de acordo com pesquisa da Korn Ferry –, o que significa que profissionais cujas funções não são totalmente essenciais são contratados com o mesmo nível de descaso.

O resultado disso é uma péssima cultura corporativa antitrabalhador, na qual as pessoas são contratadas com base em sua capacidade de responder corretamente às perguntas de um software de recrutamento, o que contribui para a falta de diversidade.

A dispensa de 1% dos funcionários leva a um aumento de 31% no número de pessoas que pedem demissão.

Elas são contratadas por ter algumas características desejáveis – culturalmente ou não – para funções que podem não ser necessárias quando a empresa enfrenta tempos difíceis. Investiram tanto em metodologias de “startup enxuta” e outros conceitos, mas normalmente ainda falham em avaliar a função, como ela contribui e quem se encaixa melhor nela.

O que precisamos é de um novo sistema para talentos em tecnologia, que exija que as empresas sejam bem mais ponderadas em relação à estrutura e ao processo de contratação, e de outro que avalie (e incentive) o talento dos trabalhadores.

UMA NOVA ESTRUTURA

Quando uma função é criada em uma startup, especialmente no início, você descobre que, na verdade, ela engloba outras oito ou nove. É fácil perder o rumo nessa hora e acreditar que as coisas “simplesmente se resolverão” ou que você “lidará com elas quando a empresa crescer”.

Na realidade, é preciso começar a tomar decisões estratégicas sobre a criação de funções e seu processo de contratação, começando pelo funcionário. Se há um acúmulo de funções, reflita sobre com o que contribuem e trace um plano para, enfim, designá-las a outra pessoa.

Também precisamos pensar além dos currículos o máximo que pudermos e criar um modelo para avaliar o talento de um candidato e seu potencial desde o primeiro dia.

Uma pessoa não é um objeto estático que cresce deforma linear. Por exemplo, alguém que é ótimo em um tipo de trabalho – que tem um talento nato para aquela função específica – deve se tornar professor e ajudar a avaliar futuras funções e contratações.

entender os requisitos para o sucesso da empresa e do funcionário é uma maneira segura de contratar e reter os melhores talentos.

Isso inclui (mas não se limita a) como as empresas avaliam candidatos para uma função. Um exercício que simule uma situação ou atividade faria sentido? E uma avaliação de habilidades? Ou talvez uma análise de cada cargo a ser preenchido, identificando os conhecimentos, habilidades e outras características necessárias?

Embora possa parecer óbvio, entender os requisitos exatos para o sucesso da empresa e do funcionário é uma maneira segura de contratar e reter os melhores talentos na indústria tech.

Para ser sincero, o processo de recrutamento não deveria ser terceirizado se a empresa tiver menos de mil funcionários. Não se trata do custo, mas do fato de que alguém de fora provavelmente não compreende as nuances por trás da criação de uma função, tampouco saberia identificar o candidato mais adequado.

Os envolvidos no processo de contratação não deveriam ser apenas os profissionais de recursos humanos, mas também as pessoas que trabalham naquela função para a qual você está contratando.

Um sistema em que os trabalhadores são contratados com base em uma análise criteriosa, para uma função que é avaliada de forma justa e transparente, visando o próprio crescimento dentro da empresa, resulta em menos demissões e sofrimento humano.


SOBRE O AUTOR

Tigran Sloyan é cofundador e CEO da CodeSignal. saiba mais