O design contra-ataca: aplicativo bloqueia uso de IA generativa em imagens

Em vez de tentar fazer a arte gerada por IA fazer sentido, a Procreate decidiu não oferecer essa opção. Mas não espere que muitos outros sigam esse exemplo

Crédito: ProCreate/ Fast Company Brasil

Harry McCracken 4 minutos de leitura

No mundo da tecnologia, é raro ver executivos se gabando das oportunidades que decidiram não aproveitar. Por isso, foi tão surpreendente ver James Cuda declarando recentemente que odiava a IA generativa e que os produtos de sua empresa não a adotariam.

Mas, ao mesmo tempo, isso faz todo sentido. Cuda é o CEO da Procreate, uma empresa conhecida por seu fantástico aplicativo para iPad, que permite desenhar, pintar e fazer animações com ferramentas digitais incrivelmente realistas.

Entre meus amigos artistas visuais, o ódio pela IA generativa é enorme. Eles veem a dependência dessa tecnologia na arte criada por humanos como um roubo de propriedade intelectual, especialmente em casos em que o criador não deu consentimento explícito.

Também não gostam da ideia de competir com máquinas por trabalho e enxergam as imagens geradas como uma desvalorização de sua própria arte. Até mesmo a estética das criações do DALL-E e de seus concorrentes – um simulacro derivado de arte, mas sem alma – é como unhas arranhando um quadro-negro para eles.

A desconfiança da classe criativa em relação à inteligência artificial gerou controvérsias recentes envolvendo outros fornecedores de software. Em junho, a Adobe enfrentou uma forte reação às mudanças que fez nos termos de serviço, que os clientes interpretaram como uma permissão para usar suas artes no treinamento da IA Firefly.

Um mês depois, a Figma suspendeu uma nova funcionalidade de geração de interfaces de software após um desenvolvedor de iOS apontar que os designs para apps de clima pareciam cópias do aplicativo da Apple.

lançar produtos de IA inacabados ou até mesmo inutilizáveis se tornou o padrão.

Em ambos os casos, as empresas alegaram que parte das críticas era fruto de mal-entendidos sobre o que estava acontecendo. Mas a rejeição dos usuários à inteligência artificial deu a eles uma resposta mais concreta.

Ao ignorar o hype da IA generativa, a Procreate pode agradar artistas que veem essa tecnologia como uma ameaça à sua profissão e não como uma ferramenta para aumentar a produtividade. Isso também pode evitar que a empresa crie problemas para si mesma – problemas que poderiam surgir mesmo que tentasse implementar a inteligência artificial de forma cuidadosa.

Essa decisão é, portanto, tanto uma jogada inteligente de marketing quanto uma postura ética admirável.

Crédito: ProCreate

Se o software da Procreate não fosse tão bom, eu me importaria menos com a possibilidade de a IA estragá-lo. Em seus 13 anos de existência, o aplicativo tem se tornado cada vez melhor, sem nunca adicionar nada que pareça supérfluo ou fora do lugar. O Photoshop, por outro lado, sempre foi excessivamente complexo e pouco intuitivo.

É claro que gigantes como a Adobe, que têm ações na bolsa, não têm escolha a não ser abraçar a inteligência artificial. Wall Street vê essa tecnologia como o próximo grande propulsor de crescimento da indústria e está de olho em cada movimento.

A decisão é uma jogada inteligente de marketing e uma postura ética admirável.

Por exemplo, quando a Adobe fez uma previsão de vendas fraca em março, os investidores interpretaram isso como um sinal preocupante de que a empresa estava ficando para trás na corrida da IA. Três meses depois, quando apresentou números robustos, eles concluíram que a tecnologia estava finalmente dando frutos.

A pressão para provar sua competência em inteligência artificial também ajuda a explicar por que os novos celulares Pixel 9, do Google, substituíram a interface de voz Assistente pelo Gemini, um novo recurso que é muito mais conversacional, mas que ainda não suporta funcionalidades básicas como ditar notas.

Crédito: Growtika/ Unsplash

Pelo menos o Google ofereceu a opção de mudar de volta para o Assistente, reconhecendo que o Gemini ainda está em desenvolvimento. No entanto, lançar produtos de IA inacabados ou até mesmo inutilizáveis se tornou o padrão.

A Procreate tem a liberdade de se manter fiel às suas convicções contrárias à IA generativa, em parte porque é uma empresa pequena que não parece estar obcecada com a maximização dos lucros.

Meu aplicativo favorito de escrita no iPad, o Scrivener, foi criado por uma empresa ainda menor que, por enquanto, também está livre de inteligência artificial. Embora eu consiga imaginar a tecnologia sendo usada para resumir documentos longos, fico feliz em ver que eles estão avançando lentamente, enquanto o Microsoft Word e o Google Docs correm à frente.

    Entretanto, a rejeição à IA generativa por parte do CEO da Procreate pode não ser definitiva. “Não sabemos exatamente para onde a história vai nos levar ou como vai terminar”, diz ele em um vídeo. “Mas acreditamos que estamos no caminho certo ao apoiar a criatividade humana.”

    Se, no futuro, a empresa encontrar uma maneira de incorporar a IA generativa sem perder sua essência – para incentivar ainda mais a autoexpressão e não apenas imitá-la –, ficarei satisfeito. Dado o histórico de excelência da Procreate, confio que farão a coisa certa.


    SOBRE O AUTOR

    Harry McCracken é editor de tecnologia da Fast Company baseado em San Francisco. Em vidas passadas, foi editor da Time, fundador e edi... saiba mais