Dez anos depois do Watson, da IBM, entramos em outra “bolha de chatbots”
Especialista acredita que chatbots atuais não têm as "habilidades interpessoais" necessárias para serem realmente úteis em ambientes comerciais
Para Michelle Zhou, pesquisadora especializada em IA, a febre dos chatbots que tomou conta do Vale do Silício no último ano soou muito familiar. Quando trabalhava na IBM, ela ajudou a criar o Watson Personality Insights, e se lembra muito bem das ondas de bots de 2012 e 2016.
Obviamente, os bots Tay e Zo da Microsoft não vingaram, nem os bots do Messenger ou do Facebook. Zhou também não põe muita fé no ChatGPT nem no Bard. "Esses chatbots não são capazes de conversar. Não passam de assistentes especializados em coleta de informações", afirma.
Sua opinião se baseia na ideia de que nossas expectativas em relação aos chatbots são muito baixas ou simplesmente mal definidas. Hoje, nós os usamos principalmente como auxiliares de pesquisa na internet ou como ferramentas de produtividade. Mas o que as empresas (escolas, hospitais, comércios etc.) precisam é de um recurso realmente capaz de substituir um ser humano.
Os chatbots precisam de "inteligência pessoal", ou seja, a capacidade de entender as motivações e as necessidades psicológicas do usuário.
Por exemplo, a empresa de Zhou, a Juji, está trabalhando com prestadores de serviços de saúde para desenvolver assistentes que consigam, entre outras coisas, orientar os pacientes durante a recuperação de uma cirurgia no joelho ou no coração, com o objetivo de reduzir a necessidade de uma consulta cara no pronto-socorro.
A Juji também está trabalhando com universidades para evitar que os alunos abandonem o curso. O tempo individual com professores e orientadores costuma ser muito limitado, mas um estudo mostra que essas reuniões aumentam em 13,5% as chances de o aluno permanecer na escola. E, é claro, as empresas querem economizar dinheiro usando bots como substitutos de representantes humanos.
COMPREENSÃO EM NÍVEL BÁSICO
Os ChatGPTs da atualidade simplesmente não estão equipados para realizar tarefas complexas – pelo menos, não de forma satisfatória. Os chatbots com grandes modelos de linguagem (LLMs) continuam funcionando basicamente como papagaios probabilísticos. Ou seja, são sistemas de probabilidade muito complicados que, depois de treinados com grandes quantidades de texto da web, conseguem indicar qual é próxima palavra mais provável em uma frase.
Agora, para sermos justos, durante o processo de treinamento, os LLMs adquirem um certo grau de compreensão básica de como o mundo funciona. E podem ser "ajustados" em bases de conhecimento específicas, como o estilo de escrita de um usuário ou informações exclusivas sobre produtos ou serviços.
Mas, mesmo assim, explica a pesquisadora, os chatbots carecem de alguns elementos cruciais para se tornarem realmente úteis em ambientes comerciais. Um assistente de IA eficaz tem que ser capaz de envolver o usuário em uma conversa de forma proativa. Para tanto, ele precisa de uma série de habilidades sociais, incluindo escuta ativa, negociação e resolução de conflitos.
Os chatbots precisam de "inteligência pessoal", ou seja, a capacidade de entender as motivações e as necessidades psicológicas do usuário. "Queremos que o assistente de IA seja proativo, que tenha essa inteligência pessoal para nos encorajar, para explicar o que não entendemos de uma forma que possamos compreender", diz Zhou.
Os ChatGPTs da atualidade simplesmente não estão equipados para realizar tarefas complexas – pelo menos, não de forma satisfatória.
Isso exige que o modelo de IA desenvolva uma compreensão do seu usuário – um modelo de traços de personalidade, conhecimento, atitudes, habilidades e hierarquia de necessidades.
Com essas habilidades e conhecimentos, uma IA talvez fosse capaz de entender e abordar proativamente as possíveis dificuldades enfrentadas pelo usuário. Ela poderia, por exemplo, intuir os sinais de que um paciente está tendo uma recaída ou de que um aluno está prestes a abandonar os estudos.
Hoje, a promessa dos assistentes de IA é principalmente a de ampliar o conhecimento humano. Só que o problema das empresas com um número limitado de funcionários é que elas precisam atender a um número muito maior de clientes.
Os assistentes avançados de IA são uma chance de que todos os usuários possam receber atenção individual e com qualidade das empresas ou instituições. Mas as habilidades interpessoais mencionadas por Zhou só virão em uma futura onda de chatbots, que ainda estamos longe de testemunhar.