Para levar internet onde o sinal não chega, a chave pode estar na estratosfera
Estações em plataformas seriam mais rápidas, econômicas e flexíveis do que sistemas baseados em satélites
Cerca de um terço da população mundial não tem acesso à internet ou tem conexões ruins, devido a limitações de infraestrutura, desigualdade econômica e isolamento geográfico. Tanto os satélites quanto as redes terrestres tradicionais deixam lacunas de comunicação em áreas onde seria muito caro instalar equipamentos convencionais.
Estações em plataformas de alta altitude – equipamentos de telecomunicações colocados em balões, dirigíveis, planadores e aviões não tripulados – poderiam ajudar a reduzir as desigualdades sociais e econômicas, preenchendo essas lacunas de conectividade que as redes terrestres e os satélites não conseguem cobrir. Isso permitiria que mais pessoas participassem plenamente da era digital.
Mohamed-Slim Alouini é engenheiro elétrico e contribuiu para um experimento que provou ser possível fornecer altas taxas de dados e ampla cobertura 5G a partir da estratosfera – a segunda camada mais baixa da atmosfera, situada entre seis e 50 quilômetros acima da Terra.
O experimento mediu a força dos sinais entre as estações em plataformas e os usuários em terra em três cenários diferentes: uma pessoa parada, dirigindo e navegando em um barco.
Medimos a força do sinal em relação aos níveis de interferência e ruído de fundo – um dos principais indicadores de confiabilidade da rede. Os resultados mostraram que as estações em plataformas são capazes de suportar aplicações de alta taxa de dados, como streaming de vídeos em 4K, e conseguem cobrir uma área 15 a 20 vezes maior que torres terrestres comuns.
As primeiras tentativas do Facebook e do Google de lançar comercialmente plataformas deste tipo não tiveram sucesso. Mas novos investimentos, avanços tecnológicos e o interesse de empresas tradicionais de aviação e startups especializadas podem mudar essa realidade.
O objetivo é alcançar conectividade global, uma meta que trouxe reconhecimento ao conceito de estações em plataformas no relatório das 10 Principais Tecnologias Emergentes de 2024, do Fórum Econômico Mundial. A HAPS Alliance, uma iniciativa global da indústria que conta com parceiros acadêmicos, também está empenhada em alcançar essa meta.
RÁPIDO, ECONÔMICO E FLEXÍVEL
As estações em plataformas seriam mais rápidas, econômicas e flexíveis do que os sistemas baseados em satélites. Como esses equipamentos ficam mais próximos da Terra, eles poderiam oferecer sinais mais fortes e com maior capacidade.
Isso permitiria comunicações em tempo real suficientemente rápidas para funcionar com smartphones comuns, além de oferecer alta resolução para tarefas de imagem e maior sensibilidade para aplicações de sensoriamento.
Estas estações transmitem dados por meio de óptica no espaço livre, ou feixes de luz, e sistemas de antenas em larga escala, que conseguem enviar grandes volumes de dados rapidamente.
Também são mais fáceis de implementar do que satélites, que envolvem custos elevados de lançamento e manutenção. Os requisitos regulatórios e os procedimentos de conformidade necessários para garantir posições na estratosfera são provavelmente mais simples do que as complexas leis internacionais que regem as órbitas dos satélites. Além disso, são mais fáceis de atualizar, permitindo que melhorias sejam feitas de forma mais ágil.
As estações em plataformas também são potencialmente menos poluentes do que as mega-constelações de satélites, pois, enquanto os satélites se desintegram ao reentrar na atmosfera, liberando metais nocivos, elas podem ser alimentadas por fontes de energia limpa, como energia solar e hidrogênio verde.
Estações em plataformas poderão desempenhar um papel crucial na construção de um futuro digital mais inclusivo e resiliente.
Os principais desafios para a implementação prática incluem aumentar o tempo que estas estações podem permanecer no ar, para meses de operação contínua, além de aprimorar a capacidade de energia verde a bordo e a confiabilidade – especialmente durante as fases de decolagem e pouso nas camadas turbulentas mais baixas da atmosfera.
Paralelamente, melhorias nos modelos meteorológicos da estratosfera e nos modelos atmosféricos estão facilitando a previsão e simulação das condições em que elas operariam.
A implementação comercial desta tecnologia, ao menos para situações de emergência ou desastres, pode se tornar uma realidade até o final da década. Por exemplo, no Japão, um consórcio alocou US$ 100 milhões para desenvolver estações em plataformas de alta altitude movidas a energia solar, visando atender comunidades remotas em regiões montanhosas e ilhas.
Essas estações podem ajudar a reduzir a desigualdade digital ao ampliar o acesso a serviços essenciais, como educação e saúde, além de criar novas oportunidades econômicas, melhorar a resposta a emergências e monitorar o meio ambiente. À medida que a tecnologia avança, elas poderão desempenhar um papel crucial na construção de um futuro digital mais inclusivo e resiliente.
Este artigo foi publicado no “The Conversation” e reproduzido sob licença Creative Common. Leia o artigo original.