Como funciona o Discord, rede onde vazaram documentos do Pentágono

Os servidores são parecidos com os das antigas salas de bate-papo. Eles terão os mesmos problemas e oportunidades das comunidades online anteriores

Créditos: Ella Don/ Alexander Shatov/ Unsplash

Bryanna Dym 4 minutos de leitura

Em 14 de abril de 2023, o Departamento de Justiça dos Estados Unidos acusou Jack Teixeira, um membro da Guarda Aérea Nacional de Massachusetts, de 21 anos, de retenção e transmissão não autorizadas de informações de defesa nacional e de documentos ou materiais classificados como sigilosos.

Relatos da mídia sugerem que Teixeira não pretendia vazar os documentos, mas sim compartilhá-los em uma comunidade fechada do Discord focada em jogar games de guerra. Só que alguns acabaram sendo compartilhados com outra comunidade do Discord, essa sim com um número maior de seguidores. A partir daí, eles foram amplamente divulgados.

Mas o que é o Discord? É preciso mesmo se preocupar com o que as pessoas estão encontrando por lá?

Quando foi lançado, em 2015, muitos videogames não tinham um chat de voz ao vivo para os jogadores conversarem enquanto jogavam – ou cobravam taxas premium sobre o serviço.

O Discord era um aplicativo que permitia bate-papo por voz e texto em tempo real, para que amigos pudessem se unir para superar um obstáculo ou apenas conversar enquanto exploravam o mundo do jogo. As pessoas ainda o usam para isso, mas hoje a maior parte da atividade acontece em comunidades mais amplas.

CONTROLE PARENTAL E DISCURSO DE ÓDIO

O Discord entrou no meu radar pela primeira vez em 2017, quando um conhecido me pediu para ingressar em um grupo de apoio a escritores. Os usuários podem configurar suas próprias comunidades – chamadas de servidores – com links compartilháveis para ingressar e escolher se o servidor é público ou privado.

As pessoas no servidor dos escritores rapidamente perceberam que alguns dos membros da comunidade eram adolescentes com menos de 18 anos. O proprietário do servidor manteve o espaço apenas para convidados, mas evitou dizer “não” a qualquer um que solicitasse acesso. Era para ser uma comunidade de apoio para pessoas que trabalham em projetos de escrita. Por que excluir alguém?

Ele não queria expulsar os adolescentes, mas conseguiu fazer alguns ajustes usando o sistema de moderação do servidor do Discord. Os membros da comunidade tinham que revelar sua idade, e qualquer pessoa com menos de 18 anos recebia uma “identificação” especial que os marcava como menores de idade.

Embora tenhamos cuidado em construir um espaço seguro para adolescentes, ainda existem perigos em aplicativos como o Discord.

Essa função os impedia de acessar canais que marcamos como “não seguros”. Alguns dos escritores estavam trabalhando em romances explícitos e não queriam solicitar feedback de adolescentes. E, muitas vezes, os adultos só queriam ter seu próprio espaço.

Embora tenhamos cuidado em construir um espaço online seguro para adolescentes, ainda existem perigos em aplicativos como o Discord. A plataforma é criticada pela falta de ferramentas de controle dos pais. Os termos de serviço afirmam que ninguém com menos de 13 anos deve se inscrever, mas muitos usam a plataforma mesmo assim.

Além disso, há pessoas que usam o Discord para organizar e incentivar discursos de ódio, incluindo ideologias neonazistas. Ou usam a plataforma para traficar pornografia infantil.

No entanto, a Discord afirma que esse tipo de atividade é ilegal e indesejável e que a empresa bane regularmente servidores e usuários que perpetuem esses danos.

OPÇÕES DE SEGURANÇA

Todos os servidores do Discord dos quais eu participei desde então têm alguma proteção contra jovens e contra conteúdo impróprio. Quer se trate de canais com restrição de idade ou simplesmente da proibição de menores em determinados servidores, as comunidades do Discord de que participo compartilham uma preocupação maior em manter os jovens seguros na internet.

as pessoas usam servidores para formar espaços fechados e coesos, protegidos do caos público do Twitter e menos visíveis para o mundo online em geral.

Ao contrário de muitas plataformas populares de mídia social, os servidores do Discord geralmente funcionam como comunidades fechadas, sendo necessários convites para ingressar. Também existem grandes servidores abertos, frequentados por milhões de usuários, mas o design do Discord integra ferramentas de moderação para manter a ordem.

Por exemplo, um criador de servidor tem controle rígido de quem tem acesso ao quê e de quais permissões cada membro do servidor pode ter para enviar, excluir ou gerenciar mensagens. Além disso, o Discord permite que os membros da comunidade adicionem automações a um servidor, monitorando continuamente a atividade para impor os padrões de moderação.

Com essas proteções, as pessoas usam servidores para formar espaços fechados e coesos, protegidos do caos público do Twitter e menos visíveis para o mundo online em geral. Isso pode ser positivo, mantendo os espaços mais seguros de agressores, trolls e de propagadores de desinformação.

Os servidores do Discord não são as primeiras comunidades fechadas na internet. Eles são, essencialmente, iguais às salas de bate-papo da velha guarda, aos blogs privados e às listas de e-mail com curadoria. E eles terão os mesmos problemas e oportunidades dessas comunidades online de outrora

DISCUSSÃO SOBRE AUTOPROTEÇÃO

Na minha opinião, a solução para esse problema não é necessariamente proibir práticas específicas ou regulamentar empresas de internet. A pesquisa sobre a segurança online dos jovens revela que a regulamentação governamental voltada para a proteção de menores nas mídias sociais raramente tem o resultado desejado e, geralmente, resulta em privação e isolamento dos jovens.

Assim como os pais e outros adultos da família ensinam às crianças sobre como reconhecer situações perigosas no mundo físico, falar sobre interações saudáveis pode ajudar os jovens a se protegerem no mundo online.

Este artigo foi republicado de The Conversation  sob uma licença Creative Commons. Leia o artigo original.


SOBRE A AUTORA

Brianna Dym é professora de ciência da computação na Universidade do Maine. saiba mais