O que há por trás dos R$ 11 bilhões em negócios fechados na Agrishow 2022?

Crédito: Fast Company Brasil

Fábio Cardo 7 minutos de leitura

Durante os cinco dias do evento, no final de abril, mais de 800 expositores presentes na Agrishow apresentaram centenas de equipamentos e soluções para o produtor rural, entre os 180 mil visitantes. Havia muito equipamento básico, mecânico, mas o que realmente chamou a atenção foi a diversidade de novos equipamentos conectados e automatizados. As empresas comprovaram que o futuro do agronegócio é baseado em tecnologia digital, software e informações geradas a partir de dados, e bem menos dependentes de equipamentos, hardware.

O momento não podia ser melhor: este foi o primeiro grande evento presencial do setor desde o início da pandemia. As indústrias somaram, neste período, inovações aos seus equipamentos, com motores e estruturas que permitem redução de consumo de combustível, melhor produtividade e manejo. E, o mais importante, incorporaram as inovações em sensores, inteligência artificial, câmeras, telas digitais, conectividade, modems que mapeiam toda a operação. A velocidade de evolução tecnológica durante a pandemia foi expressiva.

A percepção é unânime: os incrementos futuros em produtividade na estrutura dos equipamentos devem ser marginais, comparando com o que a evolução das tecnologias e os dados representarão para o setor. O foco principal deixará de ser o equipamento – tratores, colheitadeiras, semeadeiras – e passará a ser a tecnologia digital que vai captar, registrar e transformar os dados em informações que poderão ser usadas, em tempo real, para ajustar as operações no campo.

A adoção já é democrática: produtores de todos os portes, mesmo os pequenos e de gestão familiar, já têm acesso às tecnologias, muitas gratuitas ou com baixo investimento de entrada, e por vezes se tornam referência para os grandes produtores.

RETOMANDO AS ATIVIDADES

Produtores rurais de todos os portes tiveram a oportunidade de conferir e comparar diversos modelos e marcas de equipamentos, concretizando compras durante o evento com o apoio de instituições de crédito. O Bradesco anunciou resultado de aproximadamente R$ 1,5 bilhão; o Santander fechou R$ 1,3 bilhão; e o Banco do Brasil atingiu R$ 2,1 bilhões de pedidos de crédito. Apenas esses três bancos somam R$ 4,9 bilhões, o equivalente a 43% do valor total anunciado pela organização da feira.

O foco principal passará a ser a tecnologia digital – que vai captar, registrar e transformar dados em informações para ajustar as operações no campo.

Segundo Carlos Aguiar, diretor de agronegócio do Santander, é natural que haja tal crescimento devido às boas safras recentes e à necessidade de atualização dos equipamentos para melhorar a produtividade e a rentabilidade. O cenário de exposição dos equipamentos certamente também ajuda na tomada de decisão.

O resultado pode ainda apontar uma demanda reprimida devido ao período da pandemia. O público do setor aprecia ter contato físico com os equipamentos e poder negociar diretamente com os fabricantes e fornecedores de soluções. Isso talvez indique redução dos negócios no próximo ano, uma vez que a vida útil dos equipamentos é de cerca de 10 anos.

FOCO NAS INOVAÇÕES TECNOLÓGICAS

Os aplicativos desenvolvidos pela Farm Box, InfoRow e My Easy Farm são algumas das soluções de tecnologia apresentadas no evento. O primeiro auxilia o produtor em toda a gestão da lavoura, garantindo mais assertividade nas decisões.

O Info Row já está contratado por cinco dos 10 maiores canavieiros do país para fazer o geomapeamento da área, somando 800 mil hectares. Na mesma linha, a My Easy Farm, plataforma digital francesa, também mapeia o setor canavieiro. Com um aplicativo, ela processa todos os dados do campo: análise do solo, de pragas, dados climáticos, implementos agrícolas etc.

Outro destaque foram os fornecedores de serviços com drones. A XMobots, empresa com tecnologia 100% nacional, desenvolveu seus equipamentos para trabalhar com mapeamento e pulverização. O mapeamento é feito com tomadas fotográficas aéreas, realizando um raio X da área e permitindo encontrar soluções específicas para cada tipo de terreno e cultura. Baseada em São Carlos, a XMobots conta com mais de 60 engenheiros, que vêm desenvolvendo a tecnologia desde 2007.

Thatiana Miloso, gerente comercial da empresa, explica que os drones na cultura de cana conseguem fazer o mapa de falhas de plantio, apontar as restituições da linha para que máquinas não pisoteiem as plantas e até identificar mato no meio da plantação. Nas culturas de soja e de algodão, inclusive, identificam plantas daninhas.

