Há 50 anos ele sonha em construir um carro voador. E não pensa em desistir
Engenheiro canadense popularizou a tecnologia de decolagem e aterrissagem vertical, mas continua cético quanto às startups de táxi aéreo
Na cidade de Davis, na Califórnia, Paul Moller entra em uma enorme garagem, usando um par de óculos aviador dourado. O engenheiro de 52 anos é professor na Universidade da Califórnia, mas não é do tipo que passa seu tempo em casa lendo livros. Ele parece estar prestes a mostrar sua nova invenção.
O disco azul escuro atrás de Moller tem oito hélices ao redor de uma pequena cabine, em que cabe uma pessoa. Desenvolvido por ele, o M200X é um veículo que lembra o carro voador da família Jetson e está quase pronto para voos de teste tripulados.
Agora, em um enorme gramado aberto, Moller entra no M200X. O veículo, amarrado a uma corda, liga, zumbindo alto. O disco se levanta lentamente no ar, balançando para frente e para trás, antes de ele e sua equipe sinalizarem um pouso rápido. Um dos motores estava parando.
O ano é 1988 e Moller, de volta à garagem, diz ao correspondente da CBS: “sempre tive o desejo de construir este veículo e fazê-lo funcionar. Demorei um pouco mais do que havia planejado.”
Hoje, 34 anos depois, ele ainda fala com a mesma emoção que sentia em 1988 – com um otimismo implacável. A única diferença são as décadas de experiência que agora tem sobre seu sonho de construir um carro voador.
Os grandes players de carros voadores de hoje devem muito a Moller, que na década de 1990, antes que qualquer uma dessas empresas existisse, liderou o segmento com projetos para veículos de decolagem e aterrissagem vertical (VTOL). Aproveitando a tecnologia elétrica-VTOL (eVTOL) com sistemas de propulsão a bateria, os veículos atuais são elegantes e se assemelham a insetos, não discos voadores ou carros com asas.
UM PROJETO PARA TODA A VIDA
Moller iniciou sua carreira de engenheiro mais cedo do que a maioria. Nascido em uma fazenda, na zona rural da província de Colúmbia Britânica, no Canadá, estava constantemente trabalhando em projetos: construiu uma casa aos oito anos, uma roda gigante aos 11 e seu primeiro helicóptero aos 14.
Após se formar no ensino médio, optou por não fazer faculdade e passou a frequentar uma escola técnica. Mais tarde, se matriculou em diversos cursos de pós-graduação em aerodinâmica na Universidade McGill, onde concluiria o mestrado em engenharia e o doutorado em apenas três anos.
Então, mudou-se para os EUA e se tornou professor da Universidade da Califórnia em Davis, de 1963 a 1975. Além de ensinar, Moller coordenava um laboratório de desenvolvimento de carros voadores. Em 1983, fundou a Moller International, empresa dedicada à construção de veículos comerciais de decolagem e aterrissagem vertical (VTOL).
Em 1989, o M200X, pela primeira vez, pairaria com sucesso a 15 metros do chão e faria cerca de 200 voos de teste na frente de potenciais investidores. Bastante motivado, Moller desenvolveu um veículo de última geração, lançando seu mais recente projeto até então, o M400, em 1990.
Com o passar do tempo, a tecnologia criada por Moller se tornou obsoleta.
Parecia uma mistura de Batmóvel com avião de caça. Tinha quatro motores a jato que faziam com que o veículo levantasse voo. Mas os anos se transformaram em uma década. E a década se transformou em duas. “Com o passar do tempo, minha tecnologia se tornou obsoleta”, diz Moller.
Geralmente é assim que um sonho morre. A fonte de dinheiro seca, os investidores desaparecem e deixamos para outra pessoa a responsabilidade de retomar o projeto. De fato, a Joby Aviation seria lançada em 2009 e o cofundador do Google, Larry Page, abriria sua primeira empresa de carros voadores no ano seguinte.
Qualquer um entenderia se Moller decidisse parar, se aposentar e esperar que uma nova geração de aeronaves VTOL surgisse. Qualquer um, exceto o menino que a vida toda sonhava com isso. Desistir de seu sonho estava fora de questão.
A PRÓXIMA GERAÇÃO
Por enquanto, Moller está satisfeito com a Freedom Motors, outra empresa que ele fundou e que fabrica motores rotapower. Ele afirma que, dentro de três anos, a receita da Freedom poderá apoiar financeiramente a Moller International. E está fazendo suas próprias apostas.
“Acredito que o mercado de eVTOL vai se autodestruir no próximo ano”, afirma. Se for esse o caso, ele não estará tão distante de conseguir financiar seu M400 Skycar. Além disso, o que são três anos quando há US$ 1 trilhão ou mais em jogo?
“Acredito que o mercado de eVTOL vai se autodestruir no próximo ano.”
Enquanto Moller insiste que o mercado eVTOL está fadado ao colapso, há uma nova geração de otimistas convictos no mercado. Tanto o CEO da Archer, Adam Goldstein, quanto JoeBen Bevirt, da Joby Aviation, afirmaram que terão a certificação da Federal Aviation Administration (Administração Federal de Aviação dos EUA, ou FAA) até o final de 2024.
Bevirt e Moller são conhecidos de longa data. Em 1992, quando calouro na Universidade da Califórnia em Davis, Bevirt integrou o laboratório de carros voadores de Moller, onde os dois trabalharam brevemente juntos. Talvez pela experiência no laboratório, quando iniciou sua própria carreira, ele queria que seus veículos se diferenciassem do M400 Skycar de forma audível.
Por enquanto, Moller está de olho no mercado eVTOL e escreve extensos relatórios comparando diferentes empresas. Ele mantém tudo para si mesmo, pois não quer influenciar no que vê como o fim inevitável das empresas eVTOL – incluindo a Joby Aviation.
“Se vai se autodestruir, vou deixar que aconteça”, diz Moller. “Não quero contribuir para isso.”
A idade tampouco o preocupa quando se trata de sua longa espera. Está confiante de que, quando o mercado voltar a se interessar por motores novamente, ele será um importante player.
“Não estou preocupado. Acredito que viverei o suficiente para ver acontecer. Acho que ganhei pelo menos mais 20 anos com isso.”