Um modelo disruptivo vai pegar de surpresa empresas de capital de risco

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Meu primeiro emprego nos Estados Unidos, após me formar em administração, foi na empresa de consultoria do professor Clayton Christensen, da Harvard Business School. Christensen, que cunhou a teoria da inovação disruptiva, foi um dos pensadores de negócios mais influentes do nosso tempo. Os CEOs o procuravam para ajudar a identificar as inovações em potencial em suas áreas de atuação, bem como a integrá-las em seus negócios. Logo, ele decidiu abrir uma empresa de consultoria, e eu fiz parte da equipe.

Aprender com Christensen foi uma das experiências mais transformadoras da minha vida. Nosso trabalho era identificar e, às vezes, criar ondas de inovação disruptiva em uma ampla variedade de negócios, habilidade que exerci rotineiramente como operadora, fundadora e agora gestora de fundos de capital de risco.

Aliás, de todas as expressões usadas à exaustão no capital de risco, “inovação disruptiva” é uma das mais mal empregadas e mal compreendidas. Muitos a usam para se referir a qualquer grande salto tecnológico ou grande inovação nos negócios. Mas, na realidade, ela é um processo específico, previsível e replicável.

Em meados da década de 1990, enquanto estudava setores industriais como aço e drives de disco, Christensen descobriu que os líderes de categoria (ou operadores históricos) são incentivados a atender apenas o “topo do mercado” – seus clientes mais lucrativos – com produtos melhores, com mais funcionalidades e atendimento personalizado. Ao fazer isso, eles ignoram o resto do mercado (ou seja, clientes que ficariam satisfeitos com um produto mais simples).

Como gestora de fundos, minha hipótese é que o setor já está em processo de ruptura.

Quando os operadores se concentram em atender apenas o topo, acabam abrindo caminho para outros capturarem a parte inferior do mercado. Com o tempo, eles tornam-se cada vez melhores, mais sofisticados e, eventualmente, tomam o lugar de quem opera exclusivamente com maiores retornos. Esse processo é o que Christensen chamou de inovação disruptiva.

Trata-se de um fenômeno que não discrimina; pode acontecer com qualquer um, em qualquer setor. Christensen escreveu um famoso estudo de caso sobre a ruptura iminente da Harvard Business School e lecionou sobre o tema em sua aula na própria universidade, para grande desgosto do reitor.

Como gestora de fundos, em um momento recorde do capital de risco, minha hipótese é que o setor já está em processo de ruptura.

CICLO DE INVESTIMENTO E RETORNO

Para identificar a inovação disruptiva iminente, é importante ficar de olho em quatro agentes: os titulares, os clientes no topo do mercado, os clientes na base e os operadores que oferecem produtos mais simples, fáceis, baratos e acessíveis.

As empresas tradicionais de capital de risco construíram seu modelo de negócios para encontrar, reter e atender aqueles que acreditam serem seus clientes mais lucrativos: startups que correspondem a esse padrão, aquelas que acreditam que alcançarão os maiores resultados. “Acreditar” é a palavra-chave aqui. Há um ciclo lento de feedback no capital de risco entre investimento e retorno, então as empresas fazem uma análise para determinar quais consideram ser os investimentos mais lucrativos no futuro.

E como opera esse modelo de negócios? Com tomada de decisão rápida, rodadas enormes, termos amigáveis ​​e diligência mínima para que a empresa possa obter o dinheiro rapidamente. O pós-investimento se dá da mesma forma que a angariação de fundos, recrutamento, relações públicas, desenvolvimento executivo e de negócios internos.

Pense em todas as vantagens que vêm com uma rodada liderada por Andreessen Horowitz, ou um investimento da Y Combinator. As vantagens associadas a um titular de capital de risco são realmente incríveis, porém, são acessíveis apenas ao “topo do mercado” – parcela que corresponde ao padrão histórico de investimentos mais lucrativos.

Empresas tradicionais de capital de risco construíram seu modelo de negócios para atender quem acreditam ser os clientes mais lucrativos.

À medida que os fundos tradicionais se concentram em servir a essa fatia do mercado, eles acabam ignorando aqueles que acreditam ser “a base”. Aqueles que não atendem a um certo padrão, que estão acostumados a se aventurar sem ajuda e que conseguem fazer muito com pouco. Tudo o que eles precisam é de uma chance de ter uma boa troca com outros investidores. O que vier além disso é lucro.

RUPTURA IMPULSIONADA PELO DESCASO

Não é preciso ir muito longe para encontrá-los. Centenas de gerentes emergentes como eu estão levantando fundos menores e investindo naqueles que foram ignorados pelas empresas de capital de risco tradicionais e em ferramentas como o equity crowdfunding, da Republic, e os roll-up vehicles, da AngelList, que permitem assumir o controle das próprias rodadas e levantar quantias menores.

Todos esses pequenos fundos e ferramentas de angariação não parecem ameaçar as empresas de capital de risco tradicionais, da mesma forma que aqueles que foram negligenciados não parecem lucrativos para elas. Nenhuma das partes corresponde ao padrão que acreditam valer a pena. Essa percepção nos indica o começo de uma ruptura, impulsionada pelo descaso.

Administro um fundo pre-seed de US$ 10 milhões que investe exclusivamente em empresas fundadas por mulheres. Sei que muitos dos mais poderosos descartam fundos como o meu. Eles nos veem de forma arrogante, apenas como uma tendência passageira de diversidade. Mas, com isso, acabam perdendo uma grande oportunidade.

Eu invisto em segmentos negligenciados do mercado de capital de risco. Trabalhar com Christensen me ensinou a entender como a história se desenrola. E sei exatamente qual lado ele escolheria.


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