Feeds criados por algoritmos decretam a morte do tempo nas redes sociais

Enquanto os usuários do Threads reclamam da falta de postagens recentes em seus feeds, as redes sociais estão cada vez mais dominadas pelos algoritmos

Crédito: Freepik

Joe Berkowitz 4 minutos de leitura

Quando abro o Threads, frequentemente vejo postagens de estranhos de dois dias atrás, que o aplicativo me mostra porque os perfis que sigo responderam a eles no dia anterior. Convenhamos, isso não é exatamente o ideal.

“Esta postagem de dois dias atrás está, sem ironia, quase do topo do meu feed”, publicou o repórter Brian Stelter no Threads em abril, com uma captura de tela que dizia: “adoro abrir este aplicativo e ver sobre o que as pessoas estavam falando há dois dias”.

Atualmente, um dos tipos de posts mais comuns na tentativa da Meta de criar um “app que vai acabar com o Twitter” são aqueles reclamando ou zombando do famoso atraso de vários dias entre o momento em que as postagens são publicadas no aplicativo e quando são vistas.

Mas a experiência no Threads é apenas uma versão exagerada do que vemos em qualquer plataforma de mídia social em 2024. A visível falta de publicações atuais é mais um sintoma da lenta e agonizante morte da internet cronológica.

Tudo começou com o Facebook, que lançou seu feed de notícias com curadoria de algoritmo há 13 anos. Como na maioria das atualizações naquela época, os usuários se revoltaram em um primeiro momento, mas acabaram aceitando. Nos anos seguintes, Instagram, Twitter e LinkedIn seguiram o exemplo.

Até que o sucesso do algoritmo do TikTok despertou inveja em todas as outras plataformas. Agora, como diz o jornalista Mark Wilson, da Fast Company, “nossa internet virou um grande feed personalizado”.

O Threads foi lançado em julho do ano passado com um feed puramente algorítmico, antes de introduzir uma opção alternativa devido à grande demanda. Assim como seu principal concorrente, o Twitter (atual X), ele agora permite que os usuários alternem entre a aba “Para você”, com curadoria de um algoritmo, e uma versão da aba “Seguindo”, que segue a ordem cronológica clássica.

A diferença entre as duas redes, no entanto, é que a plataforma da Meta direciona os usuários para a página “Para você” de forma mais agressiva. O X às vezes alterna entre os dois feeds, mas o Threads sempre retorna os usuários ao feed algorítmico e adiciona o trabalho extra de ter que clicar no logotipo da rede para que a opção “Seguindo” apareça.

A visível falta de publicações atuais é mais um sintoma da lenta e agonizante morte da internet cronológica.

Os usuários já suspeitavam que este atrito adicional era destinado a tornar a nova rede um site menos focado em notícias políticas do que seu principal rival bem antes de o CEO do Instagram, Adam Mosseri, confirmar, em fevereiro, que o Threads evita recomendar conteúdo político.

Considerando o quanto a reputação do X caiu desde que Elon Musk assumiu o controle, a Meta parece sensata em diferenciar claramente sua plataforma do modelo tradicionalmente voltado para notícias. Mas isso vem às custas de perder muitas conversas relevantes em tempo real.

Como o nome “Para você” deixa claro, a opção algorítmica é sempre apresentada como benéfica ao usuário. O principal argumento é que, às vezes, podemos não saber – ou estar dispostos a admitir para nós mesmos – o que realmente queremos ver nas redes sociais até que um algoritmo treinado com base no nosso comportamento nos sirva em uma bandeja de prata digital. Não as notícias, piadas ou insights mais recentes, é claro, mas uma safra de postagens com a maior probabilidade estatística de nos agradar.

No entanto, os feeds algorítmicos falham nos muitos momentos em que a atualidade é o fator mais importante. Quando algo como um eclipse solar acontece, a única coisa mais inútil do que ver as pessoas enlouquecerem com isso bem depois de já termos seguido em frente com nossas vidas, é qualquer outra postagem que o algoritmo tenha mostrado em vez disso durante aquele momento.

Nossa capacidade de acompanhar o que está sendo falado é constantemente eclipsada por conteúdos mais “significativos”. Claramente, o objetivo não é melhorar a experiência do usuário, mas simplesmente prolongá-la.

REDES SOCIAIS MENOS ENVOLVENTES

No ano passado, a Meta revelou os resultados de um estudo de dois anos que basicamente comprovou que a maioria dos adultos prefere feeds algorítmicos. Pode ser tentador considerar estes resultados como uma prova definitiva, mas a indústria de aplicativos que capitalizam a atenção sugere que é menos uma questão de preferência e mais de uma atração irresistível.

O que provavelmente seria mais saudável para os usuários seria ter o feed cronológico como a opção padrão, de forma que pudessem escolher se querem abrir mão dele, em vez de tê-los descartados automaticamente.

A única grande plataforma que continua usando o feed cronológico como padrão é o Bluesky, que também oferece duas abas algorítmicas – “Discover” (descubra) e “Popular With Friends” (popular entre seus amigos), além da opção de fazer listas personalizadas que filtram os perfis que os usuários querem ver com menos frequência. Mas não há pessoas suficientes lá para atestar sua superioridade.

É compreensível que as empresas queiram otimizar seus produtos para que sejam usados o máximo possível. É assim que o capitalismo funciona. Só gostaria que fossem mais honestas sobre suas motivações, em vez de fingirem que são movidas por um desejo altruísta de dar às pessoas o que elas querem.


SOBRE O AUTOR

Joe Berkowitz é colunista de opinião da Fast Company. saiba mais