Só faltava essa: um aplicativo que gera pontuação fake em apps de fitness

Site cria percursos e estatísticas falsas – desafiando os limites entre exercício de verdade e aparência nas redes

mãos aparecem digitando em celular com aplicativo de fitness
Créditos: Jacob Ammentorp Lund/ Getty Images/ Riane Zuur/ Unsplash

Eve Upton-Clark 2 minutos de leitura

“Não acredite em nada. Nem mesmo nos treinos que as pessoas postam.”

A frase, que aparece em um post viral no X/ Twitter, acompanha um vídeo de um site capaz de gerar percursos de corrida ou ciclismo que depois podem ser publicados em plataformas como Strava ou Maprunner – sem que o usuário precise sequer sair de casa. “Insano. Odeio e amo ao mesmo tempo. Trabalho genial”, comentou o autor da postagem.

O site em questão se chama Fake My Run e foi criado por Arthur Bouffard, de 26 anos. Em entrevista ao “The New York Times”, ele descreveu a ferramenta como “um avanço tecnológico para os preguiçosos”.

O usuário pode desenhar ou escolher uma rota no mapa, definir o ritmo, a data e o horário de início e até adicionar dados de frequência cardíaca. Depois, é só dar um nome para o treino, escrever uma descrição e baixar o resumo da atividade – tudo por apenas US$ 0,42 por arquivo.

Se isso parece absurdo, é porque essa é exatamente a proposta. “É como trapacear jogando paciência”, brincou um usuário no X/ Twitter. Bouffard, que também é corredor, diz ter criado o Fake My Run como uma resposta à forma como a cultura da corrida vem se transformando.

“Correr sempre foi algo pessoal – um jeito de se desafiar, cuidar da saúde física e mental, manter a forma, competir, conhecer novos lugares, e por aí vai”, escreveu ele em uma postagem na mesma rede. “Mas, nos últimos anos, percebi que correr virou um símbolo de status, uma forma de mostrar um estilo de vida.”

E o interesse pelo esporte só aumenta. Segundo a Running USA, o número de participantes em clubes de corrida nos Estados Unidos cresceu 25% nos últimos cinco anos. Há, inclusive, quem coloque o tempo de maratona no currículo.

Hoje em dia, se você não posta seus cinco quilômetros no Instagram ou no Strava, será que correu mesmo? Você correria uma maratona se soubesse que nunca poderia contar para ninguém?

Bouffard cita casos ainda mais extremos: as chamadas “mulas do Strava” – pessoas que cobram entre US$ 10 e 20 para registrar treinos falsos para outros usuários em busca de likes e elogios.

“Assim como acontece nas redes sociais, os posts sobre corrida também podem ser inventados. O Fake My Run surgiu justamente para provocar essa reflexão sobre os rumos que a cultura da corrida está tomando”, explicou.

Apesar de Bouffard insistir que tudo não passa de uma brincadeira com fins educativos, os aplicativos de fitness não acharam graça. Um porta-voz do Strava disse ao “The New York Times” que a plataforma “já tomou providências para remover atividades falsas e banir contas que usam o Fake My Run”.

Desde que foi lançado, o site recebeu mais de 200 mil visitantes e cerca de 500 pessoas já compraram tokens para gerar treinos falsos. Portanto, na próxima vez que alguém bater um recorde pessoal no Strava, talvez seja melhor olhar com um pouco de desconfiança.


SOBRE A AUTORA

Eve Upton-Clark é jornalista especializada em cultura digital e sociedade. saiba mais