A IA chegou mesmo a todos os lugares – até aos drinques que você bebe

De inovações no sabor a planejamento para eventos climáticos, as marcas de bebidas estão ficando animadas com o boom da inteligência artificial

Crédito: Google DeepMind

John Kell 4 minutos de leitura

Os fabricantes de bebidas alcoólicas ainda estão nos estágios iniciais de implantação de IA. Além de melhorias no cultivo das matérias-primas (como da uva, por exemplo), um número crescente de empresas está usando a tecnologia na química envolvida na produção de vinhos, cervejas ou destilados, com o objetivo final de criar novas marcas ou sabores.

Um impulso, de fato, não faria mal ao setor. A demanda global por bebidas alcoólicas diminuiu em 2023 e o crescimento projetado para 2024 e 2025 é pequeno, segundo a consultoria especializada IWSR.

Nos EUA, os vinicultores estão lutando para atrair consumidores das gerações millennial e Z. Mesmo a indústria de destilados, mais resiliente, registrou sua primeira queda em volume em quase 30 anos em 2023, conforme relatado pelo IWSR.

Katerina Axelsson, CEO e fundadora da startup de tecnologia Tastry, diz que as vinícolas muitas vezes assumem riscos desnecessários ao lançar novos rótulos. Historicamente, a indústria obtém dados de categoria da Nielsen para ver o que vendeu bem no passado e então desenvolve uma marca semelhante na esperança de repetir os bons resultados. "Acho isso terrivelmente insuficiente", diz Axelsson.

A Tastry usa IA para analisar blends de vinho e fazer simulações para determinar quantas variações diferentes desse blend uma vinícola poderia fazer, orientando-a sobre a melhor combinação química possível que se alinhe às preferências dos consumidores.

"Tradicionalmente, os consumidores são classificados em arquétipos, com metadados que não estão necessariamente ligados ao fato de gostarem ou não daquele vinho", diz Axelsson. "Nós vemos cada consumidor tão único quanto uma impressão digital."

Na gigante dos destilados Diageo, um dos casos de uso mais desenvolvidos para IA é a previsão da preferências de sabor. Em 2022, a empresa adquiriu a Vivanda e, desde então, expandiu a plataforma “What’s Your Whiskey” (Encontre o Seu Sabor), que aponta a bebida que melhor combina com o paladar do consumidor de acordo com as respostas que ele dá ao questionário que consta no site.

O “What’s Your Whiskey” está disponível em 26 países (Brasil incluso) e 60 idiomas. Ferramentas de IA semelhantes foram lançadas para cerveja e drinques. A tequila será a próxima.

"A capacidade de usar esses dados com IA para entender onde devemos mirar nossa inovação, e quais são os drinques certos para serem servidos em diferentes locais... é algo que vai nos posicionar muito bem para o futuro", diz Mark Sandys, diretor de inovação da Diageo.

Isso também levou a algumas descobertas contraintuitivas. Os dados de IA mostraram que os consumidores gostavam de uísques frutados, embora geralmente digam aos pesquisadores que preferem sabores turfados. Nesse sentido, o scotch com sabor de abacaxi da Buchanan’s foi o maior lançamento da Diageo na América do Norte este ano em termos de sabor.

A Diageo também trabalha com uma startup chamada AI Palette, que alimenta dados de mídia social e tendências de alimentos e bebidas em um sistema de IA para prever o próximo sabor em alta. Este ano, as duas tendências de sabor em que a Diageo está se concentrando são umami e “bloom harvest”, que inclui jasmim, lavanda e hibisco.

"Isso é algo que estamos fazendo cada vez mais para tentar prever a preferência do consumidor", diz Sandys, acrescentando que a Diageo pode, assim, planejar inovações de produtos e promoções de drinques que estejam alinhadas com os sabores para os quais os consumidores estão se inclinando.

ANALISE MINHA CERVEJA

No início do ano, cientistas belgas publicaram uma pesquisa que analisou 250 cervejas e treinou modelos de machine learning para prever sabor e preferência do consumidor. Para cada cerveja, os cientistas da universidade de pesquisa Ku Leuven mediram 226 propriedades químicas, incluindo teor alcoólico, açúcar e sabores como caramelo, cítrico, frutas tropicais e banana.

Eles também analisaram mais de 180 mil avaliações de consumidores da plataforma de classificação online RateBeer para treinar 10 modelos diferentes de IA. "Quando se trata de aprendizado de máquina, vimos que é possível prever o sabor de maneira razoavelmente boa", diz o pesquisador Michiel Schreurs.

Crédito: Marisa Frigoletto/ Asbury Park Brewery

Os modelos de IA mostraram potencial para previsão de sabor para cervejas não alcoólicas. No caso das bebidas com álcool, os modelos se saíram melhor na previsão de fatores como acidez e teor alcoólico. Aromas se mostraram mais difíceis de prever, inclusive porque o estudo se limitou a cervejarias belgas, que produzem variedades conhecidas por seu sabor marcante de levedura.

Nos Estados Unidos, a Bruery, o Species X Beer Project e a Asbury Park Brewery lançaram cervejas criadas em colaboração com receitas de IA, com rótulos engraçados que são quase diretos demais, incluindo “AI-IPA”, “A.I.P.A” e “Darw1n”.

    Bob McLynn, fundador da Asbury Park Brewery, diz que a fábrica em Nova Jersey começou a criar uma nova IPA escura. Como ponto de partida, contou com uma receita gerada pelo Copilot AI, da Midrosoft, antes de fazer alguns ajustes no teor alcoólico e nos grãos usados para produzir a cerveja.

    O chatbot procurou fazer a bebida muito mais forte do que McLynn gostaria. Embora a AI-IPA seja um sucesso de vendas na sala de degustação da cervejaria, McLynn diz que a inovação impulsionada por IA só irá até certo ponto. "Os humanos continuarão a liderar a criação de cervejas e novos estilos", assegura.


    SOBRE O AUTOR

    John Kell é jornalista e escreve sobre tecnologia, tendências de consumo, liderança e sustentabilidade. saiba mais