Drone da XMobots faz mapeamento e pulverização (Crédito: Fabio Cardo)

“O uso de drones para pulverização cresceu muito em áreas de 20 até 500 hectares. O importante é que ele não substitui as opções de mercado, é complementar, atuando em áreas de difícil acesso, como a cultura de café em montanha”, explica Thatiana.

O equipamento também é muito útil em períodos e locais onde chove muito e os tratores atolam, ficando impossibilitados de atuar no campo. O uso de drones auxilia ainda na proteção de áreas de conservação ambiental, onde não pode ocorrer pulverização.

Os drones atuam em áreas de difícil acesso, como a cultura de café em montanha, e no monitoramento de áreas de conservação.

A Agro Scout, startup israelense de detecção de pragas, opera com um software com inteligência artificial que utiliza qualquer drone para mapear detalhadamente uma plantação, descobrindo até mesmo um pequeno inseto, seu nome e em que fase de vida ele se encontra.

Outros bons exemplos de empresas com tecnologias inovadores são a Web Jump, empresa de transformação digital que desenvolve lojas virtuais; a Prime Field, que leva integração e conectividade para o campo, com soluções extremamente criativas e eficientes; a AgroBrazil, que tem um app que dá o preço de todo o gado vendido em todo o território nacional, diariamente; e, por fim, a FK Boi Invest, praticamente uma fazenda virtual de criação de gado, mas muito real. A pessoa faz o investimento, eles criam os bois e, quando os animais chegam à idade adulta, entregam e incluem 14% a mais do que foi investido.

AGRO 4.0

Quem vê os imensos equipamentos, alguns com 15 metros de largura e mais de quatro metros de altura, imagina a dificuldade que deve ser pilotar e realizar as operações a que se destinam. Na verdade, todos têm cabines confortáveis, com ar-condicionado, sistema de som, múltiplas telas conectadas com os sensores e câmeras que ficam apontando as melhores opções para semear ou colher, indicam a umidade do solo, compactação do terreno, ponto de colheita, percursos.

Colheitadeira John Deere (Crédito: Fabio Cardo)

Tudo é mapeado e transformado em informações para a tomada de decisão com o apoio de inteligência artificial, IoT (internet das coisas) e integrado com bancos de dados de grandes empresas. O esforço é intelectual, nada braçal.

As informações podem estar disponíveis em tempo real para quem opera, se a área for coberta por redes de dados. A conectividade é ainda o maior entrave para a digitalização do campo num país como o Brasil, com extensas áreas agrícolas e cobertura deficiente. Na pior das hipóteses, todos os dados coletados podem ser baixados quando levados a locais onde há sinal de internet.

FUTURO DO AGRO CONECTADO

A ConectarAgro, associação que reúne 33 empresas fabricantes de equipamentos e operadores de redes, já promoveu a conectividade via banda larga 4G para mais de 7 milhões de hectares em áreas rurais e remotas no Brasil, atingindo 600 mil pessoas e 220 municípios. A entidade lançou no evento o Simulador ConectarAgro, com o objetivo de promover a conectividade e melhorar a produtividade. O aplicativo está disponível no website e seu uso é gratuito.

Gratuidade, aliás, é o padrão das plataformas. John Deere, Climate FieldView, Massey Ferguson, Valtra, Fendt, Jacto, entre outras empresas, oferecem soluções que monitoram e acompanham em tempo real toda a operação das fazendas e dos equipamentos. Especificamente nos dispositivos conectados, os sensores podem prever potenciais falhas de operação e recomendar reparos antes que a máquina quebre e tenha que ficar fora de trabalho.

Um dos principais pilares de todo esse novo cenário do agronegócio é a formação de pessoal qualificado que possa administrar todas as informações e tomar as decisões de operação nos equipamentos. Por isso, algumas empresas estão investindo em educação para formar os profissionais que atendam às novas necessidades do setor.

Os fundadores da Jacto, por exemplo, mantêm uma enorme estrutura educacional, que inclui a Universidade Shunji Nishimura, referência no setor. Oferecem cursos desde ensino fundamental até Big Data no Agronegócio e Mecanização em Agricultura de Precisão, junto com a Fatec localizada no município de Pompéia (SP). Centenas de profissionais foram formados, muitos já saindo com emprego garantido.

Fundação Shunji Nishimura oferece cursos desde ensino fundamental até big data e mecanização no agronegócio (Crédito: Divulgação)

O agro está se transformando rapidamente em um negócio que depende muito de tecnologia. As plataformas de IoT, big data, inteligência artificial compõem as soluções que promoverão aumento de produtividade no campo e maior oferta de alimentos, com redução de uso de insumos, defensivos, combustível, e promovendo melhor qualidade aos alimentos.


SOBRE O AUTOR

Fábio Cardo é economista de formação, atua em comunicação empresarial e empreendedorismo e é co-publisher do canal FoodTech da Fast Co... saiba mais