Caso da Sports Illustrated enfatiza o poder da autenticidade na era da IA

Transparência e autenticidade são essenciais para organizações que pretendem usar IA de alguma forma

Crédito: Drew Angerer/ Getty Images

Hamza Mudassir 4 minutos de leitura

Com o passar do tempo, fica cada vez mais claro que a corrida da inteligência artificial está saindo do controle.

O grupo The Arena, responsável pela revista norte-americana “Sports Illustrated”, demitiu seu CEO, Ross Levinsohn, semanas após a revelação de que a revista havia publicado artigos escritos por autores fictícios com biografias e fotos geradas por IA. O grupo insistiu que a demissão de Levinsohn “não teve absolutamente nada a ver com a questão da IA”.

O Google também está enfrentando uma chuva de críticas por lançar um vídeo fortemente editado do Gemini, sua inteligência artificial mais avançada até o momento. A demonstração pré-gravada mostra uma interação em tempo real e em voz alta entre uma pessoa e a IA. Mais tarde, descobriu-se que o vídeo era exagerado. 

No âmbito das políticas públicas, a União Europeia recentemente apresentou um conjunto abrangente de regulamentações que classificam e limitam o uso de vários sistemas de IA, com penas severas em caso de descumprimento. 

E, é claro, houve a demissão, seguida pela reintegração, do CEO da OpenAI, Sam Altman – uma saga que apenas escancarou a crescente divisão no Vale do Silício em relação à segurança da IA.

Como acontece com todas as inovações disruptivas, antes de mais nada, é necessário conquistar a confiança das pessoas.

No entanto, a história mostra que a maioria das inovações disruptivas segue um padrão semelhante de turbulência antes de serem aceitas como soluções para os problemas da humanidade.

Por exemplo, em seu início, a internet estava cheia de agentes maliciosos, desafios políticos e controvérsias. Problemas relacionados a direitos autorais eram generalizados. A banda de heavy metal Metallica processou a rede de compartilhamento de arquivos Napster por violação, algo que agora ressurge com a inteligência artificial generativa

As semelhanças entre as críticas iniciais aos mecanismos de busca e a IA moderna também são notavelmente próximas. Entre elas estão os vieses e a falta de transparência nos resultados da pesquisa, violações de privacidade, bem como preocupações com a democracia e a liberdade de expressão. 

Créditos: blackdovfx/ akinbostanci/ iStock

No âmbito das políticas públicas, governos de todas os formatos e tamanhos nunca realmente combateram excessos quando se trata de redes de telecomunicações e smartphones, apesar dos gritantes problemas de privacidade.

No entanto, apesar de tudo isso, essas tecnologias se tornaram peças centrais da experiência humana e, na maioria dos casos, irreconhecíveis em relação a como eram no lançamento. 

UMA QUESTÃO DE TEMPO

Então, o que podemos aprender com essas lições do passado? Como acontece com todas as inovações disruptivas, antes de mais nada, é necessário conquistar a confiança das pessoas. Isso significa que transparência e autenticidade são fundamentais para organizações que pretendem usar a IA de alguma forma. 

A demissão de Levinsohn do grupo que controla a “Sports Illustrated” poderia não ter acontecido se o caso dos artigos produzidos por IA não tivesse sido ignorado. O vídeo de demonstração exagerado do Gemini, provavelmente criado para impulsionar o preço das ações e a percepção pública, não gerou resultados perceptíveis para a capitalização de mercado do Google.

A demissão de Sam Altman da OpenAI poderia ter sido mais bem conduzida e potencialmente mantida se o conselho fosse mais claro sobre o motivo pelo qual escolheu fazê-lo. A falta de transparência simplesmente não vale a pena.

a maioria das inovações disruptivas segue um padrão de turbulência antes de serem aceitas como soluções para os problemas da humanidade.

Em segundo lugar, as empresas precisam entender que, apesar do exagero em torno das capacidades da inteligência artificial, a maioria delas terá dificuldade em trazer a IA para o centro dos negócios em sua primeira tentativa. Basta considerar, por exemplo, a onda de transformações digitais que varreu o mundo dos negó- cios no início dos anos 2010.

A transformação digital é um processo deliberado que altera as ofertas e operações de uma organização e, em algum momento, seu modelo de negócios, para um modelo centrado no digital. Essa mudança agrega muito valor, mas leva tempo, e as empresas podem não ter muito sucesso nos primeiros dias.

Colocar a IA no centro dos negócios provavelmente será uma empreitada muito mais árdua do que abraçar uma transformação digital simples, pois as questões éticas são mais profundas e seu futuro é ainda mais incerto.

Dependendo do setor, ser o pioneiro na transformação da inteligência artificial pode não ser uma boa ideia. É melhor fazer pequenas mudanças em vez de optar por uma transformação completa. E sem nunca esquecer que autenticidade e transparência são as únicas verdadeiras chaves para o sucesso.


SOBRE O AUTOR

Hamza Mudassir é pesquisador e professor de estratégia na Judge Business School da Universidade de Cambridge. saiba mais