O que os investimentos em agrifoodtech na Ásia indicam ao Brasil

Financiamentos crescem na Índia e caem na China. Brasil se mantém como principal destino dos recursos para o setor na América Latina

Crédito: Istock

Fábio Cardo 4 minutos de leitura

As empresas de agtech e foodtech no Oriente continuam a atrair muitos investimentos, ainda que o volume total e o destino tenham sido sensivelmente alterados no primeiro semestre de 2022.

A Índia obteve muito capital para operações ligadas à produção de alimentos (downstream), enquanto a China se mantém bem à frente no volume total de investimentos captados, mantendo o foco nas estruturas de logística (upstream) e novos alimentos.

Isso é o que aponta o Asia-Pacific AgriFoodTech Investment Report 2022, que acaba de ser publicado pela AgFunder.

A Índia já ultrapassou a China como o país da região com maior financiamento para agtech e foodtech, fechando US$ 2,7 bilhões no primeiro semestre de 2022 e deve quebrar recordes de financiamento total até o final do ano.

Já o financiamento da China diminuiu significativamente na medida em que os investidores se mantiveram à distância das startups de eGrocery que tiveram expressivos financiamentos em 2021. Na soma do ano passado, a Índia registrou 225 deals (indicando mais capilaridade na distribuição dos investimentos), contra 104 da China.

A Índia obteve capital para operações ligadas à produção de alimentos e a China, para logística e novos alimentos.

Um dos pontos que mais chamam a atenção nos resultados é a redefinição na prioridade de destino de investimentos. A Índia tem perfil muito bom em comparação à China e a outros países da região em termos de localização geográfica e potencial de produção de alimentos.

Soma ainda a boa infraestrutura de tecnologia, que tem inovado com diversas soluções que melhoram a produtividade do campo, na produção de alimentos e na logística. Todos elementos fundamentais para aumentar a produtividade e viabilizar o acesso aos alimentos, necessários para atender sua expressiva população.

Há uma clara evolução no destino de investimentos para operações em fazendas nos últimos dez anos na região, incluindo tecnologias de mecanização, robótica, sensores, IoT, estruturas de marketplaces, financiamento e outras.

O que faz todo sentido e é uma atitude no mínimo prudente. Afinal, as adversidades naturais e o tempo dos ciclos necessários para a produção de alimentos são bem maiores do que para estruturar operações logísticas e de suporte às vendas (upstream).

Fonte: Asia/Pacific Agrifoodtech Investment Report 2022

A China, por sua vez, sofre com o aumento dos juros mundiais e segue a tendência global de melhorar a qualidade dos investimentos e reduzir os riscos, evitando as operações impulsionadas com muita queima de dinheiro.

Qualquer movimento de retração de investimentos na China tem grande impacto na conta total: a região recebeu ao todo US$ 5.3 bilhões, valor 47% menor do que no mesmo período de 2021. Excluindo a China, a região atraiu US$ 3.9 bilhões, com 15% de crescimento no mesmo período.

Fonte: Asia/Pacific Agrifoodtech Investment Report 202

Ainda assim, a China captou investimento em agtech da ordem de US$ 605 milhões em 2021, o que representa um aumento de 60% ano a ano. Os focos principais são as empresas de biotech, supply chain e robótica.

Segundo o relatório, as ofertas aumentaram no ano passado, mas a tendência é de queda em 2022. Os negócios de porte médio aumentaram ao longo dos estágios de investimentos em 2021, sugerindo avaliações inflacionadas, principalmente nas fases iniciais.

A diminuição mediana no final do primeiro semestre e o crescimento nos estágios no H1-2022 são indicativos da queda esperada no financiamento para o ano, particularmente visando as operações na China.

COMO ESTÃO AS PERSPECTIVAS NO BRASIL

O Brasil se mantém como o principal destino de investimentos em agtech e foodtech na América Latina. De acordo com o AgFunder Report 2022, o país somou US$ 1,3 bilhão em investimentos no setor em 2021, ainda muito distante de outros países com tradição na produção e distribuição de alimentos.

Fonte: AgFunder AgriFoodTech Investment Report 2022

O momento ainda traz incertezas quanto aos investimentos no país – se seguirão ou não o que foi apurado na Ásia-Pacífico e se ocorrerá algum aquecimento de investimentos em agtech e foodtech.

Para Flávio Zaclis, da Barn Invest, os investimentos deverão priorizar as inovações e a produção de biológicos, sistemas de rastreabilidade e soluções relacionados ao clima. “Tendemos a ter um aumento significativo de investimentos no ano que vem”, aponta.

O executivo vê um cenário bastante positivo para os investimentos em ag&food tech no Brasil em 2023, com investidores que não são do agro interessados em investir no setor.

Teremos startups cada vez mais robustas e com soluções conectadas às necessidades do produtor.

“Teremos startups cada vez mais robustas e com soluções conectadas às necessidades do produtor, produtores também se tornando investidores, o Corporate Venture Capital (CVC) crescendo, clube de anjos se formando com executivos do agro”, prevê.

Segundo Zaclis, é um cenário em que há novos perfis de investidores entrando e mais dinheiro para as diferentes fases.

“Considerando o foco dos investimentos, vejo um horizonte muito promissor, especialmente para as agfintechs e biotechs, cujos mercados estão em expansão acelerada”, analisa José Tomé, CEO do AgTech Garage. A atuação do hub serve como termômetro das evoluções e dos relacionamentos entre grandes empresas do setor e empreendedores.

É sempre importante lembrar aos empreendedores que o atual momento exige somar qualificações para ter sucesso na captação de recursos.

A seletividade na escolha dos investimentos, por conta de conjunturas econômicas nacionais e internacionais, demanda organização e planejamento das propostas de trabalho, estrutura de compliance, perspectivas claras de geração de caixa e relevância econômica e social. Atendidos esses critérios, melhores serão as chances de se obter os aportes necessários para manter o crescimento.


SOBRE O AUTOR

Fábio Cardo é economista de formação, atua em comunicação empresarial e empreendedorismo e é co-publisher do canal FoodTech da Fast Co... saiba mais