“Queremos fazer daqui um ótimo lugar para os brasileiros”, diz CEO do Bluesky

Jay Graber fala de transparência no monitoramento de comentários, da adaptação da rede com a chegada de novos usuários e da construção de um ambiente digital saudável

Crédito: Fast Company Brasil

Camila de Lira 6 minutos de leitura

O Bluesky busca estar no "trending topics" do Brasil. Uma semana depois da suspensão do Twitter (atual X) no país, a rede social da "borboleta" viu um salto de 50% na quantidade de usuários – mais de dois milhões deles, brasileiros. Com código aberto, a plataforma quer se tornar um modelo transparente, descentralizado e seguro de internet.

Em meio ao entusiasmo (e aos memes), a CEO do aplicativo, Jay Graber, falou com exclusividade com a Fast Company Brasil. "Queremos fazer do Bluesky um ótimo lugar para brasileiros", afirma.

Isso passa também pela moderação de conteúdo. A executiva de 33 anos explica que o sistema de filtragem de conteúdo da rede foi feito para abarcar não só a coordenação interna como também a palavra de usuários e especialistas.

Construído em cima do AT Protocol, um protocolo próprio de código aberto, o Bluesky é chamado de "rede social federada", ou seja, descentralizada. Desenvolvedores podem criar ferramentas usando o protocolo, além de conferir informações internas da rede, como o funcionamento dos algoritmos. Na ponta, o usuário tem acesso aos seus dados e ao seu "identificador".

"Gostamos de dizer que, quando a pessoa se inscreve no Bluesky, está se inscrevendo em uma identidade online que pertence a ela totalmente", diz a CEO. No futuro, a ideia é que a plataforma funcione como um e-mail, onde mensagens podem ser trocadas em diferentes sistemas.

O protocolo aberto permite a análise de informações que, em outras redes sociais, são fechadas a sete chaves. Desenvolvedores criaram ferramentas nas quais o público consegue acompanhar em tempo real dados como horário de pico do aplicativo, número de usuários novos e de usuários ativos. Todas essas métricas mostram que o Brasil dominou o Bluesky nos últimos dias.

Passada uma semana do banimento do X no Brasil, a rede social passou de 6 para 9,2 milhões de usuários. Desses novatos na rede, 85% são brasileiros. Nos últimos sete dias, as postagens em português fazem parte de mais de 70% das publicações totais na plataforma.

Além disso, as horas mais usadas do aplicativo batem com o "horário de Brasília". Um usuário chegou a brincar dizendo que o Bluesky agora estava ligado ao relógio biológico do brasileiro. 

Primeiro "logotipo" do Bluesky (Crédito: Reprodução/ Redes sociais)

Para se equiparar à demanda do público "pt-br", a  CEO diz que a equipe está tendo que aprender o idioma e se valer de muitos "tradutores online". Também estão calibrando o conhecimento cultural com a turma cronicamente online que antes ocupava o X. Ou seja, estão aprendendo os memes.

Um dos criadores do aplicativo, Paul Frazee, já até ganhou apelido de "pai" e de "paulinho". Paul está levando na brincadeira e conversando com os brasileiros em seu perfil no Bluesky. 

Confira a entrevista completa:

FC Brasil – O Bluesky é uma rede social federada? O que é o protocolo AT?

Jay Graber - O Bluesky é uma rede social aberta. Essa abertura significa que é um projeto colaborativo, ao contrário de outras redes sociais que são controladas por uma única empresa. Qualquer pessoa pode criar feeds, serviços de moderação e até aplicativos totalmente novos com base em nossa rede. O Protocolo AT é o nome da rede aberta sobre a qual o Bluesky foi criado.

FC Brasil – O protocolo habilita o uso pelos desenvolvedores. Como os outros desenvolvedores o estão usando?

Jay Graber – Milhares de desenvolvedores já estão construindo sobre o Protocolo AT e estamos animados em receber muitos novos desenvolvedores brasileiros na comunidade. Esta semana, vimos que alguém criou uma extensão de navegador que mostra os trending topics no aplicativo.

Adoramos o fato de que a comunidade de desenvolvedores muitas vezes nos supera em termos de recursos – esse é um dos benefícios de uma rede aberta. Os usuários podem se beneficiar de todas as ferramentas criadas por essa comunidade crescente.

