Problemas do TikTok com governo dos EUA podem beneficiar Meta e Google

Se podemos assistir a vídeos curtos em outras plataformas que também coletam dados, visam o lucro e são cheias de anúncios, por que devemos nos preocupar em perder o TikTok?

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Mark Sullivan 4 minutos de leitura

As autoridades norte-americanas estão apertando o cerco contra o TikTok. A Casa Branca, citando riscos à segurança nacional, agora considera banir totalmente o aplicativo caso não se desfaça de sua controladora, a chinesa ByteDance Ltd.

Shou Zi Chew, CEO do TikTok, compareceu a uma audiência no Congresso na esperança de convencer os legisladores de que a plataforma não deve romper seus laços com a China.   

Congressistas de ambos os partidos temem que o TikTok possa estar enviando dados de usuários norte-americanos para o governo chinês. A preocupação é de que essas informações poderiam ser usadas para direcionar propaganda aos 150 milhões de usuários no país.

Além disso, foi apresentado um projeto de lei que daria ao Departamento de Comércio poderes para restringir ou banir países estrangeiros. Independentemente de ser aprovado ou não, nenhum dos resultados possíveis é bom. Abaixo, explico os motivos.

O TIKTOK NÃO É MAIS O MESMO

Chew está buscando convencer os membros do Comitê de Energia e Comércio da Câmara de que o TikTok não é diferente de outras empresas que operam no espaço de mídia social, incluindo as sediadas nos Estados Unidos.

Em um aspecto ele está certo: a plataforma realmente se tornou muito parecida com outros aplicativos de rede social. Mas não em termos de segurança de dados como Chew defende.

Se podemos assistir a vídeos curtos em outras plataformas que também coletam dados, por que devemos nos preocupar em perder o TikTok?

O TikTok não é o mesmo de um ano atrás. Certa vez, elogiei a capacidade do aplicativo de extrair o melhor das pessoas, em parte, devido ao fato de que suas ferramentas de gravação e produção de vídeo tornam o processo de criação fácil e rápido.

Também fiquei impressionado com seu algoritmo, que parecia ter uma capacidade incrível de entender meus interesses e gostos e entregar os vídeos certos.

Agora, o TikTok está repleto de anúncios. O fluxo de vídeos é interrompido com frequência por propagandas de cereais sem açúcar, produtos de limpeza, restaurantes etc. E, se você clicar em uma, mesmo sem querer, ela vai te perseguir sempre que abrir o aplicativo.

A verdade é que me precipitei ao elogiá-lo. Acabei caindo na velha tática que as empresas de tecnologia ocidentais inventaram. Elas nos atraem com uma ótima experiência gratuita até que nos tornemos dependentes, para então impor custos – seja dinheiro ou atenção, como no caso dos anúncios.

Dito isso, vale a pena tentar salvar o TikTok? Se podemos assistir a vídeos curtos em outras plataformas que também coletam dados, visam o lucro e são cheias de anúncios, como o Shorts, do YouTube, ou o Reels, do Instagram, por que devemos nos preocupar em perdê-lo?

A maioria dos criadores de conteúdo não é fiel a ele. Muitos postam no Instagram, YouTube e em outros lugares. Em algum momento, os usuários podem acabar migrando para outras plataformas.

Obviamente, os maiores beneficiados de um eventual banimento seriam a Meta e o Google.

REGULADORES E O PERIGO DOMÉSTICO

Mas faz mesmo sentido favorecer as grandes plataformas de rede social dos EUA e punir o TikTok neste contexto? Apesar de alguns problemas de segurança de dados, não há indícios de que ele esteja sendo usado para influenciar as mentes ocidentais de alguma forma.

o tiktok terá que provar que não é uma ameaça aos EUA e que nunca agirá em nome do governo chinês – duas tarefas praticamente impossíveis.

Há evidências, na verdade, de que uma rede social norte-americana foi usada por outra potência estrangeira para influenciar e inflamar a população. Uma investigação conduzida pelo procurador Robert Mueller descobriu que agentes militares russos compraram anúncios e promoveram conteúdo no Facebook (e, em menor medida, no YouTube) destinados a minar a confiança nas instituições do país, promover uma divisão social e apoiar a candidatura de Donald Trump.

Os apoiadores do ex-presidente espalharam informações sobre o que chamam de “Grande Mentira” – a ideia de que Biden venceu as eleições com uma fraude eleitoral – no Facebook e usaram a plataforma para planejar o ataque ao Capitólio dos Estados Unidos no dia 6 de janeiro de 2021. Mas nenhuma audiência foi realizada para julgar o fechamento, venda ou nacionalização da rede social de Zuckerberg.

O Facebook e o Google conseguiram manter os reguladores federais sob controle. A tal ponto que nem mesmo uma lei de privacidade bem simples, para proteger os cidadãos da coleta de dados pessoais por empresas de tecnologia, passou no Congresso.

A ex-diretora de políticas públicas do Facebook, Katie Harbath, observa que a estratégia de enviar Chew a Washington foi a mesma usada pela empresa anteriormente. Antes da audiência, o TikTok fez reuniões com congressistas, colocou anúncios em newsletters políticas, enviou criadores para fazer lobby em seu nome e divulgou sua grande base de usuários nos EUA.

Mas, diante da postura cada vez mais hostil em relação à China e do crescente consenso de que o TikTok não é uma plataforma neutra, nenhuma dessas estratégias de relações públicas surtirá efeito.

Para convencer os legisladores, Chew terá que provar que o aplicativo não é uma ameaça para os EUA e que nunca agirá em nome do governo chinês – duas tarefas praticamente impossíveis.


SOBRE O AUTOR

Mark Sullivan é redator sênior da Fast Company e escreve sobre tecnologia emergente, política, inteligência artificial, grandes empres... saiba mais