Nude quer transformar emissão de carbono em assunto pop
Em apenas cinco meses de operação, a Nude recebeu menção honrosa na última edição do World Changing Ideas, prêmio da Fast Company norte-americana. Fundada por Giovanna Meneghel e Alexander Appel, a foodtech de leite de aveia foi destacada por incluir a pegada de carbono no rótulo do produto.
De acordo com a dupla, a intenção é justamente abrir os olhos do consumidor para o quanto ele também é responsável pelo impacto ambiental. “A gente acredita que precisa ter uma mudança e o cálculo é o início da conscientização”, afirma Giovanna.
Além disso, para eles, trazer essa informação estampada na embalagem é uma ferramenta contra o greenwashing, pois seria uma forma de comunicar com transparência as ações da empresa. A ideia é combinar a educação do consumidor sobre o assunto com a evolução da própria empresa rumo ao status de carbono negativo. A premissa é a de que se a startup nasceu em 2020, não basta que ela se torne carbono neutro em 2030.
Para atingir esse objetivo, Giovanna e Alexander foram descobrir como é feito o cálculo da pegada de carbono: é preciso considerar as emissões de gases equivalentes que provocam o efeito estufa geradas na produção. Então começaram a rastrear todo o trajeto – do plantio da aveia – até a chegada do produto Nude às prateleiras do mercado.
Mas não é tão simples, porque cada item da linha tem uma pegada diferente. A mais básica, que é o leite de aveia “puro”, feito com aveia orgânica, água e sal, registra 0,34 kg CO2e por unidade. Já a versão com cacau orgânico, emite 0,40 kg CO2e por unidade.
Isso significa que, se a empresa vender 10 milhões de litros em cinco anos, terá emitido aproximadamente 3,5 mil toneladas de CO2. Se fosse leite de vaca, o número saltaria para 10.956 toneladas de CO2, segundo um estudo dos pesquisadores Joseph Poore e Thomas Nemecek.
Para compensar a pegada de carbono de seus produtos em 2020 e 2021, a Nude escolheu um projeto de manutenção da Floresta Amazônica, gerenciado pela empresa Amigo do Clima. “Essa foi uma decisão muito importante, porque muitas empresas de neutralização não são confiáveis. Nessa ONG a gente consegue saber como o projeto está sendo feito, dá para rastrear. E eles estão alinhados aos nossos princípios”, diz Giovanna.
AVEIA E A CONCORRÊNCIA
A escolha da aveia como matéria-prima foi uma combinação dos fatores sustentabilidade, sabor e facilidade de acesso. Este último porque a família de Giovanna tem uma fábrica de aveia no Paraná e atua, há muitos anos, como fornecedora para grandes marcas – e, agora, é também provedora da Nude.
Mas a ideia de criar a startup surgiu somente após uma temporada dos fundadores em Berlim. Nos cafés da capital alemã, era comum os baristas sugerirem a troca do leite comum pelo de aveia. Geralmente era o da Oatly, marca que levantou US$ 1,4 bilhão em sua oferta pública inicial, em maio. Principal marca do segmento na Europa, a empresa sueca tem acionistas como Jay-Z, Oprah Winfrey e Howard Schultz, fundador da Starbucks. A rede de cafés, aliás, anunciou em dezembro de 2020 que passará a oferecer leite de aveia em todas as suas lojas nos EUA a partir do segundo semestre de 2020. Hoje, pouco mais de mil lojas da empresa no país já contam com essa alternativa.
Hoje, o leite de origem vegetal que mais vende no mundo é o de amêndoas, mas produzir um único copo demanda uma quantidade de água que descarta essa opção como eco-friendly. E, recentemente, o leite de aveia desbancou o leite de soja e passou a ocupar a segunda opção na preferência dos consumidores.
Alexander explica que, além de a cultura de aveia dispensa irrigação e figurar, portanto, como uma opção sustentável, o valor nutricional, o sabor, mais neutro, e a consistência cremosa fazem com que esse leite seja o melhor complemento para o café, por exemplo.
Por isso que, assim como a Oatly faz nos mercados em que atua, a Nude combina a venda em e-commerce e lojas físicas com a presença em 170 cafés. “O café é um local de experimentação, é algo que a pessoa não faria se estivesse em casa”, explica Alexander. Para integrar o ponto de venda com as cafeterias, algumas embalagens da Nude vêm com um voucher com um QR Code que pode ser recortado e trocado por um capuccino.
ASCENSÃO POP
Principal marca do segmento na Europa, sueca Oatly tem como acionistas celebridades como Jay-Z, Oprah Winfrey, Natalie Portman e Howard Schultz, fundador da Starbucks. A rede de cafés, aliás, anunciou em dezembro de 2020 que passará a oferecer leite de aveia em todas as suas lojas nos EUA a partir do segundo semestre de 2020. Hoje, pouco mais de mil lojas da empresa no país já contam com essa alternativa.
De acordo com o Euromonitor, o mercado de laticínios plant-based na região EMEA alcançou US$ 4 bilhões em valor de varejo no ano passado (isso corresponde a 1,5% da indústria de laticínios como um todo). A projeção é de que o segmento vegetal expanda para US$ 6 bilhões em 2025.
Nas Américas, o setor de laticínios vegetais valia US$ 5 bilhões em 2020 e correspondia a 2,8% da indústria e deve passar a valer US$ 7 bilhões em 2025, alcançando participação de 3,7%.
Mas olhando especificamente a categoria de leite vegetal, a penetração deve passar de 9% em 2020 para 11%. A Oatly ingressou nos EUA em 2017 e tornou-se a marca de leite de aveia mais vendida no país em 2020.
Aqui no Brasil, a Nude quer fazer essa onda crescer com uma pegada pop. A linguagem descontraída no digital vale tanto para temas mais sérios, como o carbono, quanto para dicas de combinação de leite de aveia com outros ingredientes.
O nome tem a intenção de refletir o compromisso com a transparência – não necessariamente tem conotação sensual e definitivamente não tem a ver com a paleta bege: a empresa reflete a variedade de cores nas embalagens dos produtos. “Nosso objetivo é envolver pessoas, trocar ideias, não queremos ser uma marca institucional. Não é só para vegano e nem só para flexitariano. É para todo mundo”, comenta Giovanna.
É fato que o número de vegetarianos declarados no Brasil, maior exportador de carnes do mundo, vem crescendo: de acordo com o Ibope, 30 milhões de brasileiros (14% da população) disseram ser vegetarianos ou veganos em 2018. O número quase dobrou em relação a 2012. A pesquisa aponta que mais da metade dos entrevistados (55%) consumiria mais produtos veganos se estivessem melhor indicados na embalagem ou se tivessem o mesmo preço que os produtos que estão habituados a consumir (60%). A porcentagem sobe para 65% nas capitais.
“É o início de uma curva. Sabemos que não estamos fazendo algo novo, as pessoas já entendem, já sabem do que se trata. Estamos vivendo o início de uma aceleração”, diz Alexander.