Indústria nacional de café investe para atender novas demandas do consumidor

Crédito: Nestlé/ Divulgação

Fábio Cardo 6 minutos de leitura

Café é um produto presente em praticamente todos os lares do país. A recorrência do consumo é enorme, de acordo com informações da Associação Brasileira de Café (ABIC) e de executivos da indústria com quem conversamos para mapear as perspectivas de mercado no país, para compor a quarta e última matéria da série “Mercado de Café”.

O café solúvel sempre teve pouca expressão no consumo nacional, comparado com o torrado e moído – algo em torno de 5% do consumo total. O grosso da produção é vendido para o mundo todo, o que nos posiciona como maiores exportadores mundiais.

Mas o quadro do consumo nacional deve melhorar. Nos últimos anos, foram lançadas diversas marcas de solúvel usando grãos de melhor qualidade, compondo com a variedade arábica – inclusive de origens definidas – para atender às novas demandas de consumidores que buscam cafés de melhor qualidade. A melhora na qualidade permitiu que a indústria trabalhasse junto à Associação Brasileira de Café Solúvel (ABICS) na criação de um selo de qualidade, algo que era exclusivo para os cafés torrados e moídos.

Grãos plantados na Chapada Diamantina, região reconhecida pela qualidade da produção (Crédito: Nani Rodrigues/ Nestlé)

NESCAFÉ COM NOVA FÓRMULA

Um bom exemplo é a Nestlé, que desenvolveu, ao longo de três anos, uma nova linha de solúveis para atender o público. A empresa realizou, junto ao consumidor, um processo de transição entre o Nescafé tradicional e os de melhor qualidade.

O público precisava de uma ponte entre o produto com que estava acostumado e os novos, explica Taissara Martins, gerente de marketing e sustentabilidade de cafés da Nestlé. Os substitutos são novas composições de cafés, com torra e processo de secagem que resultam em novas intensidades de aromas e sabores.

Segundo Taissara, o período da pandemia colaborou para que os consumidores buscassem melhor qualidade nos alimentos. As pessoas em casa consumiram mais e ficaram mais atentas sobre como o café é produzido, além de buscarem a melhor forma de preparo. “Praticamente, consumiram o café num ritual de autocuidado, tempo de pausa e reflexão sobre o momento. Virou um comfort food”, comenta a gerente.

Taissara Martins, da Nestlé

Para atender essa demanda, a empresa lançou a linha Nescafé Origens do Brasil, nas variedades torrado e moído e solúvel. O café vem de regiões produtoras reconhecidas pela qualidade: Chapada Diamantina (BA), São Sebastião do Paraíso e serras do Alto Paranaíba (ambos em MG). Decorridos três anos, a empresa está feliz com os resultados, garante Taissara.

“PREMIUNIZAÇÃO” DO SETOR

Seguindo a mesma tendência, Susana Hernández, diretora de marketing da Jacobs Douwe Egberts (JDE), aponta que esse é um mercado que tem grande relevância para a companhia. “Durante os últimos anos, lançamos produtos com diferentes tipos de torra, aroma e sabor que se encaixam na rotina dos brasileiros”, comenta.

Para ela, o brasileiro é um consumidor exigente, que busca cafés com qualidade superior, aromáticos e que apresentem inovações e tecnologias. Ele quer um produto que se encaixe em sua rotina e que proporcione novas experiências de consumo. A marca Pilão, por exemplo, lançou a linha Cafeteria, com blends de qualidade superior que levam a experiência de cafeteria para casa.

A tendência é que os grãos passem por um processo rigoroso de seleção e torra para resultar em cafés sofisticados em termos de aroma, sabor e acidez.

“A JDE entende que a tendência de mercado atual é a ‘premiunização’ do setor, ou seja, os grãos passam por um processo rigoroso de seleção e torra para resultar em cafés sofisticados em termos de aroma, sabor e acidez, oferecendo inúmeras experiências de consumo”, explica Susana.

A marca L’OR é pioneira no segmento no Brasil, oferecendo blends requintados e com qualidade premium. A linha L’OR Origens conta com blends exclusivos com aromas das regiões do Sul de Minas, Cerrado Mineiro e Mogiana, que se destacam pelas notas florais e o aroma frutado, o sabor doce, as notas de chocolate e a doçura natural. A marca L’OR Torras chega ao mercado com selo Café Gourmet da ABIC.

QUALIDADE X PRATICIDADE

A Camil, uma das maiores empresas de alimentos do país, também entrou pesado no setor ao adquirir a marca Café União, com foco no café tradicional e extraforte, onde está a maior fatia de consumo no país. A empresa informa que o investimento total em cafés, considerando o que já foi aplicado na aquisição de todas as marcas e da fábrica, somado aos investimentos que ainda serão realizados para ampliação da capacidade de produção e os valores previstos para publicidade e marketing do Café União, totalizarão R $250 milhões.

“Lançamos recentemente a versão Tradicional, para quem prefere um café com aroma e sabor marcantes, e a Extraforte, para aqueles que preferem um aroma e sabor mais intensos. Temos também as marcas regionais Seleto, Bom Dia e Sul de Minas que foram adquiridas no ano passado, com foco no mercado de café torrado e moído”, explica Luciano Quartiero, diretor-presidente da Camil Alimentos.

O executivo destaca que o café gourmet e o em cápsulas têm ganhado representatividade ao longo dos anos, por conta de consumidores que buscam uma experiência única de aroma e sabor. Já o café solúvel é procurado por quem busca praticidade.

“Entendemos que estes são mercados importantes por atender perfis de consumo diferentes. Temos interesse em atuar nestes segmentos em breve”, adianta Quartiero.

ATITUDE SUSTENTÁVEL

Existem muitos pontos sensíveis na cultura do café quanto à sustentabilidade. De início, é uma das culturas agrícolas que mais consomem água, fator crítico nas questões ambientais. Quando se fala em cafés especiais, com diversas particularidades em termos de terreno, cultivo e perfil de produtores de pequeno porte que atuam com o produto, cresce a relevância dos trabalhos das indústrias no sentido de criar boas condições de produção.

A Nestlé mantém o programa Cultivado com Respeito desde 2011, atuando com agricultura regenerativa. Hoje, as linhas Nescafé e Nespresso atuam juntas em iniciativas que visam melhorar a produtividade, reduzindo os impactos ambientais.

Cultivo de café no Espírito Santo (Crédito: Nani Rodrigues/ Nestlé)

O trabalho é realizado em 1,1 mil fazendas, diagnosticando os processos produtivos. A empresa mantém, em 35 fazendas, um projeto piloto para que as práticas resultem em impactos positivos, isto é, a cultura deve devolver ao meio ambiente mais do que retira.

Entre as iniciativas, a empresa destaca seis prioritárias: cobertura de solo, garantindo o ecossistema proteção aos insetos e micronutrientes; reflorestamento nos cafezais, com recuperação de áreas degradadas; promoção à biodiversidade com insetos polinizadores (ter abelhas por perto pode dobrar a produção); desenvolvimento de variedades mais resistentes com o suporte tecnológico; uso racional de água, com reutilização e armazenamento de água de chuva; e ações de equilíbrio de remuneração dos produtores e times de trato e colheita.


SOBRE O AUTOR

Fábio Cardo é economista de formação, atua em comunicação empresarial e empreendedorismo e é co-publisher do canal FoodTech da Fast Co... saiba mais