Jantar em Marte: como a agricultura espacial vai transformar a comida da Terra
Um sistema alimentar marciano sustentável é possível, mas as inovações devem vir com uma polícia equitativa para haver mudanças duradouras
Poderíamos alimentar uma cidade em Marte? Esta é uma questão central para o futuro da exploração espacial e que também tem sérias repercussões na Terra. Até o momento, muito se pensou sobre como os astronautas comem; no entanto, estamos apenas começando a produzir alimentos no espaço.
Com o desejo crescente de estabelecer uma presença humana no espaço, teremos que pensar na produção de alimentos fora do nosso planeta. Os desafios são vastos, exigindo pesquisas sobre como as plantas respondem a uma variedade de mudanças, incluindo gravidade e radiação.
Como pesquisadores de alimentos e agricultura, exploramos essa questão em nosso último livro, Dinner on Mars (Jantar em Marte, em tradução livre). Acreditamos que um sistema alimentar marciano sustentável é possível – e que, ao desenvolvê-lo, mudaremos os sistemas alimentares da Terra. No entanto, isso exigirá um pensamento inovador.
AGRICULTURA MARCIANA
A base dos sistemas alimentares em Marte envolveria água coletada do solo e cianobactérias, muitas vezes chamadas de algas verde azuladas. Na Terra, as cianobactérias podem ser um grande problema, pois crescem em cursos de água poluídos.
Em Marte, no entanto, as cianobactérias podem usar o dióxido de carbono na atmosfera e crescer no regolito – a camada de rochas soltas e de poeira que cobre o leito rochoso – arenoso e tóxico para produzir as moléculas orgânicas básicas sobre as quais o resto do sistema alimentar se sustentará.
As cianobactérias são capazes de crescer nas condições encontradas em Marte, o que traz o benefício real de neutralizar produtos químicos extremamente tóxicos que estão espalhados por todo o regolito do planeta. Portanto, ter cianobactérias atende ao duplo propósito de neutralizar as toxinas enquanto produz material orgânico.
TECNOLOGIA DE ESTUFA
Uma vez que as bactérias estiverem crescendo tranquilamente sob o céu marciano, fornecerão os nutrientes necessários para sustentar belas colheitas. Uma cidade marciana poderia ser imaginada como um lugar verdejante, com hidroponia e plantações de solo preenchendo túneis, acarpetando crateras abobadadas e crescendo em cada canto não utilizado.
As tecnologias avançadas de estufa (como a agricultura vertical) que criam um ambiente controlado adequado, fornecerão abundantes folhas verdes, vegetais, frutas e culturas especiais, como ervas, café e chocolate. Os carboidratos podem ficar em falta, no entanto, pois eles ocupam áreas muito grandes para serem produzidos.
Todas as plantas em Marte desempenharão papéis importantes na geração de oxigênio, reciclagem de água e fornecimento de matéria-prima orgânica. Essas tecnologias também são valiosas na Terra, pois tentamos encurtar as cadeias de suprimentos e melhorar a disponibilidade de frutas e vegetais saudáveis nos meses de inverno.
REDUZINDO INEFICIÊNCIAS
Imaginar como seria a agricultura em Marte é um projeto
Acreditamos que um sistema alimentar marciano sustentável é possível e que, ao desenvolvê-lo, mudaremos os sistemas alimentares da Terra.
fascinante. Mas é quando pensamos em como essas tecnologias podem afetar a vida na Terra que esse assunto se torna extremamente sério. Isso porque, em Marte, onde cada grama de matéria orgânica, mililitro de água e fóton de energia solar é escasso, não pode haver ineficiências.
Os produtos residuais de uma parte do sistema precisam ser aproveitados como insumos para outra parte – por exemplo, usar as cianobactérias mortas como meio de crescimento para os estágios seguintes da produção de alimentos.
Porém, mais do que as próprias tecnologias, é a mentalidade por trás da tarefa de construir um sistema alimentar marciano que pode mudar a forma como as coisas são feitas aqui na Terra, onde um terço de toda a comida é jogado fora.
Nossa empolgação com as tecnologias alimentares transparece no livro Dinner on Mars, mas não somos tecno-otimistas. A tecnologia não é uma panaceia. Por exemplo, se tecnologias como a agricultura vertical reduzem a necessidade de terras agrícolas, então são necessárias políticas para garantir que o solo não seja apenas pavimentado.
Também precisamos estar atentos aos impactos negativos das tecnologias e ser sensíveis a como os meios de subsistência das pessoas podem precisar mudar e se adaptar. Ajudar a gerenciar essa transição e minimizar as interrupções é outra tarefa importante para a política.
As tecnologias desbloqueadas por Marte, junto com políticas equitativas, podem nos colocar em um caminho muito mais sustentável na Terra.
Este artigo foi republicado de The Conversation sob licença Creative Commons. Leia o artigo original.