FC Brasil – Como o aspecto da transparência do Protocolo AT afeta as políticas de moderação e a forma como o conteúdo é filtrado no Bluesky?

Jay Graber – Confiança e segurança são fundamentais para o Bluesky e valorizamos espaços para conversas saudáveis. Nossa equipe de moderação oferece cobertura 24 horas por dia, sete dias por semana, e responde à maioria das denúncias em um dia.

Para além dessa estrutura, os usuários podem se inscrever para receber decisões adicionais de moderação de pessoas ou organizações em quem confiam, com conhecimento específico do setor ou da comunidade.

FC Brasil – Nos últimos dois anos, o ambiente de mídia social, especialmente o Twitter, tornou-se um “pântano tóxico”, com muito extremismo, desinformação e discurso de ódio. Quais são as maneiras mais eficientes para se criar um espaço digital melhor e mais saudável? Como a mídia social pode servir aos usuários, e não o contrário?

Estamos sempre tentando equilibrar facilidade de uso, diversão, liberdade e uma experiência segura.

Jay Graber – Isso é algo em que pensamos muito, porque queremos garantir que o Bluesky seja um ótimo lugar e um espaço seguro. Estamos sempre tentando equilibrar facilidade de uso, diversão, liberdade e uma experiência segura.

Nosso sistema de moderação, com várias estruturas que podem se reunir, como stacks tecnológicas, permite que os usuários aproveitem a experiência de comunidades e especialistas de todo o mundo, além da equipe da Bluesky.

FC Brasil – Como é a relação entre o Bluesky e as big techs? As outras redes sociais são compatíveis com o protocolo AT?

Jay Graber – O Bluesky é uma empresa independente, com a missão de tornar a rede social uma rede aberta, e o protocolo AT estabelece a base para essa abertura. Se uma big tech adotar o protocolo, os usuários poderão conversar com os amigos em todas as plataformas, como uma troca de e-mail.

Crédito: Jason Leung/ Unsplash

FC Brasil – Quais são os benefícios da descentralização para o usuário casual da internet? E o que esse modelo significa para o futuro das redes sociais?

Jay Graber – O Bluesky é uma rede social que coloca o usuário em primeiro lugar. Priorizamos a escolha do usuário. Por exemplo, no lugar de ter uma única linha do tempo, no Bluesky o usuário escolhe os feeds personalizados. Se a pessoa preferir ver apenas publicações daqueles que conhece ou até mesmo ver apenas fotos de gatos, pode fazer isso.

FC Brasil – Você vê o Bluesky sendo usado como a “ID da Web 4.0”?

Jay Graber – Gostamos de dizer que quando a pessoa se inscreve no Bluesky está se inscrevendo em uma identidade online que pertence a ela totalmente. Não se trata apenas de outro aplicativo social. 

FC Brasil – Que recursos vocês pretendem trazer para o Bluesky em um futuro próximo?

Jay Graber – Muitos brasileiros têm pedido a função de vídeo, e estamos muito animados para lançá-la em breve em nossa próxima grande atualização do aplicativo.

Crédito: Reprodução/ Bluesky

FC Brasil – Os brasileiros adoram memes. Vi que você já foi chamada de “mãe” pelos usuários brasileiros, e que o CTO da rede, Paul Frazee, está sendo chamado de pai. Conte-nos algo peculiar que tenha acontecido nos últimos dias.

Jay Graber – Vimos que o Jornal Nacional incluiu o nome de usuário do Bluesky em sua transmissão, o que foi muito empolgante para nós.

FC Brasil – Falando sobre os usuários brasileiros: o que muda para o Bluesky com essa quantidade de pessoas que não falam inglês? Como vocês estão fazendo para se adaptar?

Jay Graber – Estamos usando muito o Google Translate, pois prestamos muita atenção a todos os comentários que estamos recebendo da comunidade brasileira. Queremos fazer deste um ótimo lugar para os brasileiros. Também estamos aprimorando nossos sistemas de suporte e moderação, para lidar com o grande aumento de usuários.


SOBRE A AUTORA

Camila de Lira é jornalista formada pela ECA-USP, early adopter de tecnologias (e curiosa nata) e especializada em storytelling para n... saiba mais